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Economia

‘Dia da libertação’ de Trump deve atingir mais itens do agro, além do etanol

Exportações de carne bovina in natura, café e suco de laranja também estão na mira do governo dos EUA

Sabrina Nascimento | São Paulo | sabrina.nascimento@estadao.com | Daumildo Júnior | Brasília | daumildo.junior@estadao.com | Atualizada às 17h06

01/04/2025 - 15:23

Foto: Adobe Stock
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Os Estados Unidos (EUA) devem anunciar nesta quarta-feira, 02, novas tarifas sobre importações de produtos estrangeiros de parceiros comerciais, atingindo inúmeros países, no que o presidente Donald Trump tem chamado de ‘Dia da libertação tarifária’. 

No Brasil, além do aço e do alumínio já atingidos pelas tarifas dos EUA, o etanol está na mira do governo norte-americano, conforme sinalizado pelo republicado em fevereiro. No entanto, o agronegócio deve ser mais amplamente atingido. 

Segundo apuração do Agro Estadão com uma fonte a par das negociações entre os governos do Brasil e dos EUA, as tarifas devem abranger os principais itens de exportação do setor, como café, carne bovina e suco de laranja. No que se refere aos valores das taxas, conforme a fonte, devem ficar entre 20% e 25% sobre os produtos. A tarifa de 20% também foi apontada nesta terça-feira, 01, pelo jornal Washington Post, que ouviu fontes dentro do governo Trump.  

Atualmente, os EUA são o segundo principal destino dos produtos do agronegócio brasileiro, atrás apenas da China. No ano passado, os embarques ao país totalizaram US$ 12,1 bilhões, com alta de 23,1%. Além disso, a participação norte-americana nas exportações do setor aumentaram de 5,9% para 7,4% em um ano. A lista dos principais produtos exportados foram café verde, celulose, carne bovina in natura e suco de laranja.

Existe receio de taxas, mas efeito negativo será maior para os EUA, diz Cecafé

O Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) informou que, desde o início das discussões sobre as tarifas, têm trabalhado em estreita colaboração com a Associação Nacional de Café dos EUA (NCA, na sigla em inglês) para destacar a importância do setor para a economia norte-americana. “A gente intermediou uma visita do representante da associação de café dos EUA na embaixada do Brasil em Washington, e ele conversou com o nosso embaixador e secretários”, contou Marcos Matos, presidente do Cecafé, ao Agro Estadão. 

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Além do mais, estudos encomendados pela NCA demonstram que o café sustenta mais de 2,2 milhões de empregos nos EUA e gera mais de US$ 101,2 bilhões em salários. No país, os grãos importados são transportados, armazenados, torrados, preparados e vendidos por empresas de café em todos os estados e territórios dos EUA, gerando US$ 343 bilhões em atividade econômica anualmente, representando 1,3% do PIB do país. 

Ainda segundo o estudo, para cada dólar de importações relacionadas ao café, o setor gera US$ 43 em valor para a economia americana. “A gente tem receio, sim, de ser taxado, mas isso é muito mais preocupante para eles [os EUA], porque nós exportamos para 150 países e a taxação vai deixar a bebida mais cara para os americanos onde, 70% da população toma café”, destacou Matos, ressaltando que aguarda o anúncio do governo Trump.

Etanol brasileiro

Desde fevereiro, o governo norte-americano estuda a aplicação de uma tarifa reciprocada sobre o etanol brasileiro. A medida, segundo o presidente dos EUA, é necessária porque o Brasil exporta o produto para o mercado norte-americano com uma tarifa de 18%, enquanto importa o produto americano com uma taxa mais baixa, de 2,5%.

José Guilherme Nogueira, CEO da Organização dos Produtores de Cana-de-Açúcar, Açúcar e Etanol (Orplana), explica que, apesar da desvantagem nas tarifas, o etanol brasileiro tem uma vantagem competitiva no mercado americano em termos de sustentabilidade. “O etanol de cana produzido no Brasil tem uma intensidade de carbono muito menor em comparação ao etanol de milho dos EUA. O etanol brasileiro é mais eficiente, com menor emissão de gases de efeito estufa, o que é um ponto importante”, afirmou ao Agro Estadão. 

Apesar deste benefício, Nogueira ressalta que a possível mudança nas tarifas pode afetar a competitividade do etanol brasileiro no mercado internacional. “Se forem aplicadas as reciprocidades, esse mercado pode, sim, ser afetado e pode, sim, ter possíveis reduções do volume de exportação brasileira para o mercado norte-americano e para outros mercados também”, disse ao Agro Estadão.

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O dirigente acredita que o impacto das novas tarifas poderá ser mais complicado para as usinas do Nordeste. Segundo ele, embora alguns estados da região ainda tenham desafios em termos de competitividade, a realidade é que as usinas nordestinas têm se adaptado e investido cada vez mais no setor. “Uma alta nas tarifas de importação pode tornar o etanol do Brasil menos competitivo, o que seria um golpe significativo para as usinas nordestinas”, disse. Ele esclareceu que, em algumas ocasiões, os preços do etanol importado ainda são mais atraentes para negócios na região, diferentemente do centro-sul do país, onde, historicamente, há uma concentração da produção.

