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Economia

Reciprocidade ao etanol: Embaixador Graça Lima vê com ceticismo a inclusão do açúcar nas negociações

Diplomata avalia que a tentativa de negociação do Brasil é legítima, mas ressalta que o setor de açúcar é altamente protegido nos EUA

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Sabrina Nascimento | São Paulo | Atualizada em 05/03/2025 às 15h53

17/02/2025 - 14:18

Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

O setor sucroalcooleiro segue atento à possível aplicação da tarifa de reciprocidade dos Estados Unidos ao etanol brasileiro. Na última semana, o presidente Donald Trump assinou um memorando determinando que seus assessores recalculem os níveis tarifários aplicados sobre as exportações do produto. 

Em entrevista ao Agro Estadão, o ex-embaixador do Brasil em Washington e na União Europeia, José Alfredo Graça Lima, avalia que, a relação bilateral entre os dois países tem se mostrado menos suscetível a severas barreiras comerciais, mesmo com a postura protecionista dos EUA. 

Além disso, o vice-presidente do conselho curador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI) destacou como legítima a intenção do Brasil negociar uma reciprocidade nas tarifas aplicadas pelos norte-americanos ao açúcar brasileiro. Entretanto, ressalta que este setor é altamente protegido nos EUA, o que torna difícil aumentar o acesso do produto brasileiro ao mercado norte-americano. 

O que o anúncio de reciprocidade de Donald Trump ao etanol braileiro representa para as relações comerciais entre Brasil e Estados Unidos (EUA)?

As relações comerciais dos EUA sempre foram pautadas pela nossa participação no GATT [Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio] e depois na OMC [Organização Mundial do Comércio]. Por razões históricas, na década de 1970, os Estados Unidos tiveram dificuldades em ampliar suas importações, mantendo tarifas baixas para a maioria dos produtos. Com o tempo, o comércio bilateral foi se abrindo, mas o Brasil continua deficitário na balança com os EUA, o que, em tese, reduz o risco de restrições comerciais mais severas. Agora, se você olhar por setores, claro que você vai encontrar disparidades. E o etanol é um caso absolutamente típico, em que a tarifa americana é de apenas 2,5%. No caso do Brasil, essa tarifa sobe para 18%. Apesar disso, são produtos distintos, pois o etanol norte-americano é feito de milho, enquanto o brasileiro vem da cana-de-açúcar.

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Essa diferença na base de produção do etanol brasileiro e norte-americano pesa nessa disputa comercial? 

Quando você tem uma medida unilateral, que não é talvez muito estudada, ou é só no sentido como parece ser o caso de estabelecer diferenças e alegando prejuízo para uma determinada indústria, o raciocínio fica, obviamente, um pouco distorcido. Se sabe que esse etanol é fabricado a partir do milho, ele não é tão limpo quanto o etanol que é feito na base de cana-de-açúcar. E os efeitos são, portanto, diferentes. Não é um produto que no Brasil tenha especificações.

Existe alguma leitura de que a postura de Donald Trump em forçar uma negociação bilateral é uma tentativa de enfraquecer as normas de negociações estabelecidas pela Organização Mundial do Comércio (OMC)? 

Eu vejo, sobretudo, como uma estratégia ou uma ação abrangente. Todo setor que houver diferença na tarifa vai cair nessa malha fina, nesses estudos que foram encomendados, mas como isso vai ocorrer na prática, a gente não sabe ainda. É claro que toda ação unilateral é violatória dos compromissos da OMC. E as próprias negociações que levam a restrições voluntárias à exportação são contrárias ao acordo de salvaguardas. Agora, essa é a maneira que o comércio e os governos vão ter que encontrar para não interromper os fluxos, para não causar rupturas. Então, pode ser sim, não em todos os casos, mas em alguns casos pode ser uma maneira de provocar uma negociação que talvez não seja nem tão ruim, dependendo do caso específico. No caso do etanol, num cenário otimista, eu diria que a redução de tarifas pode ser um benefício, não necessariamente para o setor, mas para a economia, para o consumidor. 

Como a estrutura de comércio entre Brasil e EUA pode influenciar a aplicação de tarifas de reciprocidade? 

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Bom, depende do setor. Já foi dito pelo Ministério da Indústria e Comércio, com propriedade, que os principais produtos exportados dos EUA para o Brasil é um comércio superavitário em favor dos EUA. E é lógico, porque você interessa ao importador praticar tarifas que não acrescentem ao custo do produto e, portanto, que atendam uma necessidade, ou seja, da indústria, seja do consumidor final. E, de novo, no caso dos EUA, o etanol é uma exceção, uma vez que, o comércio com o Brasil é muito focado em trocas entre produtos industriais. 

Na questão do etanol, o setor tem cogitado a oportunidade de o governo brasileiro negociar uma tarifa de reciprocidade para o açúcar. Qual é a avaliação do senhor? 

Isso quase ocorreu na época da visita do presidente Bolsonaro a Washington na primeira administração Trump [em 2019]. Foi feito um acordo nessa época, mas o açúcar é muito protegido nos EUA. No entanto, é claro que vale a pena tentar. Mas, tudo depende da disposição do lado americano. Como se diz, take two for the tango (é preciso dois para dançar tango). Você não pode só querer, é preciso que uma outra parte também queira, tenha essa disposição. E eu vejo com pouca confiança o açúcar entrando em uma barganha, embora seja uma aspiração perfeitamente legítima por parte do Brasil. 

Diante dessa postura mais protecionista dos EUA, como fica o comércio global? 

A gente fica com a impressão, lendo o noticiário, de que o comércio com os EUA representa uma parcela muito mais expressiva do que ela efetivamente é. Um outro ponto é que apenas aqueles produtos que são importados pelos EUA é que podem sofrer algum tipo de restrição, como aço, microprocessadores, farmacêuticos e automóveis. No caso dos automóveis, afeta mais a Europa do que o Brasil, porque nós não exportamos carros para os norte-americanos. No geral, mais de 80% do comércio global ocorre sob a cláusula de nação mais favorecida, em bases não discriminatórias [a cláusula é uma regra que garante que, se um país concede benefícios comerciais a uma nação, esses mesmos benefícios devem ser automaticamente aplicados a todos os outros países que participam do acordo]. Isso é muito importante porque demonstra que esses acordos que foram negociados ao longo do tempo nada interferiram no andamento do comércio, que continua ativo e crescendo dentro das regras da OMC.

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