Agropolítica
A cada dez agricultores, quatro não conseguem subsídio do seguro rural por falta de recursos do governo federal
Especialistas apontam que o seguro só vai melhorar com mais dinheiro para subvenção; R$ 3 bi seria o ideal.

Fernanda Farias | fernanda.farias@estadao.com
27/02/2024 - 08:00

O seguro morreu de velho – diz o ditado. Mas no caso da agricultura brasileira, a maioria dos produtores rurais não segue aquela recomendação que diz “melhor prevenir do que remediar”. É que apenas 15% das áreas plantadas esteve coberta pelo seguro rural em 2023, o equivalente a 14 milhões de hectares. E a estimativa da Federação Nacional de Seguros Gerais (Fenseg) é de que esse índice gira em torno dos 10% na safra de 2023/2024.
E não é por falta de vontade ou necessidade, já que o seguro rural é considerado um importante aliado do produtor diante de tanta interferência do clima na produção. O principal motivo apontado por especialistas e pelos próprios agricultores, é o preço alto que precisam pagar pelo seguro – que, teoricamente, deveria garantir a rentabilidade da produção em caso de perdas.
O produtor de soja e milho Hermann Weingad, do Tocantins, faz um cálculo simples para provar que não “vale a pena” pagar pelo seguro rural. “Se você pegar dez anos de seguro, teria 60% desse valor pra usar em momentos de perdas”, referindo-se ao custo de 6% do valor na apólice no caso da lavoura dele.
Atualmente, a taxa média das apólices no país está em 9,3% – em 2021 era de 7,53%. Esse é um dos motivos para que o produtor desista do seguro, diz o assessor técnico de Política Agrícola da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
“Com adversidades climáticas e falta de recursos na subvenção, o prêmio do seguro ficou mais caro. E mais a margem apertada, devido aos valores de mercado, fizeram com que o produtor sacrificasse o seguro rural”, afirma Guilherme Rios, em entrevista ao Agro Estadão.
Programa de Subvenção ao Seguro Rural é insuficiente
O Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural do governo federal (PSR) subsidia parte do valor pago pelo produtor na contratação do seguro. No caso da soja, a subvenção é de 20%, exceto para as regiões Norte e Nordeste, onde é 30%. Os demais grãos, frutas, hortaliças, café, cana-de-açúcar, florestas, pecuária e aquicultura têm uma subvenção de 40%.
Na safra 2023/2024, o volume de recursos oferecidos pelo PSR foi orçado em R$964,5 milhões. Mas parte dele ainda pode ser contingenciado, ou seja, o governo pode tirar dinheiro do PSR e usar para outras demandas.
O valor não é considerado suficiente para atender a demanda, na avaliação de especialistas, produtores e do próprio governo. O ministro da Agricultura já afirmou que o R$1 bilhão que tem sido negociado nos últimos anos é pouco e que ele “pleiteia R$ 2bi”.
A CNA estimava que o valor necessário para 14 mil hectares de áreas em 2024 era de R$3 bilhões. “Então, estamos com um terço do recurso necessário e esperamos uma suplementação urgente. Além do recurso não atender às necessidades do setor, o governo ainda pode cortá-lo”, avalia o Assessor técnico, Guilherme Rios.
O valor é o mesmo sugerido pelo presidente da comissão técnica de Seguros Rurais da Fenseg. “Precisamos aumentar o recurso da subvenção para que mais agricultores sejam amparados pelo seguro. E distribuí-lo pelas regiões do país, de acordo com o período de cultivo e tipo de problema que afeta cada cultura”, explicou Joaquim Neto ao Agro Estadão.