Dados da consultoria Datagro mostram que, sem a tarifa de 18%, a janela de entrada do etanol dos EUA pelos portos da região Norte e Nordeste do Brasil estaria aberta em 14%.

Açúcar como moeda de troca?

Foto: Adobe Stock
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Uma das hipóteses levantadas durante as negociações entre os governos brasileiro do dos EUA como “moeda de troca” para redução da tarifa do etanol, é uma possível ampliação da cota de açúcar do Brasil para o mercado norte-americano. 

Atualmente, o Brasil tem uma cota preferencial de 146,6 mil toneladas de açúcar para exportação aos EUA, isentas de tarifas, distribuídas entre 39 empresas do Nordeste.

Para o CEO da Coplacana, o açúcar não deve ser tratado como “moeda de troca” em negociações com outros setores. “Não queremos que o etanol e o açúcar paguem a conta de produtos que não são competitivos. Precisamos preservar nossa competitividade”, afirmou o executivo.

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PL da Reciprocidade é “carta na manga” para o Brasil

Avançou nesta terça-feira, 01, o PL da Reciprocidade, que prevê diretrizes legais para o Brasil adotar medidas de proteção contra legislações de países ou blocos econômicos que possam prejudicar a competitividade das exportações brasileiras. O texto estava em tramitação no Senado e segue agora para a Câmara dos Deputados. 

A medida pode servir de salvaguarda contra as tarifas dos EUA. Segundo a senadora relatora do texto e ex-ministra da Agricultura, Tereza Cristina, o PL pode ser uma ferramenta contra tarifas injustas. “O Brasil não é um país que afronta, que retalia, e o projeto não é para isso. O projeto traz ferramentas para que, se o diálogo não for possível, as negociações caminharem e não se chegar a um bom termo, aí sim a gente tem ferramentas para poder barrar medidas que sejam muito nocivas aos produtos brasileiros”, afirmou Tereza, após reunião-almoço da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). 

Segundo ela, até o momento, só há ruídos sobre as tarifas que virão, atingindo todos os países, podendo ser superiores a 20%. “Então, nós temos que esperar”, salientou.

O presidente da FPA, deputado federal Pedro Lupion, o projeto da Reciprocidade é uma “carta na manga” para o Brasil, diante da perda de protagonismo de órgãos internacionais como a Organização Mundial do Comércio, que poderia auxiliar no processo de negociação com os EUA.  “Eu espero não ter a necessidade de usar [o PL da Reciprocidade], mas a gente precisa estar preparado para esse cenário mais grave que pode vir a acontecer. Por enquanto estamos aproveitando a briga entre China e EUA para eles [os chineses] comprarem da gente, agora se acontecer conosco também, precisamos estar preparados”, ressaltou. 

Impactos no comércio global e logística marítima

Além das tarifas sobre o etanol e o açúcar, outras medidas do governo norte-americano podem influenciar o comércio global e afetar indiretamente o Brasil. De acordo com a consultoria Markestrat, entre os pontos de atenção, estão mudanças na estratégia comercial dos EUA envolvendo a logística marítima.

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Segundo a Markestrat, a proposta da U.S. Trade Representative (USTR) — agência responsável por desenvolver e coordenar a política comercial do país — prevê a criação de um Escritório de Diretoria Marítima dentro do Conselho de Segurança Nacional, além de incentivos para fomentar uma nova indústria naval nos EUA. Isso pode incluir a aplicação de sobretaxas para navios chineses que atracarem em portos americanos.

Caso essa medida seja implementada, a cadeia global de suprimentos pode ser impactada, já que a China responde por mais de 50% da frota de carga mundial. “Esses navios são responsáveis por manterem ativo o fluxo de comércio marítimo entre os fornecedores/compradores dos EUA com todo o resto do mundo”, lembra a consultoria. 

Conforme os especialistas, caso a medida seja levada em diante, muitas rotas marítimas deixariam de ser atrativas financeiramente, obrigando o fluxo atual a ser redirecionado para o Canadá ou México, afetando exportadores em todo o mundo, como o Brasil.

A Markestrat ressalta ainda que o impacto de tais medidas pode elevar a inflação nos EUA, levando o Federal Reserve (FED, Banco Central do país) a manter juros elevados por mais tempo. “Isso poderia pressionar o câmbio e os custos logísticos globais, refletindo nos preços de exportação do agronegócio brasileiro”, dizem os analistas. Eles lembram que, os custos dos fretes marítimos já foram impactados em 2018, durante a primeira guerra comercial entre EUA e China, no primeiro mandato de Trump. Na época, a logística marítima precisou se adaptar às mudanças nos fluxos comerciais, resultando em ajustes nos custos, especialmente com contêineres, desafios que ganharam evidência durante a pandemia de 2019.

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