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Agropolítica

“O Plano Safra já está impactado”, diz secretário de Política Agrícola

Sobre o congelamento de R$ 445 milhões no orçamento do Seguro Rural, Guilherme Campos afirma que o orçamento deve ficar ainda “mais apertado” com a renegociação das dívidas dos produtores gaúchos 

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Paloma Santos | Brasília | Atualizada em 24/06/2025 às 12h00

20/06/2025 - 16:34

Foto: Adobe Stock
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Com as tensões em alta entre governo e setor produtivo, o Plano Safra 2025/26 deve sofrer impactos relevantes, não apenas em razão da meta fiscal e da elevação da Taxa Selic, mas também pela renegociação das dívidas dos produtores do Rio Grande do Sul. A avaliação é do secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Guilherme Campos.

Em entrevista ao Agro Estadão, nesta sexta-feira, 20, Campos confirmou a criação de um grupo de trabalho para discutir uma solução estruturante para o problema das dívidas de produtores rurais gaúchos, que somam perdas, em função das enchentes do ano passado e desta semana. “Essa discussão se torna ainda mais emergencial com a cheia que está acontecendo agora. Nós vamos fazer todo esforço para que isso ocorra na próxima semana”, disse.

Ao comentar o congelamento de R$ 445,1 milhões no orçamento do Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR), o secretário reconheceu que vários fatores vão afetar diretamente a construção do próximo Plano Safra, cuja expectativa é que seja oficialmente anunciado nas próximas semanas. “Está tendo que se tomar outros caminhos, e são todos eles custosos e difíceis”, disse.

O Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural subsidia parte do valor pago pelos produtores na contratação de seguros, ajudando a reduzir perdas financeiras causadas por eventos climáticos. Considerado um dos principais instrumentos de gestão de risco do setor, o PSR viabilizou, em 2023, a cobertura de mais de 9 milhões de hectares, segundo o Ministério da Agricultura.

A redução no orçamento do PSR equivale a 42% da dotação total de R$ 1,060 bilhão prevista para o prêmio em 2025. Os dados foram inseridos no Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (Siop) e confirmados por Campos. Segundo ele, as áreas mais impactadas foram o PSR e a comercialização.

Do total, R$ 354,6 milhões foram bloqueados e outros R$ 90,5 milhões, contingenciados. Com a contenção, restam cerca de R$ 435,6 milhões para a contratação de apólices em 2025. “Vai haver priorização, como ocorre todos os anos”, sintetizou o secretário.

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Segundo o secretário, a escolha do PSR como alvo da contenção se deu por razões técnicas. “É um orçamento grande, e é onde, ao longo do ano, mais se recompõe”, afirmou. O bloqueio é uma exclusão definitiva dos recursos para cumprimento do limite de gastos do arcabouço fiscal. Já o contingenciamento é uma suspensão temporária, sujeita à liberação posterior, dependendo da arrecadação federal.

Em relação à ausência de comunicação ao setor e parlamentares sobre a redução, Campos disse que “foi feito como é feito todos os anos, não tem comunicação”. Questionado sobre a possibilidade de suplementação orçamentária, o secretário respondeu que “não há como prever”.

A decisão do Ministério da Agricultura acata contenção determinada pelo Governo Federal de R$ 31,3 bilhões em despesas. O Decreto nº 12.477, publicado no Diário Oficial da União em 30 de maio, estabeleceu o bloqueio de R$ 10,6 bilhões, devido ao aumento de despesas obrigatórias, e o contingenciamento de R$ 20,7 bilhões, como medida de garantia da meta de resultado primário.

O que dizem as seguradoras

Em nota, a Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg) e a Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), que representam as seguradoras que operam o seguro rural no Brasil, informaram que receberam com preocupação a notícia sobre o bloqueio do PSR. As entidades, que não foram oficialmente comunicadas pelo governo federal, alertam que, caso confirmado, o corte representará um duro golpe à política de proteção contra riscos agroclimáticos, especialmente para os produtores que não têm condições de arcar integralmente com o custo do seguro.

