Clima
La Niña: atraso da soja acende alerta para o milho safrinha
Rio Grande do Sul volta a ser o ponto de atenção com o avanço do fenômeno, mas consultoria destaca que potencial produtivo segue elevado
Sabrina Nascimento | São Paulo | sabrina.nascimento@estadao.com
11/11/2025 - 11:01

As lavouras de soja e milho do Brasil devem sentir, em maior ou menor grau, o impacto das oscilações climáticas provocadas pelo La Niña — especialmente no Sul do país. O alerta foi feito nesta terça-feira, 11, pela Hedgepoint Global Markets.
Há cerca de um mês, a Administração Nacional de Oceanos e Atmosfera dos Estados Unidos (NOAA) confirmou oficialmente a presença do fenômeno La Niña no hemisfério sul para a safra 2025/26. Segundo a agência, o evento deve persistir pelo menos até fevereiro do próximo ano, influenciando diretamente o regime de chuvas e temperaturas em importantes regiões agrícolas do Brasil.
Em conversa com o Agro Estadão, Luiz Roque Gutierrez, coordenador de inteligência de mercado da Hedgepoint Global Markets, destacou que, historicamente, os anos de La Niña costumam causar chuvas abaixo da média e temperaturas mais elevadas no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e parte de Mato Grosso do Sul.
Para o restante do Centro-Oeste, Sudeste e Norte o fenômeno climático tende a apresentar o cenário oposto: chuvas mais regulares e temperaturas amenas. O cenário costuma favorecer o desenvolvimento das lavouras. “Este ano, porém, ainda não vemos uma configuração muito clássica do fenômeno. Não é o mesmo padrão severo da safra 2021/22, por exemplo”, explica Gutierrez.
Até o momento, os estados do Sul do País têm sofrido com excesso de chuvas, enquanto a região central registra falta de umidade, com pontos de replantio em Mato Grosso.
Atraso nas chuvas e plantio mais lento
O início do plantio da soja em 2025/26 veio acompanhado de chuvas irregulares em setembro e parte de outubro, o que retardou o avanço das máquinas no campo. O cenário foi observado em Mato Grosso, Goiás, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais. Com o retorno das precipitações na reta final de outubro, o ritmo de plantio voltou a ganhar força, mas o calendário ficou ligeiramente atrasado em relação ao ano anterior.
Apesar disso, Gutierrez destaca que o atraso na semeadura não deve ser interpretado como perda de produtividade. “Não é porque a safra de soja atrasou que haverá quebra. No ano passado, que foi ano de neutralidade, também houve atraso e mesmo assim registramos a maior safra da história, com produtividades históricas no Centro-Oeste e Sudeste. Ou seja, atraso não significa perda”, reforça o analista.
Em sua estimativa mais recente, a Hedgepoint estimou que o Brasil deve colher 178 milhões de toneladas de soja nesta temporada — em linha com a projeção da Companhia Nacional de Abastecimento que prevê 177,6 milhões de toneladas.
O potencial produtivo, conforme o especialista, segue alto, especialmente nas áreas centrais do país. “Talvez não alcancemos os recordes fora da curva da safra passada, mas o cenário ainda é muito positivo”, destaca Gutierrez.
Alerta maior está no Rio Grande do Sul

Entre os estados, o Rio Grande do Sul continua sendo o mais vulnerável aos efeitos do La Niña. O coordenador de inteligência de mercado da Hedgepoint, recorda que nas últimas cinco safras — sem considerar o ciclo atual —, o Brasil passou por três episódios de La Niña e em todos, o Rio Grande do Sul perdeu parte significativa da safra de grãos, especialmente na temporada 2021/22, quando, conforme sinaliza o especialista, “as perdas foram muito grandes.”
Embora o fenômeno atual esteja classificado como fraco a moderado, o risco de estiagens localizadas continua presente. “Ainda não há sinal de perdas expressivas, mas o alerta está ligado. O comportamento das chuvas entre novembro e janeiro será decisivo”, afirma.
Por ora, a consultoria mantém a previsão de colheita de cerca de 23 milhões de toneladas de soja na safra gaúcha, com produtividade média próxima de 56 sacas por hectare.
Janela de semeadura da safrinha comprometida
O ritmo mais lento da soja também empurra o calendário do milho segunda safra, o chamado milho safrinha, cultivado logo após a colheita da oleaginosa. “No caso do milho safrinha, já podemos falar em atraso, sim, [da janela de semeadura]. O plantio começa mais tarde porque a soja foi semeada mais tarde. Isso afeta o calendário principalmente em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, São Paulo e Minas Gerais, que concentram a maior parte da área de safrinha”, explica o analista.
Gutierrez ressalta, no entanto, que o atraso do milho também não implica necessariamente em menor produtividade. O principal risco, segundo ele, é de redução de área plantada e não de rendimento das lavouras. “Se o atraso for muito grande, o produtor pode optar por não plantar determinadas áreas por causa do risco climático maior. Mas isso não significa que haverá quebra naquilo que for cultivado”, pontua.
Mercado atento, mas ainda sem reação
Apesar do monitoramento constante do clima na América do Sul, os mercados internacionais de soja e milho ainda não reagiram de forma significativa ao risco climático no Brasil. Por enquanto, o que influencia mais os preços são fatores externos — como a relação comercial entre Estados Unidos (EUA) e China. “O clima sul-americano ainda não trouxe grandes sustos”, avalia.
Refletindo a recente reaproximação entre EUA e China, as cotações da soja na bolsa de Chicago tem operado acima dos US$ 11 por bushel. Segundo Gutierrez, caso o clima piore no Brasil, será possível observar uma alta adicional nas cotações internacionais, mas por enquanto, o fator climático não está sendo precificado.
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