Economia
Gripe aviária impõe custos extras e prejuízo logístico ao setor, diz ABPA
Apesar de ainda não contabilizar as perdas financeiras, a entidade aponta um recuo nas exportações, como ocorreu com o foco de Newcastle em 2024
Sabrina Nascimento | São Paulo | sabrina.nascimento@estadao.com
22/05/2025 - 14:00

Há quase uma semana, o governo brasileiro confirmou o primeiro caso de gripe aviária em uma granja comercial no país, localizada em Montenegro, no Rio Grande do Sul. Desde então, diversos países importadores de carne de frango do Brasil suspenderam suas compras.
Segundo informações do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), divulgadas nesta quinta-feira, 22, há, pelo menos, 40 embargos em vigor — quase metade deles impedem exportações de qualquer local do Brasil.
As restrições devem impactar diretamente o volume exportado pelo setor. A consultoria Macrosector já projeta uma queda de 16,2% nas exportações brasileiras de carne de frango em 2025, totalizando 4,1 milhões de toneladas.
A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), porém, avalia que ainda é cedo para cravar números. Apesar disso, reconhece que as exportações mensais devem ser afetadas. “Quando olho para os dados de exportação até os primeiros 15 dias de maio, eles estavam absolutamente altos, puxados por uma demanda mundial muito forte. A projeção, inclusive, era para ser maior do que foi ano passado. Então, haverá uma redução? Sem dúvida, mas ainda não sabemos qual o tamanho”, afirmou Ricardo Santin, presidente da ABPA, em entrevista ao Agro Estadão.
A expectativa é de que parte dos impactos seja mitigada com o remanejamento de cargas. Segundo o dirigente, quando um mercado impõe restrições, as empresas podem adotar diferentes estratégias, como direcionar o produto para outros destinos, transformá-lo em itens de maior valor agregado — como salsichas e mortadelas —, ou até destiná-lo para fabricação de farinha de carne e ossos, utilizada na produção de ração para animais. “Só podemos mensurar o prejuízo nas exportações após, pelo menos, 30 dias”, disse.
Prejuízo logístico é certo
No entanto, o prejuízo logístico já é considerado certo. Segundo Santin, as empresas estão enfrentando custos adicionais com armazenagem, especialmente por precisarem recorrer a contêineres refrigerados, que garantem a conservação do produto, mas exigem mais gastos com aluguel, energia e manutenção.
A armazenagem em contêineres refrigerados de cargas de carne de frango já inspecionadas e prontas para exportação foi autorizada de forma excepcional e temporária pelo Mapa nesta semana. “O sistema de produção é pensado para funcionar em fluxo contínuo: produzir, vender, produzir, vender. Quando surge um embargo, o produto que estava destinado, por exemplo, para China, Europa ou México, precisa ser redirecionado. E, até encontrar outro comprador, é necessário armazenar”, explica.
Além do custo maior com armazenagem, há perdas relacionadas à logística, como o cancelamento de navios, necessidade de reorganizar transportes e até vender parte dos produtos a preços mais baixos. “Isso é fato. O prejuízo logístico existe. Agora, o tamanho desse impacto vai depender de cada empresa, da localização e do tipo de produto que estava destinado à exportação”, afirma Santin.
Demanda por grãos seguirá aquecida
Apesar dos possíveis impactos sobre as exportações de carne de frango, a ABPA não vê, no curto prazo, um enfraquecimento na demanda do setor por milho e soja, principais insumos da ração animal. “Não há nenhuma intenção das empresas de reduzir produção neste momento, porque o mercado está muito equilibrado”, afirmou o presidente da ABPA. Ele explica que, nos últimos dois meses, a disponibilidade de carne no mercado interno foi menor do que a média histórica, reflexo de um aumento de 9,5% nas exportações em volume e de 15% em receita.
Santin avalia que o cenário atual é uma crise pontual, com 131 países importadores da carne de frango brasileira ainda totalmente abertos. “Nossa expectativa é que aqueles que impuseram restrições retomem gradualmente suas compras, seja por raio, município ou apenas pelo estado do Rio Grande do Sul”, ressalta.
