Agro na COP30
Brasil lança 'Carta de Belém' e pede ação global por biocombustíveis
Manifesto apresentado na COP 30 por entidades do setor de biocombustíveis pede ação imediata para expandir produção e uso do etanol, biometano e híbridos
Sabrina Nascimento ! São Paulo ! sabrina.nascimento@estadao.com
14/11/2025 - 18:26

Entidades do setor de biocombustíveis do Brasil lançaram nesta sexta-feira, 14, um manifesto denominado “A Carta de Belém”. O documento propõe um esforço internacional coordenado para quadruplicar a produção e o uso de combustíveis sustentáveis até 2035, abrindo caminho para uma transição energética justa e inclusiva.
A apresentação das propostas ocorreu durante a 30ª Conferência sobre as Mudanças Climáticas (COP 30), em evento que celebrou os 50 anos do Proálcool — considerado o maior e mais ambicioso programa de produção e uso de combustíveis renováveis do mundo. “Estamos vivendo um dia histórico: 50 anos que o Proálcool foi lançado. São mais de um bilhão de toneladas de CO2 evitadas desde que essa história começou. E o setor privado resolveu fazer uma carta que possa ajudar a inspirar os demais países que estão aqui em Belém em busca de soluções que descarbonizem”, disse Evandro Gussi, presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica), ao Agro Estadão.
A carta sinaliza que, após cinco décadas de políticas como o Proálcool e o RenovaBio, o Brasil consolidou uma das matrizes energéticas mais limpas entre grandes economias, com 29% de bioenergia e 20% de outras fontes renováveis, e ampliou a oferta de bioeletricidade, que alcançou 21.000 GWh em 2024, o equivalente a 4% do consumo nacional
O documento, entregue ao secretário de petróleo, gás e biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia, Renato Dutra, ressalta, entretanto, que o mundo está atrasado na descarbonização da mobilidade e não cumprirá o Balanço Global — mecanismo do Acordo de Paris que, a cada cinco anos, avalia coletivamente o progresso climático dos países — sem combinar eletrificação, combustíveis sustentáveis e novas rotas tecnológicas.
Nesse contexto, o caso brasileiro com o etanol e outros combustíveis sustentáveis é apontado como evidência prática dessa convergência. “Há dez anos, quando se celebrou o Acordo de Paris, havia certa euforia quanto à exequibilidade das rotas tecnológicas. Hoje, vemos um mundo ainda muito dependente de combustíveis fósseis. Por isso, é natural que retorne à cena, com protagonismo e vigor, uma solução já pronta para ser implementada e escalada. Ou seja, temos muitas aplicações para o etanol”, destacou Gussi.
Além do papel do etanol, a carta dedica atenção ainda à complementaridade entre combustíveis sustentáveis e eletrificação. O texto afirma que, especialmente em países com forte base agrícola e infraestrutura de recarga limitada, a combinação entre híbridos flexfuel, etanol, biometano e eletricidade constitui a rota mais eficiente para redução rápida de emissões na frota leve. “A aposta em diferentes tecnologias é o melhor caminho para acelerarmos a descarbonização. Os biocombustíveis são aliados fundamentais nessa jornada, como já mostra o Brasil, e permitem a redução imediata das emissões, com impacto real no transporte leve e pesado”, afirma Igor Calvet, presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).
Recomendações para quadruplicar os combustíveis sustentáveis
A partir dos apontamentos das associações, A Carta de Belém faz oito recomendações como medidas práticas para apoiar os países e as partes interessadas a acelerar a implantação de combustíveis sustentáveis em todo o mundo:
- Reconhecer o papel estratégico dos combustíveis sustentáveis no apoio à implementação das NDCs das Partes — compromissos voluntários de cada país para redução das emissões de gases — e no avanço da transição energética, em consonância com os resultados do Balanço Global;
- Apoiar a meta de quadruplicar a produção e o uso de combustíveis sustentáveis até 2035, com ênfase em biocombustíveis de baixas emissões, como o etanol, que já demonstram escalabilidade e reduções mensuráveis de gases de efeito estufa;
- Incentivar a adoção de mandatos de mistura de longo prazo e estruturas regulatórias que facilitem a incorporação de combustíveis sustentáveis de acordo com os contextos nacionais e as NDCs atualizadas;
- Promover investimentos e financiamentos por meio de instrumentos financeiros previsíveis, concessionais e inovadores, entre as quais taxas de juros diferenciadas, condições de pagamento favoráveis e financiamento direcionado de infraestrutura, em linha com o Roadmap Baku-Belém;
- Incorporar o papel dos combustíveis sustentáveis no Diálogo dos Emirados Árabes Unidos sobre a implementação dos resultados do Balanço Global até a nova avaliação em 2028;
- Promover a cooperação internacional com o objetivo de harmonizar os critérios de sustentabilidade e as metodologias para avaliação do ciclo de vida, reconhecendo o desempenho superior dos combustíveis sustentáveis em relação aos gases de efeito estufa como um caminho comprovado para a descarbonização;
- Reconhecer os benefícios conjuntos socioeconômicos dos combustíveis sustentáveis — como segurança energética, criação de emprego e desenvolvimento rural — como elementos integrantes de uma transição justa e inclusiva;
- Apoiar o reforço das capacidades, a transferência de tecnologia e a divulgação das melhores práticas para acelerar a implantação de combustíveis sustentáveis, particularmente nas regiões em desenvolvimento.
Além disso, é apontada uma agenda de ações que deverá estabelecer um marco decisivo na implementação da agenda climática global, incluindo:
- Triplicar a capacidade de energia renovável e dobrar a eficiência energética;
- Acelerar a adoção de tecnologias de emissão zero e de baixas emissões em setores com dificuldade para reduzi-las;
- Fazer a transição para o afastamento dos combustíveis fósseis de maneira justa, ordenada e equitativa;
- Promover a restauração da terra e a agricultura sustentável que permita a produção de biocombustíveis de baixo carbono sem comprometer a segurança alimentar; e
- Fomentar a harmonização dos mercados de carbono e das normas contábeis.
Além da Unica e Anfavea, assinam o documento a Associação Brasileira de Bioenergia (Bioenergia Brasil) e o Instituto Mobilidade de Baixo Carbono Brasil (Instituto MBCBrasil).
Próximos passos
Conforme Gussi explicou, com base no “Compromisso de Belém pelos combustíveis Sustentáveis”, começa agora a fase de detalhar essa promessa de quadruplicar os combustíveis sustentáveis. O compromisso passa a integrar a chamada “agenda de ação”.
Nesta sexta, já houve uma reunião ministerial para identificar as primeiras formas de colocar o compromisso em prática. “De maneira simbólica, mostramos que estamos cooperando com o MME [Ministério de Minas e Energia]. Assim, nossa carta oferece suporte às medidas que o Ministério já vem desenvolvendo para concretizar o compromisso”, disse o dirigente da Unica.
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