Agro na COP30
Projeto aposta em agricultura regenerativa para reduzir carbono da soja na Amazônia
Usando biochar, pó de rocha e bioprodutos em propriedades-piloto, iniciativa quer converter práticas convencionais em 60 mil hectares do grão
Sabrina Nascimento | São Paulo | sabrina.nascimento@estadao.com
08/10/2025 - 05:00

Com foco nos Estados do Acre, Rondônia e Pará, um novo projeto busca estimular a produção de soja sustentável na Amazônia. A iniciativa pretende expandir práticas regenerativas e reduzir a pegada de carbono na produção local. O trabalho, ainda em fase inicial, está sendo conduzido pela Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa do Agronegócio (Fundepag).
Em conversa com o Agro Estadão, o líder de desenvolvimento de negócios e inteligência de mercado da Fundepag, Dennys Biaggi, explicou que a oportunidade surgiu a partir de uma chamada internacional para projetos de combate ao desmatamento na Amazônia. O projeto foi aprovado em abril deste ano e começou oficialmente em junho. “Nós estamos na fase de diagnóstico. Então, nossa equipe já foi ao Acre e a Rondônia. Na próxima semana, a equipe de especialistas vai para o Pará”, disse.
A meta é atingir 75 produtores, sendo sete no Acre, 35 em Rondônia e o restante no Pará, totalizando 60 mil hectares de produção convencional convertidos em agricultura regenerativa na colheita da safra 2025/26. “Os produtores não são apenas participantes. Eles são protagonistas do processo. Se eles não comprarem a ideia, o projeto não acontece”, afirmou. “Embora exista um trabalho com pequenos produtores, neste momento a maioria se classifica como médios e grandes”, acrescentou.

Segundo Biaggi, o papel da Fundepag é “fazer a ponte entre pesquisa e mercado”, identificando parceiros locais, especialistas e estruturando a proposta em três etapas: diagnóstico, capacitação e implementação em propriedades-piloto. O financiamento do projeto vem da Jacobs Futura Foundation (JFF), instituição filantrópica sediada no Reino Unido. O dirigente, no entanto, não detalhou o valor dos recursos destinados à ação.
Etapas
Nesta primeira fase do projeto, estão sendo aplicados protocolos de agricultura regenerativa baseado em princípios da economia ecológica. O processo gera uma nota de sustentabilidade de cada propriedade, de 0 a 10, a partir de critérios ambientais, sociais e econômicos. Com esse diagnóstico, na sequência serão organizados workshops de capacitação em que os produtores vão receber orientação sobre novas práticas de manejo e monitoramento.
Entre as tecnologias em teste, estão o uso de biochar — carvão vegetal que retém carbono e melhora a qualidade do solo —, a aplicação de pó de rocha para reduzir a dependência de fertilizantes químicos e o emprego de bioprodutos no lugar de defensivos convencionais. Segundo dados que embasam o protocolo, cada tonelada de biochar aplicada por hectare pode reduzir em até 2,2 toneladas as emissões de carbono. “Esses resultados serão monitorados em campo por meio de um aplicativo em desenvolvimento, que também permitirá acompanhar a performance dos produtores ao longo do tempo”, detalha Biaggi.

O diferencial, no entanto, vai além do suporte técnico. O projeto foi concebido para preparar os produtores a atender exigências crescentes do comércio internacional. Em destaque, o Regulamento Europeu de Produtos Livres de Desmatamento (EUDR), conhecido popularmente como lei antidesmatamento europeia, que vai exigir de importadores a comprovação da origem de commodities agrícolas. Caso não seja adiada novamente — hipótese já levantada devido a questões técnicas no sistema fazer o acompanhamento do cumprimento das regras —, a legislação entrará em vigor no encerramento deste ano. “A demanda global por soja é crescente, mas o mercado também cobra cada vez mais critérios de sustentabilidade. Quem não se adaptar vai perder espaço”, disse o executivo.
Além da Fundepag, a iniciativa envolve parcerias com o Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), a AgriTIERRA, consultoria britânica especializada em transformação digital de cadeias agroalimentares, e a Alauda Consulting, focada em commodities de risco de desmatamento. “Esse modelo colaborativo é essencial em projetos complexos como este, que envolvem desde o desafio logístico na Amazônia até a conexão com mercados internacionais”, destaca Biaggi.
Para ele, os aprendizados desse piloto poderão embasar uma futura expansão para outros estados da Amazônia Legal, caso haja interesse dos financiadores e adesão crescente dos produtores. “Estamos falando de uma cadeia que precisa se reinventar e o produtor brasileiro tem condições de liderar esse movimento se conseguir conciliar competitividade com sustentabilidade”, apontou.
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