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Sustentabilidade

Em São Paulo, fazendas usam a fotografia como aliada do meio ambiente

Levantamentos de avifauna em fazendas da região de Ribeirão Preto identificam mais de 200 espécies, unindo conservação e turismo ecológico

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Igor Savenhago | Ribeirão Preto (SP)

14/09/2025 - 07:00

Livro publicado mostra pássaros fotogrados na Fazenda Cravinhos. Foto: Andreza Mancuso
Livro publicado mostra pássaros fotogrados na Fazenda Cravinhos. Foto: Andreza Mancuso

A câmera apontada para o céu dá pistas sobre a conservação da terra. Foi isso o que demonstrou um grupo contratado pela bicentenária Fazenda Cravinhos, no município de mesmo nome, no interior paulista, para fazer um levantamento das espécies de aves existentes na propriedade. 

O trabalho, que durou quase dois anos, foi registrado em livro, lançado no final de 2024. Nele, estão informações detalhadas sobre as 174 espécies fotografadas e sobre a história da fazenda.

No final dos anos 1800, a fazenda pertencia à família Pereira Barreto. Foi o médico, filósofo e político Luiz Pereira Barreto quem trouxe, da França, onde estudava, as mudas de café para experimentos. De lá para cá, a propriedade passou pelos ciclos da cana-de-açúcar e da pecuária. No começo dos anos 1980, foi comprada por Luiz Biagi, que, desde 2019, aposta no segmento de uvas e vinhos – e que, em fevereiro de 2023, inaugurou ali uma osteria. 

Foi dele a ideia de levantar a avifauna da fazenda, após conhecer a fotógrafa Andreza Mancuso — que se interessava por aves desde 2011, quando morava nos Estados Unidos. Lá, ela conheceu muitos parques e centros de conservação. 

Em 2014, já de volta ao Brasil, decidiu cursar fotografia. E, quatro anos mais tarde, deu os primeiros passos — e cliques — para usar a imagem em prol da preservação ambiental. Uma trajetória que ganhou asas quando a fotógrafa conheceu Leila Heck, gestora do Museu da Cana, localizado entre os municípios de Pontal e Sertãozinho (SP), em propriedade que também pertence a Luiz Biagi. 

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Os primeiros cliques

Na mata preservada no entorno do museu, a fotógrafa passou a observar as aves visando à produção de um catálogo fotográfico. Biagi gostou tanto da proposta que a contratou para a Fazenda Cravinhos, onde ela formou um grupo com mais 11 pessoas, entre fotógrafos e ambientalistas. 

Durante um ano, a equipe fez visitas mensais à fazenda. Ficava o dia todo e, às vezes, de madrugada, para fotografar espécies com hábitos noturnos. Entre as estratégias usadas, muita paciência e reprodução de sons emitidos pelas espécies. Depois, foi necessário mais um ano para formatar o livro, comercializado na propriedade e que serve, ainda, como um guia aos visitantes. 

Luiz Biagi conta que, ano após ano, devido à produção de mudas de árvores nativas na fazenda, para garantir o próprio reflorestamento, mais espécies de aves estão aparecendo. “Estamos aumentando a nossa APP [Área de Preservação Permanente] e muitas aves também têm voltado para cá. Eu não tinha a menor ideia de que fossem tantas. Isso me surpreendeu”, explica. “Quando vi o resultado do trabalho, algo tão bonito, resolvi fazer o livro. Imagino que ele possa também surpreender e sensibilizar muita gente”, completa. 

Segundo Andreza, a presença de fotógrafos em áreas rurais tem se tornado mais comum na região de Ribeirão Preto à medida que fazendeiros e sitiantes se atentam para a importância de conhecer as espécies, com o intuito de protegê-las. “Todo trabalho que faço é como cidadã cientista. A minha consciência é de preservação”, afirma. “E é interessante perceber que essa iniciativa da Fazenda Cravinhos tem dado origem a outros trabalhos. Não apenas em propriedades rurais, mas em clubes, parques e universidades”. 

800 mil fotos

Um dos fotógrafos que participaram do grupo foi Júlio Filipino. Há 14 anos, ele trabalha como guia de turismo ecológico e organiza comitivas de pessoas interessadas na observação de aves. Diz que sempre gostou de fotografar, mas a ligação com a natureza ficou ainda mais íntima quando conheceu o WikiAves – enciclopédia online que se tornou a maior comunidade de observadores de aves do Brasil. 

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Aposentado desde 2019 da Polícia Militar, Filipino se dedica integralmente, desde aquele ano, ao registro de espécies na região. Calcula ter um acervo com mais de 800 mil fotos, a maioria de aves. No entanto, outros animais não são raros. “Não há como fazer observação de aves sem ver insetos, anfíbios. De vez em quando, aparecem surpresas, como um tamanduá-bandeira, um lobo-guará, um cachorro-do-mato, entre outros”. Além do livro da Fazenda Cravinhos, já participou de outros cinco. Entre eles, um produzido no campus da Universidade de São Paulo (USP), em Ribeirão Preto. 

Filipino lembra que, no início, as saídas para fotografar eram uma espécie de terapia individual. “Uma oportunidade para ficar em silêncio, imóvel, esperando por horas uma ave aparecer”. Sensações que agora são estendidas a outros interessados. “A observação de aves surpreende muita gente, inclusive os donos das fazendas, que às vezes não conhecem as espécies. Sem dúvida, é um estímulo à preservação”, declara. “Da última vez, por exemplo, em apenas seis quilômetros de caminhada, registramos 80 espécies”. 

Ecoturismo

Fazenda Morro Azul.
Fazenda Morro Azul. Foto: Andreza Mancuso

Na Fazenda Morro Azul, em Jardinópolis (SP), vizinho a Ribeirão, preservação nunca deixou de ser prioridade, segundo a proprietária Veridiana Costacurta. O lugar ocupa uma área de 213 hectares, dos quais 135 são de vegetação remanescente da Mata Atlântica — outra parte tem cultivo de cana. 

Há oito anos, a Morro Azul abriu as porteiras para o ecoturismo. Os visitantes podem fazer trilhas e passear em cachoeiras. Um cenário convidativo, também, para contemplar as espécies de aves que frequentam o lugar.

Depois de saber como Filipino atuava, Veridiana decidiu fazer o levantamento da avifauna da propriedade, que registrou, em quase dois anos, 86 espécies. Ela pretende produzir um catálogo e incentivar a formação de grupos interessados em passar um dia na fazenda, na companhia de um guia como Filipino, para observar a mistura de cores que decora a vegetação. 

“Para que essa ideia se torne mais frequente, precisamos divulgá-la, de forma que as pessoas conheçam as possibilidades de turismo rural e biodiversidade que existe na região”, afirma Veridiana.

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