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Economia

Saiba o futuro do café brasileiro em um mercado global instável

O setor aposta na redução gradual das tarifas com os EUA, na rastreabilidade dos grãos como diferencial na União Europeia e na agregação de valor para ampliar sua participação na receita

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Mônica Rossi* | Belo Horizonte | monica.rossi@estadao.com

06/11/2025 - 11:45

Marcos Matos do Cecafé debate sobre a competitividade do café brasileiro na Semana Internacional do Café, em Belo Horizonte (MG). Foto: Alexandre Resende / NITRO
Marcos Matos do Cecafé debate sobre a competitividade do café brasileiro na Semana Internacional do Café, em Belo Horizonte (MG). Foto: Alexandre Resende / NITRO

O mercado global do café atravessa um período de intensas transformações, marcado por pressões tarifárias, novas regulações e uma competitividade internacional acirrada. O tema foi assunto de um debate na Semana Internacional do Café (SIC), maior feira do setor no país. Para os painelistas, os desafios que o Brasil, que responde por 40% da produção mundial, enfrenta nos seus principais mercados consumidores — Estados Unidos, União Europeia e Ásia — exigem estratégias coordenadas para manter a liderança conquistada ao longo de décadas.

Impactos das tarifas e mobilização setorial

A imposição de tarifas pelos Estados Unidos ao café brasileiro representou uma das barreiras mais significativas para o setor nos últimos anos, gerando um clima de volatilidade e insegurança nas negociações. Marcos Matos, diretor-executivo do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), descreve o sentimento vivido como representante do setor como “bipolar”, com momentos de otimismo seguidos por frustração.

CONTEÚDO PATROCINADO

Matos avalia que a atuação do setor nas tratativas a respeito do tarifaço tem sido eficaz, apesar do ritmo lento das negociações governamentais. “A gente olha e pensa, valeu a pena a diplomacia do setor privado, porque a gente ajudou, de alguma forma, junto com a nossa contraparte nos Estados Unidos, no trabalho com as demais organizações, a abrir uma porta, porque essa porta não existia”.

Diante de uma retração de 52,8% nas exportações para os Estados Unidos, que fez o país cair para a terceira posição entre os principais destinos do café brasileiro, a “realocação” de volumes para outros mercados tornou-se uma tática de mitigação. Contudo, Matos adverte para os riscos desta estratégia: “se a gente perde a participação dos blends no mercado norte-americano, a gente pode ter dificuldade de reconquistar. O consumidor vai acostumar com outros cafés. Hoje é difícil, pelos níveis de estoques mais baixos, mas amanhã não se sabe. Então, a gente tem que ficar muito atento. O nosso trabalho é contra o relógio”.

O diretor do Cecafé relata que a entidade está ativamente envolvida também na defesa dos interesses do café brasileiro na investigação de comércio (Seção 301) iniciada pelos Estados Unidos. Durante essas tratativas, ele percebeu que o produtor norte-americano de outros produtos agrícolas, como grãos e pecuária, sente ressentimento em relação ao Brasil e aos produtores brasileiros, provavelmente devido à menor competitividade deles em comparação com o Brasil. “Eles estão extremamente aborrecidos com o Brasil, eles cruzaram o país para ficar dez horas falando contra o Brasil. E esses produtos estão na nossa pauta para pedir a isenção total das tarifas, é legítimo porque aumentou a inflação por lá. Porém, a base eleitoral de Trump diz não, porque existe também um lado do populismo, um lado das emoções”, relata.

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É por isso que, na próxima reunião com o vice-presidente Geraldo Alckmin, que vai ocorrer nesta sexta-feira, 7, o Cecafé planeja propor uma abordagem mais pragmática, buscando um acordo gradual em vez da isenção total, para criar uma “saída honrosa” para os dois lados. A gente tem que fazer uma coisa mais concreta. E se a gente tiver exceções anunciadas pelos dois presidentes, a gente diz o seguinte, agora a negociação começou. Então é essa mensagem que a gente está fazendo valer nesse momento”.

Apesar de ser o maior produtor mundial, o Brasil captura uma fatia menor da receita global do café. Foto: Gustavo Baxter/NITRO

Desafios com a União Europeia

Na União Europeia, o cenário é dominado por novos regramentos, com destaque para o EUDR (regulamento antidesmatamento). Embora inicialmente vistas como barreiras, Matos acredita que essas exigências estão sendo transformadas em uma vitrine para os diferenciais competitivos do Brasil, enfatizando que a robustez de sistemas como o Código Florestal, a nota fiscal eletrônica e a economia formal colocam o país em vantagem. “A nossa rastreabilidade não é porque uma certificadora veio de fora e colocou um carimbo nela”, afirma, destacando que essa estrutura institucional diferencia o Brasil de concorrentes que dependem de validação externa.

Aguinaldo Lima, diretor de Relações Institucionais da Associação Brasileira da Indústria de Café Solúvel (Abics), complementa essa visão, argumentando que a sustentabilidade praticada no país precisa ser comunicada de forma eficaz. “Se a gente tem condições e a gente faz ambientalmente correto e socialmente correto tudo isso, a gente só tem que contar isso. A gente só tem que reafirmar isso e o rebranding da marca Cafés do Brasil é um desses passos que estamos dando”, defende Lima, contrastando a postura brasileira com o que ele classifica como protecionismo direto, a exemplo da ação norte-americana.

Estratégia coordenada para o futuro

Pavel Cardoso, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), aponta que, apesar de ser o maior produtor mundial, o Brasil captura uma fatia desproporcionalmente pequena da receita global do café, um paradoxo que preocupa o setor. Ele reforça que este desencontro fica evidente nos números: com 40% da produção, o Brasil detém apenas 2,7% da receita global, enquanto países não produtores como Suíça e Alemanha faturam mais. Para Cardoso, a solução passa por uma promoção mais agressiva da marca e pela busca de agregação de valor.

Além disso, a resiliência climática e a sustentabilidade são vistas como eixos estratégicos para ampliar a participação brasileira no mercado global. Aguinaldo Lima ressalta a importância de uma estratégia unificada para comunicar esses ativos, afirmando que o setor precisa ter “um protocolo, um acordo, um trabalho de fundamento” para apresentar ao mundo.

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Pavel Cardoso sintetiza o desafio e a oportunidade: o mercado de café representa 1,2% do PIB norte-americano e há um vasto potencial para o Brasil exportar, além do grão, produtos com maior valor agregado. Ele reforça que a Abic tem se colocado à disposição de pequenos e nano-indústrias brasileiras para que elaborem produtos destinados à exportação.

“Se a gente evoluir essa agregação de valor, olhar esse mercado consumidor fabuloso, dessas novas culturas abraçando o café, novas formas de consumo. Por exemplo, nos EUA, 25% do consumo de café é no formato de bebida gelada. O negócio mudou e a gente tem que estar a par disso, porque se a gente é 40% da produção global, ou de todo o café que existe no mundo, a gente tem que ser 40% pelo menos do PIB do café. E é isso que a gente falha, porque nós não somos”, conclui Marcos Matos, diretor-executivo do Cecafé.

*jornalista viajou a convite da SIC

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