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Produtores cobram medidas para conter ataques de javalis em SP
No Vale do Paraíba, há relatos de perdas até 70% da lavoura; Faesp discute necessidades prioritárias com Secretaria da Agricultura e Ibama

Igor Savenhago | Ribeirão Preto (SP)
02/03/2025 - 08:00

Quando o agricultor Márcio Nogueira de Aquino, de Monteiro Lobato (SP), no Vale do Paraíba, entrou na lavoura e percebeu o estrago, decidiu que não plantaria mais milho. O episódio foi há dois anos. O grão, que era cultivado em oito hectares e usado para alimentar as pouco mais de 200 cabeças de gado leiteiro da propriedade, deu lugar ao sorgo boliviano, um híbrido não granífero. O motivo: reduzir o ataque de javalis, os responsáveis pela destruição do milho.
Aquino afirma que, com o sorgo, afugentou um pouco essa espécie invasora e que tem trazido grande dor de cabeça aos produtores da região. Vez ou outra, no entanto, ele encontra a plantação remexida. “Esses bichos não têm limite. Eles comem de tudo e andam grandes distâncias”, afirma.
Como o Ibama autoriza, há 12 anos, abater a espécie como forma de controle, desde que se obtenha licença do órgão, Aquino contratou um caçador. “Ele vem aqui e consegue abater um, dois… Às vezes, até três. Mas não adianta muito. Se tiver alimento disponível, a proliferação é exponencial”.
O ataque dos javalis comprometeu um negócio de décadas da família. Aquino e o pai produziam milho há quase 35 anos. Chegavam a fazer ceva com o grão para desviar a atenção dos invasores para um local específico, mas em vão. “Eles são bem seletivos. Entravam no milharal para escolher as melhores espigas”. Pensaram até em instalar gaiolas para captura, mas os custos inviabilizaram a medida.
Espécie nativa da Europa, Ásia e África, o javali foi introduzido no Brasil, segundo o Ibama, na década de 1960, para atender a um mercado de carnes exóticas na região sul do país. Agressivo e com facilidades de se adaptar a diversos tipos de ambientes, se reproduz de forma descontrolada e não tem predadores naturais. Foi classificado pela União Internacional de Conservação da Natureza como uma das cem piores espécies exóticas invasoras do mundo.
Como muitos criatórios montados no território nacional não se desenvolveram, os animais acabaram soltos e cruzaram com porcos domésticos, o que resultou no javaporco, também bastante perigoso. Com isso, a criação e a cruza de javalis passou a ser proibida no País. Além dos riscos de ataques, os javalis e javaporcos representam um problema sanitário. Podem transmitir doenças a outros animais e aos seres humanos, como brucelose, tuberculose, esparganose, cisticercose, teníase, toxoplasmose, leptospirose, trichinelose, raiva, peste suína e, mais raramente, a aftosa.
O presidente do Sindicato Rural de Monteiro Lobato, Renato Prince, declara que já soube de casos em que comeram até bezerros. Ele conta que a região enfrenta o problema há uns oito anos, mas, há três, os ataques se intensificaram.
Também criador de gado leiteiro, Prince produzia milho para silagem em dez hectares. Teve 70% da lavoura destruída e resolveu adotar o sorgo, que também foi quase todo dizimado. “Neste ano, passou da conta. Numa noite só, uma manada de 30 a 40 javalis passou na plantação. A alternativa, agora, vai ser plantar capim”.

Em quase todas as cidades
Um levantamento da Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo (SAA) feito em 2022 apontou que os javalis estavam presentes em 639 dos 645 municípios do estado – 99,1%. Pouco antes, o Sistema de Informação e Manejo de Fauna (SIMAF/Ibama) revelou que, de abril de 2019 a agosto de 2021, São Paulo foi o segundo estado com o maior número de registros de aparecimentos de javalis, com 1287 animais avistados, de um total de 6.858 no país. O território paulista perdia apenas para Santa Catarina, que teve 1316 registros.
Em 2011, uma resolução do Conselho Estadual do Meio Ambiente de São Paulo (Consema) havia incluído o javali na lista das espécies exóticas com potencial de bioinvasão no estado. Já em 2019, um trabalho conjunto entre as secretarias de Meio Ambiente e Agricultura reconheceu a espécie e seus híbridos como de peculiar interesse, por causa dos riscos oferecidos à produção pecuária, bem como à sanidade animal e humana, e regulamentou o controle no estado.
Durante todo o ano passado, eventos realizados pela Federação da Agricultura do Estado de São Paulo (Faesp), com participação do Ibama e da SAA, discutiram amplamente a questão. De acordo com o presidente da federação, Tirso Meirelles, foram definidas quatro necessidades prioritárias para o Estado de São Paulo: implementação de políticas públicas com vistas à erradicação da espécie; incentivo ao desenvolvimento de pesquisas sobre métodos de controle; atualização das normas e aprimoramento dos procedimentos que agilizem as autorizações de caça; e trabalho constante de monitoramento da população, para a definição de estratégias de controle.
“Hoje, não sabemos qual é a população [de javalis] e como ela está distribuída, pois os levantamentos existentes baseiam-se na percepção pelos produtores, trabalhadores e moradores da zona rural, e pela comunicação de danos provocados às lavouras. Portanto, com um grau de confiança limitado”, explica Tirso.
Em dezembro do ano passado, o governo paulista abriu, sob gestão da Fundação Florestal da Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (Semil), um edital para contratação de um serviço de monitoramento e abate de javalis e javaporcos em unidades de conservação ambiental. Integram a iniciativa as Estações Ecológicas de Angatuba, Barreiro Rico, Itirapina e Santa Bárbara, e o Parque Estadual de Ilhabela.
Em relação aos prejuízos em áreas agrícolas, a Secretaria de Agricultura afirma, em nota, que tem adotado medidas para conter a proliferação de javalis e javaporcos. A pasta informa que faz a distribuição, em feiras e programas de capacitação, de cartilhas sobre legislação, métodos de controle, biossegurança e impactos ambientais. E que, visando ampliar o último levantamento, feito em 2022, incluiu um questionário de ocorrência de javalis no sistema do Programa Município Agro, o que impulsionou o monitoramento no estado.
“A SAA reforça e divulga os trâmites para obtenção da autorização do Ibama para o manejo, já tendo capacitado 2.704 controladores, em 31 eventos promovidos pela pasta, incluindo, após o cadastro junto à Defesa Agropecuária, novos agentes de vigilância em saúde única para o território estadual”, complementa a nota.
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