Tudo sobre AgroSP
Estudo inédito liderado por SP mostra que 64% dos solos do mundo são frágeis
Mapeamento revelou que existe uma relação entre o desenvolvimento econômico dos países e o estoque de carbono nos solos

Igor Savenhago | Ribeirão Preto (SP)
24/08/2025 - 05:00

Um estudo liderado por pesquisadores da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ/USP), em Piracicaba (SP), que contou com a participação de 50 pesquisadores de diversas instituições internacionais, mostrou que 64% dos solos do mundo são considerados frágeis.
Os dados foram divulgados pelo Grupo de Estudos de Geotecnologias em Ciências do Solo (GeoCIS), que se dedicou durante seis anos ao trabalho de levantamento sobre os solos do mundo e, para isso, teve o apoio do Centro de Estudos de Carbono na Agricultura Tropical (Ccarbon), também sediado na ESALQ, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
Um artigo sobre os resultados da pesquisa foi publicado na revista The Innovation. Segundo o coordenador do GeoCIS, o professor José Alexandre Demattê, o percentual de solos frágeis se refere a solos arenosos, geralmente pobres em nutrientes, com baixa retenção de água, altamente suscetíveis a erosão e de baixa produtividade. Por isso, precisam de manejo específico, para ajudarem a garantir segurança alimentar.
No Brasil, os solos arenosos predominam em estados como Mato Grosso, Maranhão e Pará. Já no Sul e no Sudeste, principalmente em São Paulo, Minas Gerais e Paraná, eles aparecem em menor proporção. Demattê explica que isso acontece porque esse tipo de solo está ligado a condições climáticas e origem geológica, reforçando a necessidade de estratégias específicas que permitam melhorar sua conservação e, com isso, garantir produtividade.
Outros autores do artigo reforçam essas recomendações. “Otimizar o manejo de solos arenosos passa a ser crucial para a sustentabilidade agrícola e ambiental, promovendo, entre muitos outros benefícios, a segurança alimentar”, afirma Nicolas Rosin.
“É necessário dar mais atenção aos solos arenosos do Brasil, bem como entender sua mineralogia e dinâmica da água. Essas informações facilitam a tomada de decisão quanto ao manejo, como rotação de culturas, cobertura vegetal, épocas de plantio e colheita, e escolha de variedades e cultivares mais adequadas”, complementa Jean Novais.
Comparativo de tipos de solo encontrados em algumas regiões do globo: predominância dos arenosos

Por outro lado, manejos inadequados podem elevar os riscos de degradação, como perda de capacidade de estoque de água e carbono, impactando diretamente no clima e na produção de alimentos. “Cabe agora os órgãos públicos utilizar estes números para melhoria de políticas públicas no agro”, diz Merilyn Accorsi Amorim.
Alteração de pH
Outra constatação da pesquisa foi que manejos inadequados podem impactar o pH dos solos — que, em áreas agrícolas, estava 1,6 unidades mais elevado em comparação com áreas de vegetação nativa. Conforme os pesquisadores, o aumento se deve à aplicação intensiva de corretivos e fertilizantes, podendo não ser sustentável a longo prazo, já que altera o equilíbrio químico e biológico do solo.
“Não se avançou, por exemplo, em como aplicar os conhecimentos mineralógicos de maneira agronômica, mesmo sabendo que a mineralogia rege quase todo o sistema de água e solutos no perfil do solo. Os agricultores fazem análises importantes de solos, mas todas voltadas para o caráter químico, bem consolidado, sem levar em consideração o impacto da mineralogia na produção das plantas, e nem mesmo no sequestro de carbono”, diz Demattê.
Carbono
Um dos efeitos disso é que 54% do carbono orgânico do planeta está concentrado em solos de vegetação nativa, enquanto os solos agrícolas têm, em média, 60% menos carbono em relação às áreas naturais. Conforme outro autor do estudo, Raul Poppiel, a presença de carbono no solo é chave para a saúde ambiental no planeta, mas, como a agricultura remexe a terra frequentemente, acelera a perda de matéria orgânica.

“Quando o solo perde carbono, perde também vida: a biodiversidade subterrânea, a capacidade de reter água e nutrientes, e até o papel que exerce na regulação do clima são afetados. Esse empobrecimento do solo impacta não só a produção agrícola, mas contribui para o aumento de carbono na atmosfera, intensificando o efeito estufa”, explica. Nesse sentido, adotar práticas agrícolas como plantio direto, uso de culturas de cobertura ou sistemas agroflorestais, que mantêm ou aumentam o carbono no solo, são fundamentais para reverter esse cenário e garantir uma agricultura mais sustentável, segundo ele.
Nesse aspecto, as nações desenvolvidas saem na frente. Conforme a pesquisa, existe uma relação entre o desenvolvimento econômico e a saúde dos solos: 75% do estoque de carbono global está nos dez países desenvolvidos com as maiores economias, o que significa que eles têm solos mais férteis. Nos países emergentes, como o Brasil, o estoque de carbono no solo é baixo, abrindo um nicho para o chamado mercado de créditos de carbono.
“Em linhas gerais, o mercado de créditos carbono basicamente faz o papel de uma balança em que os que emitem poluentes pagam para os que não emitem, um nicho para ganho financeiro com qualidade ambiental e solos sustentáveis”, conclui Demattê.
Referência
O GeoCIS é destaque mundial quando o assunto é saúde dos solos. Em março deste ano, o grupo foi considerado referência global em estudos inovadores nessa área pela Dokuchaev Soil Science Institute, instituição consagrada como berço das pesquisas sobre solo no planeta. E recebeu menção de destaque da Academia de Ciências da Rússia, por meio do Ministério da Ciência e Educação da Federação Russa.
Antes desse estudo sobre os solos de todo o planeta, o GeoCIS havia publicado uma análise preliminar, focada nos solos da América Latina e do Caribe — que revelou que mais da metade dos solos paulistas tem saúde considerada baixa.

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