Agropolítica
Com nova MP, governo limita benefícios fiscais e Agro promete barrar medida
Ao menos sete entidades do setor Agro já se posicionaram contrárias à Medida Provisória e entendem que as ações do governo são inconstitucionais

Daumildo Júnior | daumildo.junior@estadao.com | Atualizada às 19h40
05/06/2024 - 16:00

O governo editou uma Medida Provisória (MP) que limita o uso dos créditos de PIS (Programa de Integração Social) e Cofins (Contribuição para Financiamento da Seguridade Social) por parte de empresas. A medida impacta agroindústrias e exportadoras, o que já causou uma onda de repercussões negativas no setor.
A MP nº 1.227/2024 foi a alternativa encontrada pelo Ministério da Fazenda para compensar a perda de arrecadação com a manutenção da desoneração da folha de pagamentos. A estimativa da pasta é de que, em 2024, R$ 26,3 bilhões não entrem nos cofres públicos devido à desoneração aprovada pelo Congresso Nacional no ano passado. Com a MP publicada nesta última, terça, 04, a expectativa é recompor esse saldo com R$ 29,2 bilhões que serão gerados por meio das alterações no PIS e Cofins.
Por se tratar de uma MP, a normativa começa a valer no momento da publicação no Diário Oficial da União e tem peso de lei. No entanto, precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional em até 180 dias para se tornar efetivamente uma legislação. Nesse sentido, a bancada ruralista já pretende travar a MP e qualifica a iniciativa como parte de uma “sanha arrecadatória” e “insasiável”.
“[A MP] Preocupa demais o setor. É um tema que demanda um estudo profundo porque nos gera uma preocupação enorme. Estamos trabalhando uma Reforma Tributária, buscando soluções para o setor, inclusive com a compensação de créditos, e saí uma Medida Provisória tratando justamente do contrário disso. Infelizmente acho que é mais uma frente de batalha que nós teremos aí nos próximos dias”, pontuou o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado Pedro Lupion (PP-PR).
O que muda para as empresas do agro?
Entre as ações previstas na MP, ao menos duas devem impactar diretamente o setor. A primeira alteração impede que as empresas façam a chamada compensação cruzada, que é quando elas pegam os créditos acumulados de PIS e Cofins e abatem em outros impostos, como o IRPJ (Imposto sobre a renda das pessoas jurídicas) e CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido).
A outra mudança é que as empresas não poderão mais obter o ressarcimento em dinheiro dos créditos acumulados. Na prática, as duas modificações prevêem que esses créditos sejam usados apenas para abater PIS e Cofins devidos pelas empresas.
“Para o setor agropecuário, é muito prejudicial essa medida, porque além de trazer insegurança jurídica, ela traz um aumento de carga tributária e do custo, seja na exportação, seja na produção de alimentos internamente”, avaliou ao Agro Estadão o advogado tributarista, Eduardo Lourenço.
Esse crédito é obtido para que não aconteça o fenômeno tributário de cumulatividade de impostos na cadeia. Basicamente, isso serve para que não haja dupla ou tripla tributação quando o imposto já foi recolhido em algum momento dentro da cadeia.
“Tem uma regra que quando a gente faz aquisição de pessoas físicas, eu não tenho créditos de PIS e Cofins, porque pessoa física não é contribuinte de PIS e Cofins. Então eu não tenho esse crédito. Todavia o produtor rural, pessoa física, que vendeu esse esse produto para a indústria, ele adquiriu insumos tributados de PIS e Cofins. Então, se não der crédito presumido para a indústria, eu vai ter uma cumulatividade tributária, porque o que o produtor rural pagou de tributo [nos insumos], vai acabar sendo importado para o preço”, explica Lourenço.
“Brasil se torna menos competitivo”
O Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) se manifestou contrário à iniciativa do governo. Segundo a entidade, “a medida é grave, impactando, automaticamente, o caixa das empresas, influenciando custos, inclusive, sob a perspectiva do cenário internacional, tornando o Brasil, maior exportador de café, menos competitivo”.
A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (ABIEC) também criticaram a medida. Na mesma linha dos exportadores de café, as associações falaram do risco de perda de competitividade além dos aumentos de custos.
“O efeito no custo de produção é direto e imediato. As empresas perderão a competitividade e a sustentabilidade para a manutenção dos empregos, além do desestímulo para o investimento e criação de novos postos de trabalho”, enfatizaram a ABPA e ABIEC em nota conjunta.
A Associação Brasileira dos Frigoríficos (Abrafrigo) disse que foi “surpreendida” com a medida e que a segurança alimentar não pode ser desconsiderada ao fazer as modificações. “O aumento de carga tributária promovido pela MP 1227/2024 representará, em última análise, maior aperto financeiro para as indústrias produtoras de carne bovina, afetando também produtores rurais e consumidores, que já sofrem com a inflação sobre os alimentos”, afirmou em nota.
Quem também desaprovou a MP foi Sociedade Rural Brasileira (SRB), que vê as ações com preocupação “quanto à imprevisibilidade e à insegurança jurídica vinculadas à medida provisória”.
Para a Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG), as modificaçãoes são um “retrocesso” e violam “a imunidade das exportações, o princípio da não-cumulatividade, o princípio do não confisco, todos previstos na Constituição Federal”. Na visão da entidade, a MP deve ser devolvida pelo Congresso Nacional.
O entendimento da Organização das Cooperativas Brasileiras também vai na mesma direção e entidade pretende mobilizar parlamentares para barrar a medida. “Não vamos medir esforços para, em conjunto com a Frente Parlamentar do Cooperativismo (Frencoop) e a da Agropecuária (FPA), evitar esse retrocesso e defender um sistema tributário adequado tanto para o cooperativismo brasileiro como para os outros setores”, afirmou em nota o presidente da OCB, Márcio Lopes.
Em negociação no Congresso, a regulamentação da Reforma Tributária também preocupa depois do anúncio da MP. A conclusão é de que não há confiança de que a legislação que passar será respeitada.
“Como o contribuinte vai confiar que daqui dois anos, na época da [implementação] da Reforma Tributária, o sistema vai funcionar sendo que hoje o governo está tomando medidas para limitar a utilização dos créditos?”, questiona o advogado Eduardo Lourenço.
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