No texto, a Fenseg e a CNseg ressaltam que a área segurada no país já sofreu forte retração nos últimos anos, caindo de 14 milhões para 7 milhões de hectares entre 2023 e 2024 – uma redução de 50%. “Contando com o apoio do governo federal, as seguradoras ampliaram sua capacidade de assumir riscos e aprimoraram produtos e serviços, com o objetivo de atingir a meta de 20 milhões de hectares protegidos”, afirma o texto.

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De acordo com as instituições, se o bloqueio for mantido, a projeção é de uma nova queda drástica na área segurada, que pode ficar abaixo de 5 milhões de hectares em 2025. “Anteriormente, as seguradoras já haviam solicitado ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) um orçamento adicional de R$ 2,8 bilhões para o próximo ano”, informaram.

Ex-secretários defendem mudança estrutural para seguro rural

Para Ivan Wedekin, ex-secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura e Diretor de Commoditiesl na BM&FBOVESPA, a principal fragilidade do PSR está no fato de seus recursos estarem alocados no orçamento discricionário do próprio ministério — o que o torna suscetível a bloqueios e contingenciamentos, como o ocorrido neste ano. “O orçamento do seguro rural compete com despesas operacionais do ministério, como conta de luz, viagens e outros gastos. Por isso, é fácil, entre aspas, fazer esse contingenciamento”, afirmou.

A proposta, segundo o ex-secretário, é transferir o orçamento do seguro rural para o Tesouro Nacional, dentro das operações oficiais de crédito (2OC), onde estão recursos como os destinados à equalização dos programas Pronaf e Pronamp. “Porque lá esses valores não são contingenciáveis e é lá que estão contabilizados os gastos com equalização de investimento”, defendeu.

Wedekin avalia que não há solução imediata. “No curto prazo não tem caminhos e essa é mais uma notícia ruim que se levanta sobre agricultura e o agronegócio às vésperas do governo lançar um plano safra”, enfatizou. 

Para Guilherme Bastos, especialista da FGV Agro e ex-secretário de Política Agrícola, a decisão de contingenciar parte do orçamento do PSR reflete uma limitação estrutural. “Infelizmente, não está muito nas mãos do Ministério da Agricultura. Essa é uma decisão tomada pela Fazenda junto com o Ministério do Planejamento e Orçamento”, afirmou. Segundo ele, ao manter o Seguro Rural dentro das despesas discricionárias, o governo fragiliza um instrumento essencial de política pública. “Manter esse recurso como contingenciável é realmente um tiro no pé. Depois, o governo é obrigado a continuar renegociando dívidas com os produtores, como tem acontecido.”

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Bastos também criticou a desproporção entre os recursos destinados ao Proagro e ao PSR. “O Proagro precisa ser revisado. Ele não está sinalizando aos produtores a necessidade de mudança nas práticas produtivas diante da persistência de eventos climáticos extremos. Já o PSR, mesmo com menos recursos públicos, tem uma abrangência e número de produtores muito maior”, avaliou. Para ele, a alocação de recursos deve ser reavaliada com base em critérios técnicos e de impacto. “Isso deveria ser muito bem estudado e avaliado pelo Ministério da Fazenda e pelo Ministério do Planejamento e Orçamento, na condução da gestão de risco na atividade agropecuária.”

Cientista político vê desgaste na articulação institucional

Para o cientista político Leandro Consentino, a redução do orçamento do seguro rural sem comunicação prévia reforça a imagem de desorganização na articulação do governo com o setor agropecuário. Ao Agro Estadão, o especialista apontou que “medidas econômicas de vulto foram tentadas ou foram tomadas num contexto em que o ministro da Fazenda saiu de férias e o presidente estava em viagem internacional. Isso já reflete uma desorganização de articulação política muito grande”.

Consentino também avalia que esse tipo de gesto pode dificultar a aprovação de pautas no Congresso Nacional, afetar a negociação do Plano Safra e enfraquecer a relação entre o governo e um setor com forte representação política. “É um risco político bastante grave perder interlocução com um setor tão essencial da economia. O desgaste pode comprometer inclusive a viabilidade de medidas futuras e a construção de um denominador comum entre governo e agro”, disse.

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