Poucos contratam e muitos precisam
A avaliação geral dos especialistas ouvidos pelo Agro Estadão é que hoje poucos contratam o seguro rural e muitos precisam do amparo. A área coberta também deveria ser em torno de 50% das lavouras, para garantir a produção, e não 15% como foi na última safra. Outro ponto é a importância de regionalizar o seguro rural. Por isso, o consenso: não é preciso implantar um novo modelo de seguro rural no país, e sim, qualificar e ampliar o que já existe.
“Por exemplo, tradicionalmente, Mato Grosso tem regularidade climática, mas sofreu com o El Niño nesta safra. Só que os produtores não contratam o seguro rural, porque ele não atende às particularidades do estado. MT é o oitavo estado em contratação de apólices”, explica o assessor técnico de Política Agrícola da CNA, Guilherme Rios.
“Quatro em cada dez agricultores não conseguem subsídio porque o recurso acaba. Se houvesse aumento, poderia atender a todos e, inclusive, aumentar a carteira.”
Joaquim Neto – pres. comissão técnica de Seguros Rurais da Fenseg
A comissão de Seguros Rurais da Fenseg discute ideias para tornar o seguro mais acessível aos produtores. Na avaliação do presidente da comissão, além do dinheiro insuficiente, o período de pagamento da subvenção prejudica o agricultor que contratou o seguro mais tarde.
“Quando o agricultor contrata o seguro, ele não tem certeza se ainda existirá recurso quando ele precisar. Porque existe o que chamamos de ‘fila cega’. O agricultor torce para sobrar dinheiro, mas nem sempre acontece. Hoje o seguro agrícola tem atendido 60% dos agricultores que contratam. O restante não tem acesso à subvenção e assume o custo total”, diz Joaquim Neto.


São Paulo e Paraná têm programas estaduais para o seguro rural
Dois estados brasileiros possuem programas estaduais de incentivo ao seguro rural e pagam uma subvenção ao produtor que contrata a apólice. O Paraná foi o pioneiro ao criar o programa em 2009, e São Paulo adotou a iniciativa em 2020,
No caso de São Paulo, o governo ofertou R$ 90 milhões para a safra 2023/2024, R$ 5 milhões a mais que no ciclo anterior. E neste ano, a quebra da produção em SP deve ficar entre 25% e 30%, segundo estimativa do próprio governo.
O secretário de Agricultura de São Paulo diz esperar que outros estados sigam o exemplo e adotem programas específicos. Segundo Guilherme Piai, o governo federal precisa entender a importância e o tamanho do agronegócio brasileiro e aumentar o valor disponibilizado.
“Dado à importância do agro, que tem maior participação do PIB a cada ano, o governo tem que ter essa conscientização, especialmente num ano com quebra efetiva na safra”, opinou ao Agro Estadão.

Newsletter
Acorde
bem informado
com as
notícias do campo
Mais lidas de Agropolítica
1
Moratória da Soja: Dias Toffoli pede vista e suspende julgamento no STF
2
Fávaro pede apoio à FPA para aprovação de fundo nacional para indenizar produtor
3
Aprovação do marco do licenciamento ambiental destrava logística, avalia setor agropecuário
4
Produtores do RS bloqueiam rodovias e pressionam por securitização da dívida rural
5
Gripe aviária: chega a 10 países com suspensão total das exportações de carne de frango do Brasil
6
Desastres climáticos: CRA aprova securitização de dívida rural

PUBLICIDADE
Notícias Relacionadas

Agropolítica
Goiás confirma primeiro caso de gripe aviária em aves de subsistência
Laudo técnico divulgado pela Agrodefesa nesta sexta-feira, 13, deu positivo para as mortes registradas em Santo Antônio da Barra

Agropolítica
FPA critica MP das LCAs e diz que cidadão ‘vai pagar a conta’
Bancada lança carta à sociedade brasileira em que rebate falas do ministro da Fazenda e aponta impactos sobre o preço dos alimentos

Agropolítica
Mapa publica ZARC para a cultura da mamona
Resistente à seca, planta é uma alternativa para diferentes regiões é valorizada, principalmente, por conter alto teor de óleo

Agropolítica
Autocontrole: decreto regulamenta processos administrativos em casos de infrações de empresas
Regramento traz a possibilidade de recorrer a mais de uma instância ou converter a penalidade em um Temo de Ajustamento de Conduta
Agropolítica
Taxação das LCAs: entidades do agro repudiam MP do governo federal
Federações da Agricultura e Pecuária afirmam que irão trabalhar para que deputados e senadores barrem a medida
Agropolítica
Há maneiras de compensar o fim da isenção para títulos, afirma Haddad
Ministro disse ainda que agro mudará de opinião sobre medidas se aceitar reunião com Fazenda
Agropolítica
Setor de arroz acredita em redução de área no próximo ano
Governo se comprometeu a encontrar alternativa para ajudar produtores, que veem preços estarem próximos do mínimo
Agropolítica
Haddad diz que agro está sendo patrocinado pelo governo e cita orgulho do setor
Declaração foi feita durante audiência pública das comissões de Finanças e Tributação e de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara