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Pecuária

Casos de intoxicação de cavalos por ração podem passar de 1.400, denunciam criadores

Empresa afirma ter adotado todas as medidas cabíveis e consegue na Justiça a continuidade das operações da fábrica em GO

Paloma Santos | Brasília e Andrea Russo | São Paulo | Atualizada às 09h08

09/07/2025 - 05:30

Foto: Roberto Barros/ Arquivo Pessoal
Foto: Roberto Barros/ Arquivo Pessoal

O Ministério da Agricultura (Mapa) investiga o óbito de 222 cavalos em várias regiões do país, com suspeita de ligação ao consumo de ração da empresa Nutratta Nutrição Animal Ltda. Mas o número de mortes pode ser bem maior. Segundo levantamento extraoficial realizado por um grupo de criadores, estima-se que o número de animais intoxicados pode passar de 1.400 – sendo que 729 animais morreram, 461 estão em tratamento e 225 em observação.

A advogada paulista Alessandra Agarussi é a responsável pelo levantamento. Proprietária de um animal em tratamento, após consumir produtos destinados para equinos da empresa, ela decidiu reunir os casos em um grupo no WhatsApp, chamado “Vítimas do Caso Nutratta”, que possui 428 membros, além de um perfil nas redes sociais com mais de 600 seguidores.

Ao Agro Estadão, o Mapa não confirma o dado e diz que não há atualização sobre o número de 222 cavalos mortos em 5 estados, divulgado em nota oficial emitida dia 3 de julho. A diferença de registros, na visão da advogada, existe porque muitos criadores ainda não protocolaram a denúncia no Mapa. Além disso, segundo ela, alguns temem prejudicar a imagem dos seus centros de treinamento. “As pessoas têm medo de denunciar. Tem vergonha. Tem dor. Mas também tem o medo de dizer que perdeu um cavalo por intoxicação. Alguns perderam apenas um animal e optaram por não registrar”, alerta.

O caso vem sendo investigado desde o início de junho, quando o Mapa suspendeu cautelarmente a comercialização da ração da empresa Forrage Horse, após relatos de mortes de cavalos e indícios de contaminação. Com a evolução das investigações e o crescimento do número de notificações, a suspensão foi ampliada para todas as rações destinadas a equídeos fabricadas a partir de 22/11/2024, devido a falhas graves de rastreabilidade, uso de ingredientes não autorizados e risco sanitário generalizado.

Após resultados laboratoriais confirmarem a presença de monocrotalina, toxina presente em alcaloides pirrolizidínicos, o Mapa proibiu todos os produtos da Nutratta, de todas as espécies, por risco grave à saúde animal. Ainda de acordo com o texto oficial, “durante as inspeções foram constatadas irregularidades que motivaram a suspensão cautelar da atividade de fabricação de todas as rações da empresa”.

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Posição da Nutratta

Em nota publicada no site no início de junho, a empresa Nutratta lamentou as mortes e citou a interdição feita pelo Ministério da Agricultura, “por meio de termo de suspensão cautelar de fabricação, como parte dos procedimentos de fiscalização em curso”. E finalizou dizendo que, “com base nas amostras sob responsabilidade dos laboratórios oficiais, será possível alcançar, em breve, uma conclusão clara e embasada”. Procurada pela reportagem, a empresa não deu retorno. Nenhum novo posicionamento foi emitido.

Haras atribui morte de 69 cavalos à ração contaminada

O haras Nova Alcateia, um dos principais criatórios da raça Mangalarga Marchador no Brasil, perdeu 69 cavalos. Entre eles, o garanhão Quantum de Alcateia, avaliado em cerca de R$ 12 milhões (fora lucros de quase R$ 30 milhões em 10 anos). 

“Eles estão de luto. É um haras que completa 50 anos neste ano e tem uma genética incomparável”, disse a advogada. Segundo ela, o prejuízo financeiro da empresa familiar pode superar facilmente os R$ 30 milhões.

