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Pesquisadores paulistas testam extrato de urucum na alimentação de ovinos
Universidade com sede em Presidente Prudente (SP) também quer conhecer o perfil de consumidores de carne ovina no país

Igor Savenhago | Ribeirão Preto (SP)
19/05/2025 - 08:00

Uma pesquisa desenvolvida na Universidade do Oeste Paulista (Unoeste), com sede em Presidente Prudente (SP), está testando um extrato feito com urucum na alimentação de ovinos.
Os estudos com o fruto – nativo da faixa entre o México e o sul da América tropical, usado geralmente como corante no Brasil –, são conduzidos pela professora Marilice Zundt Astolphi, zootecnista, mestre e doutora em Nutrição Animal, e envolvem estudantes do Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal da Unoeste, com apoio da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (Apta), regional de Presidente Prudente.
Marilice explica que os pesquisadores envolvidos no projeto buscam, há seis anos, encontrar produtos antioxidantes que contribuam para melhorar a qualidade da carne de ovinos. Dois deles foram identificados no urucum, que é ofertado em microcápsulas aos animais, na proporção de 0,5% a 0,8% do peso vivo ao dia.
Os testes são feitos em 50 cabeças. E os resultados, segundo a professora, têm sido surpreendentes. “A suplementação direto no cocho dos animais melhorou a qualidade da carne, deixando-a com cor mais atrativa e com maior potencial antioxidante, além de menor rancificação e mais estabilidade ao longo do tempo”, explica Marilice.
Ainda de acordo com ela, as amostras de carne, mesmo após um ano de congelamento, demonstraram menor concentração de gordura, um indicativo importante do aumento do tempo de prateleira e de preservação de sabor, cor e valor nutricional.
“Isso reforça o potencial do concentrado de urucum usado na pesquisa, como alternativa para prolongar a vida útil dos alimentos de origem animal. Além disso, o leite das ovelhas teve melhor composição nutricional, apresentando maior quantidade de ácidos graxos insaturados, que são benéficos para o consumo”, conta a pesquisadora.
Na gestação das ovelhas, o extrato se mostrou benéfico para aumentar a eficiência da placenta, favorecendo o desenvolvimento dos cordeiros antes do nascimento. Mas, conforme Marilice, os achados não param por aí. Quando ratos foram alimentados em laboratório com a carne de animais que receberam o extrato, apresentaram melhora nos níveis de colesterol e de imunidade. “Isso indica que a carne enriquecida com urucum pode se tornar um alimento funcional promissor para a saúde humana”, diz Marilice.
A professora esclarece que a literatura científica aponta experimentos com urucum na nutrição de animais, mas é a primeira vez que os testes são feitos em ruminantes. Além de agregar valor à carne, o uso do produto pode ajudar a desenvolver ainda mais a cadeia do fruto na região oeste do estado – que é a maior produtora do Brasil, respondendo por 80% do volume colhido no estado e 20% de todo o país.
O também zootecnista Ricardo Firetti, que oferece suporte ao projeto pela Apta, trabalhou durante o doutorado em Política Científica e Tecnológica pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), entre 2014 e 2018, com cadeias produtivas locais do estado de São Paulo. Entre elas, a do urucum. Ele afirma que uma das propostas da pesquisa da Unoeste, ao observar se os princípios ativos do fruto conferem mudanças na estrutura dos lipídios nos animais, diminuindo a oxidação, é que a carne de cordeiro seja vendida não necessariamente congelada, “mas fresca”.

