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Com mais da metade da produção nacional, setor paulista da borracha busca certificação 

Cadeia produtiva acredita que atendimento às normas internacionais pode alavancar participação no mercado

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Igor Savenhago | Ribeirão Preto

19/03/2025 - 08:36

Extração de látex: nas décadas de 1970 e 1980, noroeste paulista atraiu produtores. Foto: Fernando Guerra/Arquivo pessoal
Extração de látex: nas décadas de 1970 e 1980, noroeste paulista atraiu produtores. Foto: Fernando Guerra/Arquivo pessoal

Responsável por cerca de 57% da borracha natural produzida no Brasil, o estado de São Paulo busca, na certificação do produto, um caminho para voltar a ampliar a participação no mercado internacional, dominado por países asiáticos. Com o cultivo de seringueiras (heveicultura) concentrado principalmente no noroeste paulista, o setor tem trabalhado internamente, e também junto a empresas e a esfera governamental, para fazer a estratégia avançar. 

Números da cadeia produtiva foram levantados em uma pesquisa realizada pela FSC, sistema de certificação internacional com presença no território brasileiro desde 2002. Os dados, divulgados agora em fevereiro, apontam que, em 2023, além de responderem por mais da metade da produção nacional, as áreas paulistas de seringais — dos quais se extrai a matéria-prima da borracha, o látex — estavam distribuídas em 305 municípios, a maioria na região noroeste. Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Bahia e Goiás representavam, no mesmo ano, 9,1%, 8,5%, 8,3% e 7,4% respectivamente. 

A pesquisa demonstrou, também, que o Brasil vem perdendo relevância no comércio internacional, apesar de estar aumentando o cultivo. Em um período de dez anos (2014 a 2023), essa participação oscilou entre 1,13% e 1,7%, com o menor índice registrado justamente em 2023, que correspondeu a 463 mil toneladas de borracha — contra 398 mil em 2022.  

O maior sintoma do declínio da importância da cultura no Brasil está na região Norte, pioneira no extrativismo, que ajudou a colocar o país como o maior produtor mundial no final do século XIX e nos primeiros anos do século XX. Capitais amazônicas, como Manaus e Belém, se desenvolveram com dinheiro do ciclo do produto. 

Após a Segunda Guerra Mundial, no entanto, o Brasil começou a perder competitividade. Como o extrativismo não conseguia suprir a necessidade de grandes indústrias, passou-se a cultivar de forma adensada, com as seringueiras muito próximas umas das outras, favorecendo o aparecimento de doenças, que afetaram plantações inteiras. 

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Foi então que países asiáticos, como Tailândia, Indonésia, Vietnã e Malásia, ocuparam as lacunas deixadas pelo Brasil e, sustentados com mão de obra barata, tornaram o continente referência em produção, com 90% da borracha natural do planeta. 

Tentativa de retomada

Fernando do Val Guerra é da quarta geração de uma família produtora da região noroeste paulista. A história começou com o bisavô, que plantou, no final da década de 1950, 20 mil mudas em uma propriedade no município de Colina. Elas foram doadas pelo Instituto Agronômico de Campinas (IAC), que buscava estimular uma retomada da produção. 

Guerra explica que, entre os anos 1970 e 1980, descobriu-se que o noroeste de São Paulo tinha condições muito favoráveis ao desenvolvimento das seringueiras, o que atraiu negócios. “A partir da década de 1980, a produção voltou a se expandir, mas com uma gestão ruim. Somente nos últimos 20 anos é que houve uma melhora significativa”, conta. 

Além de produzir em seringais próprios e arrendados, em São Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul, Guerra participa de um projeto de usina de processamento e é diretor-executivo da Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Borracha (Abrabor). Segundo ele, as discussões sobre certificação têm ganhado intensidade com o objetivo de construir uma política para o setor. 

“Seria uma oportunidade enorme para mostrar que o Brasil tem produção diferenciada. Nossa produtividade é mais que o dobro da média mundial, temos sustentabilidade e, se botarmos um pouco mais de tecnologia, é possível fazer frente à mão de obra da Ásia”, acredita Guerra.

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Ainda para o produtor, os seringais do Brasil estão alinhados às exigências da regulamentação para produtos sem desmatamento da União Europeia (EUDR) porque, além de permitirem o cultivo consorciado com outros produtos agrícolas, podem ser usados na recuperação de áreas de reservas legais. 