Em um comunicado divulgado nesta segunda-feira, 7, no perfil de uma rede social, o haras responsabiliza a ração da empresa Nutratta Nutrição Animal Ltda. pela morte dos animais. Os laudos preliminares nas amostras da ração consumida realizados por  laboratórios federais de defesa agropecuária detectaram “a presença de alcaloides pirrozilidínicos (monocrotalina) em concentrações capazes de causar doença e mortes em equídeos e outras espécies”, disse a nota do criatório. 

“Desde os primeiros indícios […] todas as medidas sanitárias e veterinárias foram tomadas no sentido de minorar as perdas”, afirma o texto, acrescentando que os sintomas evoluíram de forma tão agressiva que “tentar sanar suas consequências fatais não vem tendo efeito prático”.

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Prejuízos incalculáveis

Outro caso é do criador Roberto Barros, de Caçapava (SP), que há 21 anos trabalha com o melhoramento de raças. Dos 18 animais da propriedade, oito faleceram e dez estão em tratamento. Todos apresentaram alterações hepáticas e neurológicas. Todos consumiam a ração Nutratta desde novembro. “Em 15 de maio, uma potra nossa teve uma convulsão. O veterinário foi ao local, mas quando chegou, ela já tinha morrido”, lembra.

No dia seguinte, o veterinário voltou à propriedade e colheu amostras de outros três animais(confira as fotos), até então, assintomáticos. Todos tinham alterações hepáticas. “Uma semana sim, outra não, vem morrendo animais”. Segundo ele, os primeiros sintomas percebidos são apatia, letargia e falta de apetite. “Depois, ficam de cabeça baixa, aí você já vê que tem quadro neurológico. A partir daí, eles começam a se debater, bater em cerca, eles se machucam muito”, relata.

Em Caçapava (SP), o criador Roberto Barros perdeu oito animais. Todos eram selecionados geneticamente e participavam de exposições | Imagens: Arquivo Pessoal

Além dos impactos emocionais, no que diz respeito às perdas financeiras, o prejuízo é estimado em R$ 500 mil, sem lucros cessantes. Um dos garanhões doentes vale outros R$ 500 mil. “Agora, se for olhar os 21 anos de seleção genética, tudo o que a gente investiu, o que gastamos para criar esses animais, os cuidados, nossa, não dá pra dimensionar”, lamenta Roberto. 

Justiça autoriza a continuidade da produção da empresa

Nesta segunda-feira, 7, o juiz federal Francisco Vieira Neto, do TRF 01, deferiu parcialmente o pedido de liminar apresentado pela Nutratta Nutrição Animal Ltda, autorizando a empresa a retomar a produção e a comercialização de rações que não sejam destinadas a equinos. A medida contraria a decisão do Mapa, que determinava a suspensão total das rações fabricadas pela empresa.

Quando a ação foi impetrada pela empresa, o ministério da Agricultura justificou fazendo a relação entre o consumo das rações e a morte de cavalos, falhas sanitárias persistentes, risco de contaminação cruzada e descumprimento de correções desde 2023.  “A suspensão de todas as atividades de fabricação do estabelecimento busca evitar a fabricação de novos produtos destinados à alimentação animal contaminados, sendo todas elas ações voltadas a mitigar os riscos inerentes à fabricação de tais produtos, mas que foram, ao longo dos anos, negligenciadas pela impetrante.”

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Ação coletiva e responsabilização

Ainda não há uma ação coletiva aberta sobre as mortes de cavalos ligadas à ração da empresa. Segundo a advogada Alessandra Agarussi, esse tipo de ação só pode ser proposto por órgãos como o Ministério Público ou associações voltadas à defesa dos animais. Por enquanto, os processos em andamento são ações individuais movidas por tutores afetados. “Minha expectativa é que seja investigada por crime contra o consumidor e crime ambiental. Houve dolo. Eles sabiam da contaminação e não fizeram recall”, explica.

No grupo, alguns proprietários disseram que, no início, a empresa dava retorno, falava sobre indenizações, mas com a ampliação de casos, parou de responder. “Ela sabia e silenciou. Não recolheu os produtos, não avisou os criadores”, disse Alessandra.

Como denunciar : O Mapa orienta que quaisquer informações ou denúncias relacionadas ao caso sejam encaminhadas por meio da Ouvidoria, no endereço: https://www.gov.br/ouvidorias/pt-br

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