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Drones que batem asas? Pássaros inspiram pesquisa em SP
Projeto visa entregar, até 2028, processos de engenharia que permitam reproduzir movimentos de aves encontradas na fauna brasileira

Igor Savenhago | Ribeirão Preto (SP)
13/08/2025 - 17:35

Por volta do ano 1480, o gênio renascentista italiano Leonardo da Vinci projetou uma máquina voltada a reproduzir o voo de pássaros e morcegos. Ele sonhava com um modelo de mais de dez metros de envergadura, com estrutura de pinho revestida de seda crua, o que resultaria em uma membrana leve e, ao mesmo tempo, resistente.
O equipamento, conhecido como ornitóptero, bateria asas e seria comandado por um piloto, que, deitado de bruços sobre uma prancha, acionaria uma manivela conectada a um sistema com haste e polia. Outra manivela deveria ser girada com mãos e pés para aumentar a produção de energia.
O projeto nunca chegou a ser colocado em prática, mas pode ser o ponto de partida – mais de 500 anos depois – para a construção de drones que aliem maior estabilidade no ar com cobertura de grandes distâncias, o que beneficiaria diversos segmentos econômicos, inclusive a agropecuária.
Segundo Douglas Domingues Bueno, engenheiro mecânico e professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Ilha Solteira (SP), a inquietação para que se consiga obter um veículo aéreo que bata asas voltou a se manifestar, mais fortemente, entre as décadas de 1950 e 1970, tendo ganhado força no campo profissional nos anos 1990, com publicações como a de James DeLaurier, um norte-americano que atuou na University of Toronto’s Institute for Aerospace Studies, no Canadá, e que, em 1993, publicou um artigo relevante sobre o tema, tendo entrado para o hall da fama da aviação canadense em 2022.
Bueno lidera um grupo que reúne, além de pesquisadores da Unesp, entre professores e estudantes de graduação, mestrado e doutorado, nomes de outras instituições, como a Universidade de São Paulo (USP), campus de São Carlos (SP), e Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), no Mato Grosso do Sul. São mais de 20 pessoas em quatro frentes de trabalho – estrutura, aerodinâmica, eficiência energética e controle do veículo. Apoiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), elas trabalham para desenvolver drones que sejam inspirados em aves encontradas na fauna brasileira – e que, além de aerodinâmica mais eficiente, tenham menor gasto energético.

O objetivo é entregar, até 2028, processos matemáticos e computacionais que estabeleçam bases teóricas e práticas, e consigam orientar a construção dos primeiros protótipos. Algumas peças já foram confeccionadas em impressora 3D, para que o potencial de aplicação seja testado. “Já existem algumas tentativas no mundo, mas ainda de forma muito empírica, que obtém modelos mais parecidos com brinquedos. Uma coisa é fazer um brinquedo, outra é fazer com conhecimentos de engenharia, hoje ausentes”, explica Bueno.
Isso porque, segundo o professor, que já atuou na indústria aeronáutica, a engenharia ainda não compreende muito bem como o organismo dos pássaros – e também dos insetos – se articula para permitir que batam asas com a capacidade que demonstram. “É um sistema muito sofisticado. Quando as aves, por exemplo, sobem as asas, elas giram um pouco as penas, possibilitando que o ar atravesse por elas. Se conseguirmos dar um passo para entender essa aerodinâmica, podemos levar a engenharia de veículos aéreos para outro nível”, esclarece Bueno.
Drones bioinspirados
De acordo com o relatório Drone Insights Industry, elaborado por uma empresa alemã especializada no segmento, o mercado mundial de drones deve movimentar cerca de US$ 41,3 bilhões até o ano que vem. No Brasil, existem, segundo o documento, mais de 100 mil drones. Destes, pouco mais de cinco mil estão cadastrados oficialmente como agrícolas, mas, conforme estimativas de consultores, 35 mil desses veículos já circulam pelos céus das propriedades rurais do país.
Esses números demonstram a relevância da pesquisa desenvolvida na Unesp, cujo projeto foi apresentado à Fapesp em 2022 e aprovado para começar a vigorar no ano seguinte, por um prazo de cinco anos. Bueno conta que a proposta nasceu das discussões da disciplina que ele ministra, Aeroelasticidade, que busca entender as interações entre fluido e estrutura. “Se a gente partir de uma compreensão de que, quanto maior a velocidade de um veículo aéreo, maior a interação com o vento, o veículo, nesse caso, é a estrutura e o vento é o fluido. Nessa interação, um pássaro, como um pardal, por exemplo, deixa qualquer avião no chinelo quando se fala em dinâmica de voo”.
Estudando essas relações, professor e alunos passaram a pensar no desenvolvimento de uma nova geração de drones – que sejam bioinspirados, ou seja, inspirados na natureza. Os resultados preliminares do trabalho foram apresentados na 25ª edição da Fapesp Week França, evento realizado pela fundação e que reuniu pesquisadores brasileiros e franceses entre os dias 10 e 12 de junho.
Bueno lembra que existem dois tipos de drones disponíveis: os de asas fixas e os de asas rotativas (hélices). Enquanto os de asas fixas são projetados para cobrir grandes distâncias, mas não fazem manobras tão precisas, os de asas rotativas conseguem pairar no ar e fazer voos verticais, mas têm menor autonomia e velocidade.
Chegar a um modelo que bata asas, conforme o professor, seria uma maneira de juntar as vantagens de um modelo com as de outro. “Com isso, poderemos começar um processo de transição, de forma que os drones que cobrem grandes distâncias possam também ter a habilidade dos que têm asas rotativas, a exemplo de um beija-flor, que consegue parar no ar”, destaca Bueno.

Além do beija-flor, outros dois pássaros servem como inspiração: a arara-canindé e o mergulhão-caçador. A primeira por causa das dimensões – pouco mais de um quilo e até noventa centímetros de comprimento -, consideradas adequadas para um drone, e o segundo por causa da capacidade de ficar até 40 segundos embaixo d’água – já que os pesquisadores cogitam que uma das aplicações dos drones bioinspirados seja em inspeções submersas.
Além de ações de monitoramento, esses equipamentos poderiam ser usados, também, em regiões próximas a aeroportos, disfarçados de pássaros, para espantar aves que causam riscos a pousos e decolagens de aviões, e, no caso específico do agro, para as diversas finalidades executadas pelos drones atuais, como plantio e aplicação de defensivos. O grupo busca, ainda, instalar painéis solares nos veículos, para permitir o recarregamento sem que haja a necessidade de retornos frequentes a uma base em campo. “Quando a tecnologia estiver disponível, o mercado poderá torná-la viável comercialmente e criar uma série de outras aplicações”, conclui oi professor.

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