“A borracha brasileira é altamente certificável. Precisamos de legislações que apoiem esse aspecto e que deem estabilidade, principalmente em momentos de baixos preços. O suporte dos governos pode ajudar com que essa cultura seja grande novamente no Brasil. Até porque, se a Ásia tiver algum problema hoje, o mundo para”, afirma Guerra. 

seringueiras
Setor acredita que produção brasileira tem condições de competir com a asiática. Foto: FSC/Divulgação

Potenciais

A FSC, companhia que fez o diagnóstico do mercado brasileiro da borracha, já intermediou a certificação de 9 milhões e meio de hectares no país, entre plantações de eucaliptos e produções em florestas naturais, como açaí e castanhas, mas não há projetos relacionados à borracha. O levantamento foi feito justamente para avaliar o potencial para isso.  

Entrevistas com 250 representantes da cadeia produtiva, entre associações e cooperativas, instituições de ensino e pesquisa, indústrias, usinas de beneficiamento, agentes públicos e organizações não governamentais apontaram que 93,8% enxergam a sustentabilidade como fator de fortalecimento do setor, que 81,3% comprariam produtos com borracha certificada e que 68,8% topariam pagar mais caro por isso. 

“Como o Brasil está começando a se atentar para a certificação, ainda não tem demanda de mercado. Entendemos que o mercado brasileiro tem grande potencial, até porque os países, como os da União Europeia, vão exigir garantia de origem. Se a borracha foi produzida em área desmatada a partir de 2020, não vai vender”, afirma Elson Fernandes de Lima, diretor-executivo da FSC. De acordo com o diagnóstico, o Brasil exporta metade da borracha natural que produz. 

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“A certificação, na nossa avaliação, pode representar também oportunidades para que os produtores brasileiros recebam um pagamento adicional e para garantir os direitos das comunidades que vivem do extrativismo”, completa Yuri Oliveira Alves, coordenador de desenvolvimento de negócios. 

Brasil como peça-chave

Estimativas de instituições internacionais apontam que 75% da borracha natural do mundo tem como destino a produção de pneus. Os outros 25% são divididos entre outros 40 mil itens aproximadamente. 

pneus
Michelin afirma seguir diretrizes de desmatamento zero para a compra de pneus. Foto: Michelin/Divulgação

O grupo francês Michelin, um dos líderes mundiais na fabricação de pneus, tendo alcançado, em 2024, 27,2 bilhões de euros em vendas, informa que o Brasil é uma peça-chave no desenvolvimento da companhia. Apesar de não divulgar dados regionalizados, diz que a presença no país há quase um século está alinhada à sua estratégia global de crescimento. 

Segunda Bruna Mesquita, gerente de Sustentabilidade da Michelin América do Sul, são mais de 500 pontos de venda no Brasil, sendo que 20% estão no estado de São Paulo. Do volume total usado nacionalmente, 50% é comprado de produtores brasileiros — e um terço desse percentual de áreas paulistas.  

Bruna explica que a escolha dos fornecedores se baseia em critérios como atendimento à legislação ambiental brasileira e de órgãos regulatórios locais, à lei europeia de combate ao desmatamento, bem como na observação de itens como a regularidade fiscal do fornecedor e nas entregas. “Além disso, este processo considera boas práticas de agricultura, avaliação de possíveis impactos na produção do ecossistema e respeito às comunidades locais”, declara Bruna. 

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Ela diz, ainda, que o grupo está comprometido com a borracha natural sustentável há anos. Em 2015, publicou uma política que inclui, entre outros itens, o compromisso com o desmatamento zero. O grupo também apoiou a inclusão da borracha na EUDR. 

Sobre a busca do setor por certificação no Brasil, Bruna afirma que todas as iniciativas que visam melhorar o desempenho social e ambiental da indústria da borracha são bem-vindas, desde que sejam “pragmáticas, eficientes e não tenham efeitos negativos irreversíveis sobre os pequenos agricultores”. 

“A Michelin tem orgulho de ser membro fundador da Plataforma Global para Borracha Natural Sustentável. Além disso, acreditamos no potencial da heveicultura nacional, considerando que a borracha natural é de origem amazônica. O Brasil é um importante ator para o desenvolvimento de uma heveicultura sustentável”, conclui.

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