Tudo sobre AgroSP
Produtores de Casa Branca (SP) reinventam cultivo de jabuticabas
Tradicionalmente vendida in natura, fruta ganha valor ao ser processada, está virando item de exportação e ganhou até um pomar com variedades raras

Igor Savenhago | Ribeirão Preto (SP)
25/05/2025 - 08:00

Priscilla de Oliveira Fagan é de uma tradicional família produtora de jabuticabas em Casa Branca, município do interior de São Paulo que é considerado a capital estadual da fruta. Até 2021, a colheita nas três mil árvores plantadas na propriedade, em uma área de 25 alqueires, era direcionada ao mercado para ser vendida in natura ou entregue para processamento industrial. Durante a pandemia de Covid-19, a indústria deixou de comprar. Foi preciso, então, mudar a estratégia: abrir o pomar para o turismo e pensar em formas de agregar valor.
A variedade cultivada na fazenda, que também produz laranja, é a sabará, que responde por quase a totalidade das mais de 20 mil plantas de jabuticaba existentes em todo o território de Casa Branca. O nome é referência à cidade mineira de Sabará, capital brasileira da fruta, de onde a jabuticaba foi trazida por tropeiros.
Na década de 1970, o avô de Priscilla e os irmãos dele começaram a arrendar pomares já existentes no município paulista e a apostar na produção em escala comercial. Foi assim até quatro anos atrás, quando o negócio foi “reinventado”. “Fomos convidados a investir no turismo. O pessoal começou a se interessar em conhecer o pomar, pegar a fruta direto do pé e, também, a querer experimentar produtos derivados da jabuticaba”, conta o marido de Priscilla, Luis Gustavo Genaro.
Ele explica que, antes de 2021, os frutos pequenos, que não eram aproveitados pelo mercado, viravam adubo para as próprias jabuticabeiras. Agora, eles se transformam em geleia, aguardente, vinagre, licor, xarope e a “jabuticabada”, doce lançado neste ano. “Ele é prensado com a semente triturada, para dar uma crocância”, explica Genaro.

O casal também produz casca desidratada para chás, farinha da casca, casca em calda e ainda encaminha uma parte das cascas para uma empresa parceira, que fabrica sorvete de jabuticaba. Priscila e Genaro também desenvolvem um processado congelado da fruta, de olho em possibilidades de exportação. É uma forma de aumentar a vida útil dos frutos, que, in natura, duram apenas três dias. Um projeto com o Instituto Agronômico (IAC) e com o Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital) busca tecnologias capazes de ampliar, ao máximo, a durabilidade após o congelamento.
A fazenda já dispõe de estrutura para congelar até 50 toneladas da fruta. “Nós vivemos da jabuticaba. Então, estamos sempre em busca de alternativas que possam agregar valor à nossa produção”, afirma Priscilla.
Jabuticabas raras

Outro que está atento às novas formas de explorar os potenciais da jabuticaba é Adhemar Gomes da Silva Neto. Em uma chácara no perímetro urbano de Casa Branca, o agrônomo e a mulher, Cíntia Jacob, cultivam 200 variedades de frutas raras, sendo que a metade é de jabuticabas.
Ele conta que esse interesse surgiu há mais de duas décadas, quando começou a colecionar pitayas. “Era uma época em que as pitayas ainda eram pouco conhecidas”. De lá pra cá, foi tendo contato com outras espécies de frutas. Até que montou um site, o Frutas Raras, com perfis nas redes sociais, e passou a interagir com outros produtores espalhados pelo país e com gente interessada em experimentar sabores diferentes ou em ter contato, novamente, com aqueles que estavam gravados nas memórias de infância.
“Abri a chácara para receber pessoas que queriam fazer degustação. Eu sentia que era preciso divulgar o que eu fazia para que elas conhecessem a riqueza que o Brasil tem. E também para que elas voltassem a ter a experiência de pegar uma fruta direto do pé”, conta Silva Neto.
Entre as jabuticabas, ele tem a escarlate, com coloração avermelhada intensa; a do Mucuri, arroxeada; a caipirinha, cuja árvore atinge, em média, dois metros de altura e é ideal para vasos ou bonsais; a melancia, com casca verde e em tamanhos bem maiores que as convencionais; a da restinga de Quissamã, nativa do Rio de Janeiro e que carrega uma coroa no topo; a Otto Andersen Seleção, cuja fruta mede quase três centímetros de diâmetro, entre várias outras.
Silva Neto também é diretor técnico da associação local de produtores de jabuticabas. Ele afirma que um dos objetivos é fortalecer, ainda mais, a proximidade das famílias com a tradição de Casa Branca. “As famílias mais tradicionais têm uma ligação forte com a fruta. Quase todas têm jabuticabeiras no quintal e aquela receita de licor ou geleia que atravessa gerações. Mas, ao longo do tempo, o interior de São Paulo foi mudando e as pessoas que chegaram depois já não têm essa ligação”, afirma.


Entre as ações da associação, está a discussão com agentes públicos sobre possíveis medidas que isentem de impostos moradores que plantarem jabuticabeiras, estímulo a uma gastronomia com o uso da fruta e à curiosidade. “Falo sempre para as pessoas ficarem de olho em seus quintais. Às vezes, aparece uma fruta diferente, que estava perdida e que pode despertar um monte de lembranças boas ou permitir que crianças e os jovens conheçam os sabores do país”, conclui ele.
Aliada da saúde
Além das novas táticas adotadas pelos agricultores, a jabuticaba ganhou um aliado acadêmico nesse processo de agregação de valor. Pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) comprovaram que a casca da fruta possui propriedades capazes de regular a glicemia em pessoas diabéticas, o colesterol, além de combater inflamações, tendo eficácia, inclusive, contra o câncer de próstata.
As pesquisas feitas pelo Instituto de Biologia da Unicamp, por exemplo, em parceria com a Faculdade de Engenharia de Alimentos da instituição, demonstraram, após testes em camundongos com idades avançadas, que o extrato da casca impediu ganho de peso, reduziu os níveis de glicose no sangue, aumentou o chamado “colesterol bom”, melhorou a morfologia do fígado e o aspecto tecidual da próstata.
Isso aconteceu, conforme os pesquisadores, porque a casca da jabuticaba carrega um alto índice de antocianinas, oito vezes maior que a polpa, o que permite combater radicais livres que causam o envelhecimento das células. Ela também apresenta fibras que formam uma espécie de gel no intestino, retardando a absorção de açúcares.
Ainda segundo os autores, os estudos podem ajudar o Brasil a liderar um mercado de produtos “nutracêuticos” — termo que combina “nutrição” e “farmacêutico”, e se refere a um grupo de alimentos com grandes benefícios à saúde humana.

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