Agropolítica
Entenda por que o seguro rural não foi prioridade no Plano Safra
Único setor atendido pelo Plano Safra 24/25 com recursos para o seguro rural, arrozeiros defendem um modelo de seguro próprio para a cultura
5 minutos de leitura 05/07/2024 - 12:53
Fernanda Farias | fernanda.farias@estadao.com
Os R$ 210 milhões em recursos extras para a subvenção do seguro rural anunciados pelo governo federal nesta semana aos produtores rurais do Rio Grande do Sul criaram um grande ponto de interrogação em todo o setor produtivo. Será só isso? Terá mais recurso para todos?
A própria Federarroz, que representa as associações de arrozeiros do Rio Grande do Sul avalia que o recurso é pouco, diante de todas as dificuldades que o agricultor gaúcho enfrenta neste ano. E o presidente da entidade, Alexandre Velho, afirma que o seguro rural precisa evoluir.
“Temos de ter um modelo de seguro para o arroz que traga mais segurança, vamos precisar desenvolver um produto mais adequado para a cultura”, disse ao Agro Estadão. A ideia já foi lançada para o ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, com quem a Federarroz se reuniu esta semana em Brasília.
Relatos de arrozeiros afetados pelas enchentes e inundações que não estão conseguindo acionar o seguro deixaram o ministro assustado, conforme o Agro Estadão apurou. O que pode ser um sinal de que o assunto tem chances de ganhar a atenção do governo.
Promessa de R$ 3 bi para seguro rural foi renovada
Com o recurso extra para o Rio Grande do Sul anunciado no Plano Safra, o volume disponível para subvenção do seguro rural em 2024 alcança R$ 1,1 bi, ainda bem abaixo do considerado necessário pelo setor. As entidades que representam os agricultores batem no mesmo número: R$ 3 bilhões, no mínimo.
Na coletiva de imprensa após o evento no Palácio do Planalto, o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, disse que o pleito do setor será trabalhado na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025. Em outros momentos, ele já havia defendido o volume de R$ 3 bi para o PSR e declarou que o governo estudava fortalecer o seguro rural. Inclusive, na proposta inicial para o Plano Safra liderada pelo ex-secretário de Política Agrícola, Neri Geller, constava o indicativo de R$ 2,5 bi para o seguro (veja abaixo).
Mas o que fontes do governo dizem é que Fávaro não teve “voz ativa” na elaboração do Plano Safra e nem terá na definição dos recursos para o seguro rural. A conversa de bastidor ganha força ao considerar que o Mapa conseguiu muito menos da equipe econômica do governo do que o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
O que significa não falar em seguro rural agora
Diante da possibilidade de não haver mais suplementação para o seguro rural neste ano, e da discussão sobre o valor de 2025 ser protelada, especialistas no assunto dizem que o governo federal está passando uma mensagem clara para o mercado e para o produtor rural: isso não é prioridade para mim.
E, com isso, os investidores reduzem os investimentos porque veem que o Brasil tem problemas climáticos e não atua para mitigar os riscos. As seguradoras deixam de atuar porque não existe certeza quanto ao subsídio. E o produtor rural fica descoberto, partindo para a renegociação de dívidas se houver perdas.
“Sem ter certeza do subsídio, o produtor decide apostar contra o clima. Era o que acontecia em 2020. Ou seja, estamos conseguindo retroceder”, disse uma fonte que já trabalhou no Ministério da Agricultura e que prefere não se identificar.
O consultor do Instituto Pensar Agro (IPA), Célio Porto, lembra que o governo também não incluiu o seguro rural no anúncio do Plano Safra no ano passado. E nos três anos anteriores, mesmo anunciando os recursos pretendidos, não cumpriu e os valores disponibilizados no orçamento aprovado pelo Congresso Nacional foram inferiores. Como o seguro rural segue o ano civil e não o ano safra, os recursos só são definidos junto com o orçamento da União.
“Mesmo assim, cria-se a expectativa entre as seguradoras e os produtores. Quando o governo fala sobre as intenções [de recursos], dá um balizador para as empresas tomarem as decisões, planejar procedimentos, aperfeiçoar produtos – elas não podem esperar pela aprovação do orçamento”, diz Célio Porto ao Agro Estadão.
Quanto aos produtores rurais, Porto avalia que eles nunca precisaram tanto do seguro rural como agora. “Mais do que nunca, seria necessário uma sinalização mais robusta em relação ao seguro rural, com tantas perdas seguidas no sul, perdas no centro-oeste com a seca”, afirma.
Investir mais em seguro ou continuar focando em crédito?
No Brasil, só um em cada quatro agricultores que fazem o seguro rural consegue o subsídio, porque os recursos do governo federal não são suficientes. Especialistas criticam que poucos contratam e muitos precisam, o que acaba elevando os preços do seguro. “O risco aumentou, e o prêmio acompanha o risco. É natural que as seguradoras passem a cobrar mais”, diz Célio Porto.
O principal resultado disso é a redução de área coberta por seguro no país, que caiu pela metade nos últimos três anos. Em 2021, por exemplo, foram 13,68 milhões de hectares assegurados no PSR, segundo o Ministério da Agricultura. Em 2023, essa área passou para 6,2 milhões de hectares.
Para efeito de comparação, os Estados Unidos investem cerca de 100 vezes mais no programa de seguro rural que o Brasil e têm uma área coberta de 200 milhões de hectares. Ao contrário daqui, por lá, a política de apoio ao agricultor está baseada no seguro, e não no crédito.
Uma fonte com experiência em política agrícola ouvida pelo Agro Estadão diz que o Brasil deveria economizar nos recursos para o crédito rural e usá-los para subvenção do seguro. “Aí você teria uma política agrícola mais moderna, pensando em gestão de risco agropecuário e eliminando o problema de renegociação de dívidas”, diz a fonte.
O consultor do IPA concorda que, do ponto de vista de política pública, o seguro rural precisaria de um apoio que não tem recebido. “O mundo todo apoia mais o seguros do que o crédito porque no mundo todo os juros são mais ‘camaradas’. No Brasil, com as taxas de juros que existem, a prioridade sempre será o crédito”, diz Celio Porto.
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