Agropolítica
Governo discute com agro reação à tarifa de Trump
Preocupação do setor é com prazo anunciado, 1º de agosto, já que produtos perecíveis estão prestes a ser colhidos ou já estão a caminho dos EUA

Paloma Santos | Brasília | paloma.santos@estadao.com | Atualizada às 19h12
15/07/2025 - 16:06

O governo federal iniciou nesta terça-feira, 15, uma mobilização conjunta com o setor produtivo brasileiro para reverter a taxa de 50% imposta pelo presidente dos EUA, Donald Trump, às exportações do Brasil para aquele país.
Na parte da manhã, o Comitê Interministerial de Negociação e Contramedidas Econômicas e Comerciais, criado por decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e presidido pelo vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, reuniu representantes de algumas das maiores indústrias brasileiras para debater estratégias e ações para reverter a situação.
No período da tarde, foi a vez dos representantes do agronegócio participarem do debate. Todos — tanto do governo quanto do setor privado — reforçaram a importância do diálogo constante e construtivo com os Estados Unidos para tentar reverter a imposição das tarifas adicionais.
Integrantes dos setores mais atingidos reforçaram que as novas tarifas afetam cadeias produtivas inteiras, tornando inviável economicamente a exportação de alguns produtos brasileiros para os EUA. A maior preocupação é com o curto prazo, já que alguns itens perecíveis estão sendo produzidos ou já a caminho dos EUA.
Frutas
É o caso de frutas, como a manga. Segundo o presidente da Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frutas (Abrafrutas), Guilherme Coelho, produtores do Vale do São Francisco, região que produz 90% de toda a manga do Brasil, ‘estão em pane’. “Essa safra significa 2,5 mil contêineres de manga para os Estados Unidos. A safra foi planejada há seis meses, como todo ano fazemos. Está toda organizada em termos de embalagem. Isso engloba todos, os grandes, os pequenos, os médios produtores de manga”, afirmou.
De acordo com Coelho, é inviável absorver no mercado doméstico a produção da fruta ou destiná-la para a Europa, por exemplo. “O preço vai desabar, não tem logística para isso. Não podemos colocar essa manga no Brasil, porque vai colapsar o mercado. Então urge uma definição, o bom senso, a flexibilidade, um pensamento global, um pensamento geral, para que nós possamos não ter que deixar a manga no pé”, diz.
Café
Os representantes da cadeia cafeeira também alertaram para os impactos da taxação. Segundo o presidente do Conselho dos Exportadores de Café (Cecafé), Marcio Ferreira, a medida pode gerar efeitos inflacionários para os próprios americanos, já que o país não produz café em escala relevante. “Café não é produzido nos Estados Unidos, então não concorre contra o agro americano”, disse. “Os Estados Unidos é o maior consumidor de café, e o Brasil representa 33% de todo o café consumido lá”, complementou.
Ferreira ressaltou que o café brasileiro é o mais competitivo do mercado, tanto o arábica quanto o robusta, com qualidades que agradam ao consumidor americano. Em 2024, o Brasil exportou um total de 50,4 milhões de sacas, sendo 8,2 milhões destinadas ao mercado norte-americano.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), Pavel Cardoso, reforçou a importância do café brasileiro para os EUA, ao lembrar que 76% dos americanos consomem a bebida e que a indústria ligada ao produto representa 1,2% do PIB americano. “A indústria americana, por lá, também negocia esse equilíbrio da relação comercial Brasil-Estados Unidos, há todo um sentimento do setor de que isso seja resolvido”, afirmou.
Suco de laranja
O presidente da Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR), Ibiapaba Netto, manifestou preocupação com os efeitos da medida para o suco de laranja brasileiro. Segundo ele, a tarifa de 50%, somada aos US$ 415 por tonelada já pagos, pode inviabilizar os embarques. “Certamente inviabiliza”, disse.
De acordo com Netto, a safra brasileira está no início, e o setor ainda não sabe se o segundo maior mercado do setor estará disponível até o fim do ciclo, que vai até janeiro. Ele defendeu a continuidade das negociações. “Ainda tem tempo para negociação, manter o pragmatismo, e a gente tem confiança que vai conseguir alcançar um bom resultado”.
Netto ressaltou a interdependência entre os dois países no setor: 70% do suco importado pelos EUA é brasileiro. De acordo com ele, 40% das exportações do suco têm como destino o mercado americano, que no último ano, gerou US$ 1,3 bilhão em receitas.
Mapa buscará alternativas
O ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, reconheceu a ‘angústia’ do setor e falou sobre ‘alternativas para a produção brasileira’. “Nós vamos, então, intensificar a busca de alternativas, mas não é possível em 10 ou 15 dias dar destino a tudo isso que se produz no Brasil e é vendido para os Estados Unidos. O diálogo está aberto da parte brasileira, mas com respeito à soberania e com muita altivez”, disse.
O ministro também ressaltou a abertura de novos mercados e a ampliação de outros. “O Brasil, liderando esse processo, gerou uma oportunidade de 393 novos mercados abertos para a agropecuária brasileira, além das ampliações”, afirmou.
No entanto, o ministro enfatizou que não está em discussão o estabelecimento de cotas, limitando a quantidade de produtos exportados com isenção ou redução tarifária para os Estados Unidos, mesmo diante das novas barreiras anunciadas.
No encontro, o vice-presidente da República classificou a decisão dos Estados Unidos como ‘equivocada’. Alckmin ressaltou a importância do setor agropecuário para a economia brasileira. Tanto na reunião da manhã quanto da tarde, o vice-presidente disse que a taxação não é boa para nenhum dos dois lados. “Os Estados Unidos têm déficit na balança comercial com boa parte do mundo, mas têm superávit na balança comercial com o Brasil, tanto no setor de serviços quanto de bens, há mais de 15 anos”, destacou.
“Dos 10 principais produtos que os Estados Unidos exportam para nós, oito são ex-tarifários ou tarifa zero, não pagam nenhum imposto para entrar no Brasil. E a tarifa média é de 2,7%”, explicou. Alckmin também enfatizou que as exportações do Brasil para os EUA cresceram 4,37% no primeiro semestre deste ano. “E dos Estados Unidos pra nós cresceram 11%”, disse.
Ao final da reunião, o vice-presidente Geraldo Alckmin afirmou que os próximos dias serão decisivos para tentar reverter as tarifas impostas pelos Estados Unidos a produtos brasileiros. Segundo ele, o governo continuará as conversas com empresários dos dois países, cooperativas e entidades como a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e Confederação Nacional do Comércio (CNC)
Além de Alckmin, presidente do Comitê, e Fávaro, o encontro contou com participação dos ministros André de Paula (Pesca e Aquicultura), Silvio Costa Filho (Portos e Aeroportos) e Rui Costa (Casa Civil) — além de representantes do Ministério da Fazenda, Relações Exteriores.
Confira outros representantes do setor que participaram da reunião:
- Eduardo Lobo, Presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Pescado (Abipesca);
- Renato Costa, Presidente da Friboi (JBS);
- Silas Brasileiro, Presidente do Conselho Nacional do Café (CNC);
- Paulo Pratinha, Presidente do Conselho Administrativo da Sucos BR
- Thomaz Nunnenkamp, Diretor da Fiergs.

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