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Resíduos do camarão podem beneficiar produção de etanol
Pesquisa da UFSCar usou melaço de cana para obtenção da quitosana, antimicrobiano com potencial para substituir o ácido sulfúrico nas usinas

Igor Savenhago | Ribeirão Preto (SP)
03/08/2025 - 08:00

Uma pesquisa desenvolvida na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), campus de Araras (SP), demonstrou que é possível extrair, de resíduos de camarão, uma substância com potencial para substituir o ácido sulfúrico no processo de produção de etanol: a quitosana.
Os estudos, que contaram com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), foram realizados durante o doutorado de Isabella Carvalho Tanganini, defendida na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), sob orientação da professora Sandra Regina Ceccato Antonini, da UFSCar. Uma parte da tese teve parceria de outra professora, Andréia Fonseca de Faria, da Universidade da Flórida, nos EUA. O trabalho foi publicado no periódico científico internacional Springer Nature Link.
Sandra explica que, no auge da pandemia de Covid-19, o ácido sulfúrico, utilizado para evitar contaminações no processo de fabricação do etanol, devido a seu efeito antimicrobiano, faltou no mercado. “As usinas começaram a procurar alternativas”. Na época, a professora começava a trabalhar com a quitosana, comum na produção de vinhos. “Como o processo de fermentação do etanol é parecido com o do vinho, decidimos experimentar como uma possibilidade de solução para as usinas”, explica Sandra.
A quitosana também é um antimicrobiano. Uma das vantagens dela sobre o ácido sulfúrico, além do que este é altamente corrosivo e pode provocar acidentes, é que se trata de uma fibra natural e, por isso, ambientalmente mais amigável. A proposta da professora, inicialmente, era comprá-la para os experimentos. “Até que a Isabella veio com a ideia de extraí-la dos resíduos do camarão”, afirma.
Com melaço de cana

O exoesqueleto de crustáceos, como camarões e caranguejos, é rico em quitina — da qual a quitosana é derivada. Para a primeira fase da pesquisa, de obtenção da quitina, as pesquisadoras usaram o melaço de cana como substrato. Isso permitiu trocar um processo químico, no qual são aplicados, geralmente, ácidos e bases fortes, por um biológico.
Primeiro, o melaço é batido com os resíduos do camarão. A mistura é fermentada para liberar ácido lático e proteases, que, por sua vez, agem para retirar a quitina dos resíduos. Na etapa seguinte, a quitina passa por desacetilização, dando origem à quitosana. Sandra diz que, embora existam opções biológicas também para esta fase, elas não foram exploradas nesta pesquisa. A desacetilização, portanto, foi feita quimicamente.
Além de entrar no processo de produção de etanol, a quitosana é amplamente utilizada pelas indústrias farmacêutica, para fabricação de curativos e encapsulamento de medicamentos; alimentícia, para compor revestimentos e embalagens biodegradáveis; e também na agricultura, para controle de pragas e para auxiliar no fornecimento de nutrientes para o solo.
Sem contar que, nos testes da UFSCar, a quitosana demonstrou atividade antifúngica eficaz em microrganismos que atacam lavouras, como a Alternaria alternata (causador da mancha de alternaria), Fusarium sp. (fusariose ou podridão-seca) e Geotrichum citri-aurantii (podridão-azeda), o que sugere uma nova destinação à quitosana: a de pesticida natural.
Pensando nessas vertentes, as pesquisadoras estão, agora, testando a produção de nanopartículas de quitosana, o que pode otimizar o uso da substância.
Escala
Segundo Sandra, já houve contato de usinas que se ofereceram para experimentar a quitosana em escala maior. “Estamos fazendo experimentos em condições reais de produção, nas próprias usinas, com as bactérias delas, para que a gente possa transformar em um produto”. O estado de São Paulo, responsável por 35% a 40% da produção nacional de etanol, pode ser um dos maiores beneficiados — na safra 2024/2025, o país fabricou 34,96 bilhões de litros segundo a União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica).
Questionada sobre o acesso das usinas a resíduos de camarão, a professora lembra que eles estão amplamente disponíveis, em lugares como o Porto de Santos. “Podem ser estabelecidas, também, parcerias com indústrias pesqueiras”.
Outra possibilidade, em caso de dificuldades para a obtenção dos resíduos, é que sejam usadas as próprias leveduras responsáveis pela fermentação de etanol, que também têm quitina nas paredes celulares — em quantidade menor que nos camarões. Sandra destaca, no entanto, que alguns tipos de leveduras podem ser multiplicados em biorrefinarias, o que aumentaria a oferta do antimicrobiano.

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