A ABPA acredita que o impacto no mercado pode ser semelhante ao registrado em 2024, quando houve a detecção da doença de Newcastle no Brasil. Na época, as exportações caíram pontualmente, mas se recuperaram. “O Rio Grande do Sul perdeu 6% das exportações no ano, mas, no geral, o Brasil cresceu 3% nas exportações em 2024, mesmo após esse episódio”, lembrou. Com um otimismo natural, Santin acredita que o mesmo quadro pode ser repetido: queda momentânea nos embarques, seguida de recuperação e saldo positivo até o fim do ano.
Olhar especial para o RS
O impacto das restrições pesa ainda mais sobre o Rio Grande do Sul, que já enfrentava desde julho do ano passado o bloqueio de alguns mercados, sendo um deles a China — principal comprador de carne de frango do Brasil. Segundo a Associação Gaúcha de Avicultura, essa restrição gerou um prejuízo de aproximadamente US$ 180 milhões ao longo de 2024.
Havia uma expectativa de que as negociações diplomáticas com a visita do presidente Lula à China, no início de maio, pudessem reverter esse cenário e permitir a retomada dos embarques gaúchos para o mercado chinês ainda neste primeiro semestre.
No entanto, com o caso de gripe aviária em uma granja comercial no estado, o retorno das vendas fica ainda mais incerto. “O ministro Fávaro tinha pedido, na visita do presidente Lula ao presidente Xi Jinping, que esse tema fosse prioritário, antes da influenza em aves comerciais. Então, a gente vai dar essa atenção sim para tentar ajudar e fazer as readequações que forem necessárias”, salienta.
Foco dos próximos dias: acelerar as reaberturas

Nos próximos dias, o esforço do setor estará ainda mais concentrado em acelerar a liberação dos mercados que suspenderam temporariamente as compras do Brasil.
De acordo com Santin, as empresas estão conversando diretamente com seus clientes para que eles pressionem os governos locais de cada país. Do outro lado, atualizações das informações sanitárias estão sendo enviadas pelo Brasil, principalmente, após a conclusão do processo de desinfecção da granja em Montenegro (RS).
“Existe um rito sanitário que precisa ser seguido, conforme determina a Organização Mundial de Saúde Animal. Era necessário primeiro desinfectar a granja, vistoriar as propriedades num raio de 10 quilômetros e garantir que não havia novos casos. Só então é possível iniciar o monitoramento e comunicar oficialmente que o Brasil segue livre da doença nas granjas comerciais”, afirma.
Newsletter
Acorde
bem informado
com as
notícias do campo
Mais lidas de Economia
1
Governo confirma municípios habilitados para renegociação de dívidas rurais
2
Metanol: como falhas na produção podem causar contaminação
3
Recuperação judicial no agro dispara 31,7% no 2º trimestre do ano
4
Onde nascem os grãos da xícara de café mais cara do mundo?
5
Setor de café pede urgência em negociação das tarifas com os EUA
6
Banco do Brasil dá início à renegociação de dívidas rurais com recursos livres
PUBLICIDADE
Notícias Relacionadas
Economia
Estoque de LCAs passa dos R$ 608 bilhões em setembro
CPRs tem crescimento de 1% no início da atual safra em relação ao ano passado
Economia
BB inicia operações com crédito rural controlado; recursos do Banrisul já se esgotaram
Produtores da região Sul ainda relatam dificuldades para acessar as linhas de crédito subsidiadas.
Economia
Malásia retoma compras de frango do Brasil e abre seis mercados para produtos brasileiros
Comitiva brasileira também recebeu a informação de que a auditoria em plantas de carne suína deve ser antecipada
Economia
China barra exportação de carne do Uruguai
Pequim devolveu contêineres por detecção de resíduos de carrapaticida; ação gera alerta entre produtores e autoridades uruguaias
Economia
Lançado no Brasil o 1º índice de soja com certificação internacional
A certificação segue as mesmas diretrizes de governança e auditoria aplicadas a índices usados por bancos centrais e bolsas de valores
Economia
Agroalianças e presença feminina fortalecem o agronegócio, diz Abag
Às vésperas da COP 30, diretora executiva da Associação Brasileira do Agronegócio reforça ainda a importância de disseminar a sustentabilidade do setor
Economia
Montesanto Tavares pede autorização para vender ativos
Em recuperação judicial, companhia quer vender bens e firmar empréstimo com o BTG Pactual
Economia
EUA: Trump vai liberar US$ 3 bilhões em ajuda a agricultores
Medida busca amenizar impactos da guerra comercial e ocorre antes de reuniões-chave entre autoridades americanas e chinesas