Economia
Danone Brasil diz que continua comprando soja nacional; produtores reagem à declaração de diretor da multinacional: “é boicote”
Executivo da Danone na Europa disse em entrevista que empresa não compra mais soja do Brasil porque o país não segue as normas da lei antidesmatamento
Fernanda Farias | Porto Alegre | fernanda.farias@estadao.com e Daumildo Júnior. | Brasília | daumildo.junior@estadao.com
29/10/2024 - 15:11

A Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil) emitiu uma nota em que critica a posição da multinacional Danone de não comprar soja brasileira, pois a produção no país não seguia as normas impostas pela lei europeia antidesmatamento. A declaração foi dada pelo diretor financeiro da multinacional na França, Jurgen Esser, em entrevista à Reuters, na última semana, indicando que a empresa deixou de comprar o grão vindo do Brasil e passou a negociar com países da Ásia.
Em nota, a Aprosoja qualificou a atitude como “boicote” e afirmou que isso “é uma demonstração de desconhecimento ao processo produtivo no Brasil e um ato discriminatório contra o Brasil e sua soberania”. A crítica se deve principalmente à justificativa dada, já que a legislação europeia ainda não está em vigor e tem possibilidade de ser adiada para iniciar em 30 de dezembro de 2025. A lei antidesmatamento prevê que a soja e seus derivados não podem entrar na União Europeia se tiverem vindo de áreas com desmatamento – ilgeal ou legal – feito a partir de 2021.
O que diz a Danone Brasil
O Agro Estadão procurou a assessoria de imprensa da Danone Brasil, que emitiu uma nota oficial: “podemos confirmar que a informação veiculada não procede”. A nota diz que a Danone está há mais de 50 anos no Brasil e continua comprando soja brasileira em conformidade com as regulamentações locais e internacionais.
“A soja brasileira é um insumo essencial na cadeia de fornecimento da companhia do Brasil e continua sendo utilizada sendo a aquisição da maior parte desse volume intermediada pela central de compras da Danone incluindo processos que verificam sua origem de áreas não desmatadas e rastreabilidade”.
O comunicado é assinado pelo presidente da Danone Brasil, Tiago Santos, e pelo VP de Assuntos Jurídicos e Corporativos da Danone Brasil, Camilo Wittica. O Agro Estadão questionou sobre sobre a validade da informação em relação a outras unidades da Danone fora do país, mas ainda não recebeu a resposta.

Aprosoja diz que “há motivos de sobra para os produtores boicotarem a empresa”
A entidade representativa também entende que a ação da empresa “é passível de reclamação por parte do governo brasileiro nas instâncias que regulam o comércio mundial, pelo seu caráter punitivo, discriminatório e coercitivo”. Além disso, segundo a Aprosoja, já há elementos para haver uma compensação devido aos prejuízos que a ação tem causado e indica quais medidas devem ser tomadas pelo governo federal.
“A primeira medida seria o Governo Brasileiro notificar a União Europeia para que adequasse a sua legislação. O segundo passo, caso o pleito não seja atendido, seria listar os valores que a Europa teria de devolver ao Brasil em função dos prejuízos causados pela sua legislação e, em seguida, avaliar a melhor forma de buscar a compensação, o que incluiria uma reclamação junto à Organização Mundial do Comércio (OMC)”, afirma em nota.
A Aprosoja também aponta pontos previstos no Código Florestal quanto as áreas de preservação dentro das propriedades rurais. “Diante deste cenário, fica à pergunta: em que país a Danone vai encontrar a soja mais ambientalmente sustentável, com mais teor de óleo e proteína, ideal para produzir os rebanhos leiteiros com o melhor custo-benefício e produzida com as mais reconhecidas boas práticas agrícolas do que nas lavouras do Brasil?”, questiona.
No final, a entidade ainda pontua que os produtores estão “cansados de serem injustamente apontados como os vilões” e diz que há “motivos de sobra” para os produtores começarem a boicotar a empresa no Brasil. “Não é de se duvidar que os produtores rurais brasileiros, cansados de serem injustamente apontados como os vilões, quando na verdade são os heróis da sustentabilidade, comecem a ter motivos de sobra para colocar a Danone e outras marcas mundiais na lista de empresas a serem boicotadas no Brasil”.
O que diz o Ministério da Agricultura
O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) emitiu uma resposta oficial sobre o caso, em que reforça o compromisso ambiental do Brasil, que possui uma das “legislações ambientais mais rigorosas do mundo” e conta com com um sistema de comando e controle que tem permitido ao país “combater o desmatamento ilegal”.
“Os compromissos internacionais brasileiros vêm sendo reafirmados periodicamente com metas ousadas de descarbonização, redução do desmatamento e fomento à agricultura sustentável, fatos confirmados durante a presidência do Brasil no G20”.
A nota ainda reforça o posicionamento do país sobre o Regulamento de Desmatamento da União Europeia (EUDR). “O Brasil considera as normas do EUDR arbitrárias, unilaterais e punitivas, tendo em vista que desconsideram particularidades dos países produtores e impõem exigências com impactos significativos sobre os custos e a participação de pequenos produtores no mercado europeu”.
O comunicado traz que o governo brasileiro está em diálogo contínuo com a União Europeia para alinhar práticas e estabelecer uma regulamentação que beneficie todas as partes envolvidas. “O Brasil está pronto para colaborar, mas exige ser tratado com a mesma justiça e equilíbrio que pautam as relações comerciais internacionais devendo ser rechaçadas posturas intempestivas e descabidas como anunciadas por empresas europeias, com forte presença de atividade também no mercado brasileiro”, conclui a nota.
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