FEICORTE 2025
“A febre aftosa é página virada, uma conquista de todo o setor”, afirma Guilherme Piai
Em entrevista ao Agro Estadão, o secretário de Agricultura de SP dá detalhes sobre os programas assinados e anunciados durante a Feicorte 2025

Juliana Camargo | Presidente Prudente (SP)
23/06/2025 - 08:00

Terminou neste sábado, 21, a Feicorte 2025. Vitrine da cadeia produtiva de corte, o evento reuniu pecuaristas, empresas e pesquisadores durante cinco dias em Presidente Prudente (SP). Com o tema: “Boi brasileiro, produtivo por natureza”, a feira apresentou tecnologias e programas de melhoramento da qualidade da carne bovina produzida no país. Autoridades do estado e do país visitaram o local. Entre eles, o secretário de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Guilherme Piai. Terceira geração de uma família de pecuaristas, Piai assumiu a SAA em outubro de 2023 e teve participação direta na retomada da Feicorte que, desde o ano passado, é realizada em sua cidade natal: Presidente Prudente.
Usando chapéu boiadeiro, botina e vestindo a camisa da Feicorte, Piai chegou para a entrevista ao Agro Estadão. À reportagem confessou que deseja que a Feicorte se transforme na “Agrishow da pecuária”. O secretário também falou sobre a atividade pecuária no estado, os acordos assinados durante a Feicorte 2025 e não poupou críticas ao Governo Federal, a quem faz oposição. Confira trechos da entrevista.
– O senhor é de Presidente Prudente e trabalha com pecuária. Esses foram os motivos para trazer a Feicorte para cá?
Fico muito feliz que a Feicorte seja feita na cidade que eu amo, nasci e cresci. Prudente tem uma história muito forte com a pecuária, muitas famílias daqui desbravaram o agro brasileiro. Então a gente conseguiu recuperar essa época de ouro da pecuária prudentina e era uma demanda da cidade. A Feicorte, que estava desativada há muitos anos e é uma marca muito forte, combina com o interior. Tem que estar mais perto do pecuarista, do agricultor, da mulher e do homem do campo. Tecnicamente a cidade foi escolhida pela localização, próxima ao Paraná e a Mato Grosso do Sul, por ter o segundo aeroporto com maior movimentação de público no interior do estado e um recinto com estrutura muito adaptada para receber animais. E essa segunda edição mostrou que ela veio para ficar. O Recinto de Exposições ‘Jacob Tosello’, onde nós estamos, era do estado e na abertura da Feicorte foi oficializada a entrega ao município. E a gente vai conseguir trazer entidades e parceiros da iniciativa privada para que esse parque fique ainda melhor e receba investimentos que movimentem a economia.
– No primeiro dia da Feicorte foi feita a regulamentação do Fundesa-PEC (Fundo de Defesa Sanitária para Pecuária). Como vai funcionar o fundo, já que a partir de novembro começa a ser feita a cobrança dos pecuaristas?
É um fundo público, mas com uma gestão muito compartilhada com a iniciativa privada. O projeto de lei que nós aprovamos na Assembleia Legislativa foi discutido amplamente. A cobrança vai ser muito mais barata que a compra da vacina: em torno de R$ 1 por cabeça de gado. Só a vacina [contra a febre aftosa] custava mais de R$ 2, fora o manejo. É segurança jurídica, é o próprio setor criando um fundo para se financiar caso aconteça algum problema. Em vez de receber indenização por 50% do rebanho, vai receber por 100%. Quando a gente chegar num nível de arrecadação bom vamos contratar um seguro para proteger todo o rebanho paulista e, daqui alguns anos, não cobrar mais para o pecuarista. Mas era necessário. Era uma determinação do Ministério da Agricultura e a gente fez com muita sabedoria, trocando ideias e ouvindo o setor privado, todas as entidades. E o valor ficou muito acessível
– O Estado de SP tem um rebanho aproximado de 11 milhões de cabeças de corte. Todos serão obrigados a participar? E como será feita a cobrança?
Todos. A defesa agropecuária vai emitir uma guia para pagamento levando em consideração o número de cabeças que cada pecuarista tem. Se tem 10 cabeças paga R$ 10. Do mesmo jeito que o pecuarista paga o GTA, vai ser gerado um boleto para ele realizar o pagamento. Não é uma cobrança, é um financiamento do setor para criar um fundo que vai proteger o próprio pecuarista. O governo não vai pôr a mão num centavo desse recurso, ele está blindado na lei. Não tem superávit, esse recurso é 100% do pecuarista paulista.
– É para o caso de uma eventualidade, proteger aquela propriedade? Aquela região? Ou proteger todo o rebanho de 11 milhões de cabeças? Até em caso de bloqueio comercial e queda nos preços?
O seguro é para pagar a indenização do rebanho que foi contaminado. A gente não consegue controlar tudo. Nós temos que gastar energia naquilo que a gente tem poder de decisão. O mercado se autorregula, lei de oferta e demanda, e a gente não tenta interferir nisso. O caso de gripe aviária no RS, que já foi suprimido, fechou a exportação de carne de frango, teve mais oferta de frango no mercado interno, por um momento derrubou o preço, agora já se recuperou, temos que nos preparar dentro dos limites que o estado consegue atuar. Controle de mercado foge da nossa alçada.