Perfil do consumidor
Junto com essa pesquisa, a professora Marilice coordena outra, que pretende descobrir o perfil dos consumidores de carne ovina no Brasil. Por meio de um questionário online, os participantes do estudo – que incluem, além de estudantes da pós-graduação, os de graduação em Medicina Veterinária e Zootecnia da universidade – querem saber quais são as preferências de consumo, a frequência, a percepção sobre a qualidade, o valor nutricional, o preço e formas de aquisição da carne. Com dados atualizados e abrangentes, esperam contribuir para o desenvolvimento da cadeia produtiva no país.
Informações coletadas em levantamentos anteriores estimam um baixo consumo per capita de carne ovina no Brasil: cerca de um quilo por ano, enquanto o de carne bovina, por exemplo, é de 36 quilos/ano. Em países como a Nova Zelândia, o consumo de ovinos chega a 40 quilos por habitante/ano.
Marilice credita isso ao desconhecimento – cerca de 12% da população brasileira nunca experimentou esse tipo de carne –, preço elevado na comparação com outras proteínas, falta de frigoríficos especializados baixa disponibilidade do produto em pontos de venda comuns, como supermercados, hábitos alimentares regionalizados, com pouca inserção da carne ovina em cardápios tradicionais, e experiências sensoriais negativas relatadas por quem já comeu, como sabor ou odor considerado desagradável.
“Apesar disso, há indícios de crescimento potencial do mercado, com expectativas positivas nos próximos anos. No entanto, o setor ainda carece de dados consolidados e atualizados sobre o consumidor, o que dificulta o direcionamento de políticas públicas e estratégicas comerciais”, declara Marilice.
Outra preocupação é fortalecer o próprio mercado paulista da carne ovina. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o rebanho ovino brasileiro era de cerca de 21,8 milhões de cabeças em 2023, com destaque para a Bahia, que tinha pouco mais de 5 milhões. Apesar de ter o maior número de animais da região Sudeste, São Paulo vinha apenas na 14ª posição nacional, com 295 mil cabeças. “Mesmo com um rebanho relativamente pequeno, São Paulo se destaca pela forte movimentação comercial, sendo um polo relevante no mercado consumidor”, explica a professora.
Qualquer pessoa pode participar da pesquisa, desde que tenha mais de 18 anos. Para responder ao questionário, clique aqui.

Redução e retomada
O presidente da Associação Paulista de Ovinocultura (Aspaco), Rafael Rodrigues Jorge, afirma, porém, que, apesar de São Paulo ser um grande centro consumidor – o maior do país –, a ovinocultura paulista vem enfrentando retração no número de animais. Em 2022, por exemplo, de acordo com o Anuário da Pecuária Brasileira (Anualpec), havia em terras paulistas 330 mil cabeças. Jorge acredita que um dos motivos para a diminuição de plantéis seja a concorrência com carne de baixa qualidade importada pelo estado ou com produto clandestino. Diante disso, ele diz que o principal desafio é retomar a produção paulista.
Para isso, lista algumas medidas que estão sendo tomadas pela associação. A primeira é incentivar o recadastramento dos criadores junto à Defesa Agropecuária, por meio do Sistema Gedave. “A gente conseguiu que os produtores informem apenas o número de animais, sem precisar dizer como eles chegaram até lá”, afirma. Com isso, o objetivo é saber, da forma mais fiel possível, o tamanho do rebanho. “Os dados que existem hoje são meramente especulativos, não reais”, garante. “A campanha já tem um ano, conseguimos atualizar grande parte, mas ainda está longe do que seria o ideal”.
A segunda medida é habilitar novos frigoríficos ou plantas já existentes, para coibir o comércio clandestino. Atualmente, segundo a associação, existem apenas três frigoríficos ativos no estado.
A terceira ação consiste na formação de núcleos regionais da associação, para buscar uma aproximação maior com os produtores, entender as principais demandas deles e estudar soluções para problemas. A associação quer criar, ainda, o selo do cordeiro paulista, como forma de demonstrar que a carne produzida no estado é diferenciada, além de permitir ao consumidor que ele saiba a origem do que está comendo.
“Acredito muito no potencial da ovinocultura paulista. São Paulo importa 70% da carne que consome, o que mostra que existe espaço para crescimento da atividade. Se conseguirmos colocar material de qualidade na mesa, o consumo tende a crescer ainda mais. Para isso, precisamos organizar a cadeia”, conclui.

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