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Produtos hidrolisados a partir de resíduos ganham espaço na indústria paulista
Novidades incluem alimento obtido da mucosa intestinal e de cartilagem bovinas, além de fertilizante feito com descarte do processamento de tilápias

Igor Savenhago | Ribeirão Preto (SP)
14/06/2025 - 08:00

Resíduos da indústria de proteína animal que, até pouco tempo, eram descartados ou vistos como inferiores estão virando produtos de alto valor agregado. Exemplos recentes são um composto alimentar proteico desenvolvido a partir da mucosa intestinal e de cartilagem bovinas, voltado à nutrição de suínos, pets e outros animais, e um fertilizante obtido de partes da tilápia que, geralmente, não servem para o consumo humano.
Ambos são hidrolisados — resultantes de um processo conhecido como hidrólise, que quebra as moléculas por meio da adição de água, visando, com isso, facilitar a absorção dos nutrientes pelos organismos em que são aplicados.
Uma das inovações está sendo lançada pela InnovaFeed, uma joint venture da Adeste com a A&G. Elas se uniram para criar o Peptipro, uma solução que, segundo seus idealizadores, pode ser comparada a um whey protein para animais.
A Adeste é uma empresa brasileira, com sede na capital paulista, focada no segmento de saúde. É a maior fornecedora da América Latina de sulfato de condroitina — suplemento muito usado para o fortalecimento de articulações em humanos, especialmente em casos de osteoartrite — e um das maiores do anticoagulante heparina.
Essas substâncias são extraídas de subprodutos bovinos: a heparina é proveniente da mucosa intestinal e o sulfato de condroitina, da cartilagem. Após esses processos, os resíduos eram usados somente como adubo para pastagens.
“O que a gente tenta fazer é pegar o que mercado acha que não tem valor e transformar em ingredientes ativos, sustentáveis e com alto valor agregado”, afirma Marcus Kienast, CEO da Adeste. “No caso do Peptipro, nós avançamos e decidimos aproveitar o que sobrava dos nossos próprios processos. Com isso, conseguimos fazer uma ponte entre frigoríficos e a cadeia de nutrição animal, resolvendo problemas dos dois lados”, complementa.
Novo olhar

De acordo com José Luciano Andriguetto, diretor técnico e sócio da InnovaFeed, o Peptipro, que é fabricado em Jaguapitã (PR), nasceu de um olhar diferenciado. “A heparina é retirada da mucosa e a condroitina da cartilagem, mas e depois? O que mais tem dentro dessa mucosa? O que mais essa cartilagem pode oferecer?”.
Para responder a essas questões, foram necessários sete anos de desenvolvimento e amadurecimento da tecnologia, que envolveu muitos ajustes até que se chegasse ao processamento ideal. Após receber água para a quebra das moléculas em 185 diferentes peptídeos — cadeias de aminoácidos que formam as proteínas —, o composto tem a água retirada. “Parece simples, mas, quando a gente vai colocar no equipamento para fazer a secagem, são muitas variáveis. Só nessa etapa, foram quatro anos de estudos”, revela Andriguetto. “Mas valeu a pena. Tanto que o único subproduto desse processo é vapor d’água. Tudo o que é sólido fica no produto”, emenda Kienast.
Por ano, a InnovaFeed deverá transformar 50 mil toneladas de resíduos em alimento, que, além da suinocultura e de animais domésticos, pode ser usado para peixes e aves. “Só para bovinos que não. A gente tem o cuidado de nunca voltar um produto para a mesma cadeia, para afastar qualquer risco de contaminação”, explica Kienast.
Além da comercialização no mercado interno, a joint venture está de olho nas exportações. Há dois meses, embarcou a primeira carga para a Colômbia e também obteve o registro para começar a vender ao Peru.
“Ao aproveitar matérias-primas reutilizadas na produção de peptídeos, estamos melhorando a qualidade nutricional dos alimentos e também contribuindo para um ciclo contínuo de reaproveitamento, fundamental para a economia circular e para a mitigação dos impactos ambientais da indústria de carne bovina e de laticínios, que respondem por 14,5% das emissões globais, com a liberação de metano e óxido nitroso”, conclui Andriguetto.
Fertilizante de tilápia

Em Santa Fé do Sul (SP), sede do Grupo Ambar Amaral, é desenvolvido outro produto hidrolisado, com a diferença de que é direcionado a plantas. A Biotil, uma das empresas do grupo, fabrica, há pouco mais de um ano, um fertilizante a partir de resíduos do processamento de tilápias.
Cabeça, rabo, barbatana e vísceras do peixe, que geralmente não servem para consumo humano, são as matérias-primas do produto. Elas chegam da Brazilian Fish, outra empresa do grupo, líder na criação de tilápias em tanques-rede no país.
Segundo o gestor comercial Marcos Maricato, a proteína precisa estar fresca para ser hidrolisada — processo facilitado pela proximidade de uma empresa com a outra. Por enquanto, apenas 0,5% do que sobra do abate de 60 toneladas por dia de tilápia feito pela Brazilian Fish é aproveitado — o restante vai para a produção de ração.
Assim que chegam, os resíduos são colocados em tanques de hidrolisação, onde ficam por quatro horas sendo quebrados por uma enzima na presença de água. A tecnologia foi importada da Europa. O resultado é um fertilizante líquido com 16% de aminoácidos e 20% de carbono orgânico, além de alto teor de óleo de peixe, rico em ômega 3, e colágeno.

“Existem outros produtos derivados de peixes no mercado, mas são decorrentes de fermentação. Este é o único hidrolisado de tilápia”, diz Maricato. Os experimentos com o biofertilizante e os relatos dos agricultores que o utilizam animam a empresa, que, em 2024, gerou 500 mil litros da solução e, para este ano, pretende quadruplicar o volume.
Outro objetivo é aprofundar as pesquisas, avaliando, por exemplo, os efeitos do óleo de peixe no controle de insetos como a mosca-branca e a cigarrinha, que causam danos a diversas culturas agrícolas.

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