– Já que o senhor citou a gripe aviária há previsão de criação de fundo para outras atividades pecuárias?
O setor da avicultura está se organizando para que possa se criar um fundo indenizatório para eles. O setor da suinocultura também. Mas tem que ser uma decisão do setor. Nós somos indutores, nós somos facilitadores, mas a decisão final tem que vir deles.
– Com a vacinação obrigatória para febre aftosa, muitas vezes o pecuarista aproveitava aquele momento para vacinar o rebanho para outras doenças e fazer um maior controle sanitário da propriedade. Como será feito controle de outras doenças?
A defesa agropecuária tem que focar em outras doenças como tuberculose, brucelose. Já está sendo feito um manejo em outras propriedades do estado de São Paulo para a gente levantar esse problema e zelar cada vez mais pela qualidade sanitária do nosso rebanho. A aftosa é uma página virada, uma luta de pecuaristas por décadas, é uma conquista de todo o setor.
– Falando em febre aftosa, como tem sido o diálogo com o governo federal para os temas do agro paulista?
Foi uma vergonha que o governo federal fez ao pegar o certificado dessa luta [o status livre de aftosa sem vacinação], colocar na mala e entregar para um presidente que não participou de nada. E os estados, com os secretários de agricultura, e os pecuaristas lá presentes ficaram a ver navios. Uma vergonha o que está sendo feito com o IOF, que vai prejudicar o produtor rural principalmente o pequeno que depende de cooperativas de crédito. Uma vergonha o que será feito com a LCA, a Letra de Crédito Agrícola que vai encarecer ainda mais os juros. Uma vergonha esse contingenciamento de 50% do recurso do Seguro Rural, que já era muito menor do que o setor precisava. R$ 1 bilhão que estava na LOA [Lei Orçamentária Anual] e contingenciaram 445 milhões, 42%. O Seguro Rural Brasileiro hoje não cobre 10% das nossas lavouras e expõe o produtor ao risco. Então, é difícil a gente trabalhar num país onde o produtor rural, a mulher e o homem do campo, infelizmente estpa sendo criminalizado e culpado pelo governo federal.
– No ano passado foi lançado o programa de rastreabilidade bovina no estado de SP. Em seguida foi lançado o Plano Nacional de Rastreabilidade de Bovinos e Bubalinos. Como está a rastreabilidade no estado?
São Paulo lançou um programa de rastreabilidade voluntária. Nós temos sempre que frisar pela liberdade do nosso produtor e isso, para mim, é inegociável. Nós demos essa liberdade e alguns aderiram, não na velocidade que a gente imaginava. Mas cada dia mais pecuaristas estão aderindo principalmente aqueles que conseguem agregar valor na venda do produto rastreado. É muito barato o custo para rastreabilidade, um brinco, pelo que ele recebe a mais pela arroba exportada. A gente espera que com o ‘boca a boca’ cada vez mais aumente a adesão. Mas quando eu olho a rastreabilidade individual e total ela é praticamente impossível. Nós temos um rebanho muito grande no Brasil. Colocar o brinco em todos esses animais não é uma operação fácil. A pecuária está muito profissional, o ciclo de vida do gado está muito curto, então, é muito difícil você conseguir brincar todos os indivíduos. Um exemplo: Mato Grosso do Sul tem aproximadamente 20 milhões de cabeças. Para brincar todo o rebanho em um ano, 365 dias, precisaria brincar 60 mil cabeças por dia. Isso é operacional? Dentro desse ano, quantas cabeças vão estar morrendo já? A gente tem que pensar na rastreabilidade através de blockchain [histórico digital] como é feito na agricultura, como é feito com o milho e a soja. Eu acho que esse é o caminho para a gente conseguir rastreabilidade da carne bovina.
– Como pecuarista o senhor incentiva a rastreabilidade?
Eu incentivo a prática porque você consegue agregar valor. Como programa de estado poucos pecuaristas têm hoje acesso a uma carne com valor agregado e ao mercado internacional. Nós temos 400 mil produtores no estado de São Paulo, 82% têm até 60 hectares. E para a gente conseguir ter rastreabilidade do que é produzido em São Paulo a gente acredita que seja através de blockchain.
– Seria o programa anunciando aqui na Feicorte em parceria com a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (ABIEC) ?
A ABIEC nos aportou um recurso para que a gente termine o desenvolvimento da plataforma, que está em fase final, onde vamos conseguir a rastreabilidade de todas as propriedades do estado de SP cruzando os dados dos sistemas que temos na secretaria. Nós temos uma riqueza de dados gigantesca, mas precisamos organizar esses dados. Estamos cruzando os dados de três sistemas: do Cadastro Ambiental Rural (CAR), que no estado de São Paulo é o mais avançado do Brasil, com o sistema do Gedave (Sistema Informatizado de Gestão de Defesa Animal e Vegetal), com o nosso sistema de Rotas Rurais, que é o endereço rural digital. Então, acreditamos que vai ser a primeira plataforma do Brasil a ser credenciada através de rastreabilidade blockchain.

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