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Economia

Falta de armazéns no Brasil compromete safra recorde e dispara custos do agronegócio

Com déficit de 120 milhões de toneladas na estocagem, produtores enfrentam filas de caminhões, alta no frete e perdas na qualidade dos grãos

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Paloma Custódio | Guaxupe (MG) | paloma.custodio@estadao.com

12/05/2025 - 05:00

Foto: Adobe Stock
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A crescente produção de grãos no Brasil tem esbarrado em um gargalo logístico cada vez mais evidente: a falta de capacidade de armazenagem. Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a safra 2024/25 deve alcançar um recorde de 330 milhões de toneladas, enquanto a capacidade estática de estocagem do país é de apenas 210,1 milhões de toneladas — um déficit potencial de quase 120 milhões de toneladas entre o que pode ser colhido e armazenado simultaneamente.

Ao Agro Estadão, a Conab ressaltou que o escalonamento da colheita, devido à sazonalidade das culturas e à existência de múltiplas safras ao longo do ano, permite um uso contínuo dos armazéns. Por isso, a simples comparação entre a produção total e a capacidade estática não representa, por si só, o déficit real, mas serve como um importante indicativo.

Mesmo assim, o impacto logístico da falta de armazéns tem sido sentido pelos produtores. O presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), Maurício Buffon, relata que os agricultores enfrentam longas filas em terminais ferroviários e armazéns, com caminhões parados aguardando descarga. “O Custo Brasil é muito alto por falta de armazenagem”, afirmou à reportagem.

Segundo Buffon, o déficit médio de armazenagem no país pode chegar a 60% e, em regiões como o Centro-Oeste e o Norte, esse número pode subir para 70%. “O agravante disso é que essas armazenagens nem sempre estão na mão do produtor rural. Às vezes, estão com empresas, tradings, cooperativas, e o produtor deixa de ser dono do seu próprio produto”, destaca.

Impacto no custo e na qualidade dos grãos

A ausência de estrutura adequada tem empurrado parte da produção diretamente para os caminhões. Buffon estima que cerca de 15% dos grãos colhidos são transportados imediatamente aos portos ou terminais ferroviários, por falta de espaço nos armazéns. Isso gera acúmulo nos terminais e eleva os custos dos fretes, que acabam sendo repassados ao consumidor final.

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Além do impacto financeiro, há também riscos à qualidade do grão. A soja, por exemplo, precisa ser armazenada com umidade em torno de 14% para garantir conservação prolongada. “Se o grão fica exposto ao tempo, em piscinões a céu aberto, a umidade sobe para 15%, 16% e já começa a estragar”, alerta Buffon.

Mesmo com armazéns, problemas persistem

Nem mesmo regiões com capacidade de armazenamento compatível escapam das dificuldades. Em Mato Grosso, que teve uma produção estimada em 97,38 milhões de toneladas de soja e milho na safra 24/25 — a maior do país segundo o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea) —, a capacidade de armazenamento é de apenas 52,29 milhões de toneladas, um déficit de 46,3%.

Em cidades como Lucas do Rio Verde, Sorriso, Tapurah e Sinop, no norte do estado, boa parte dos produtores possuem armazéns suficientes, mas a logística é um entrave. O produtor de soja e milho e presidente do Sindicato Rural de Lucas do Rio Verde, Tiago Cinpak, aponta que o problema é de infraestrutura logística para escoar a produção, o que pode  causar congestionamento nos armazéns. 

“Nossos portos ainda são deficitários, as ferrovias praticamente não existem, e as rodovias que utilizamos foram construídas nos anos 1980”, observa. “Se o produtor atrasar a venda, corre o risco de não ter onde armazenar a próxima safra. Um exemplo é o milho, que será colhido em julho: se não for escoado até dezembro, não haverá espaço para estocar a soja que vem em seguida”, exemplifica.

Soluções vão além dos armazéns públicos

Em nota, a Conab afirma que vem buscando parcerias para modernizar e expandir a capacidade dos armazéns públicos. A companhia disse que firmou convênio com a Itaipu Binacional e o Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos (UNOPS/ONU) para investir R$ 55 milhões na elaboração de projetos de modernização e reforma de armazéns localizados no Paraná e Mato Grosso do Sul. 

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No entanto, o presidente da Aprosoja Brasil, Maurício Buffon, discorda da eficácia dessa estratégia. “O país não precisa investir em armazém da Conab. Isso já está comprovado que não funciona. A solução é o governo vir com um plano coerente de equalização de juros com prazo para o produtor poder fazer armazenagem dentro de suas próprias propriedades”, defende.

O diretor executivo do Movimento Pró Logística de Mato Grosso, Edeon Vaz, concorda que a solução é disponibilizar linhas de crédito com taxas mais atrativas e prazos mais longos para pagamento. “Isso estimula o produtor a construir seus próprios armazéns ou coletivos, como os condomínios rurais de armazenagem”, afirmou ao Agro Estadão.

Segundo ele, a armazenagem feita diretamente pelo produtor é a mais vantajosa, porque permite que ele tenha controle sobre a comercialização da safra. “[Ao armazenar em sua propriedade], ele deixa de vender a preço de balcão e passa a ter o produto disponível para negociar, o que pode gerar uma diferença significativa de preço”, explica.

O presidente do Sindicato Rural de Lucas do Rio Verde, Tiago Cinpak, acrescenta que o problema também exige soluções estruturais. “Nós precisaríamos investir em portos, ferrovias e rodovias. Precisamos destravar alguns problemas ambientais”, argumentou em referência ao projeto da Ferrogrão — projeto ferroviário que pretende ligar Sinop (MT) ao porto de Miritituba (PA). A iniciativa tem gerado debates por questões ambientais, envolvendo áreas de conservação, terras indígenas e povos isolados.

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