apresenta
PUBLICIDADE

Inovação

Agricultura espacial: como tomates marcianos e batata-doce na Lua podem ajudar na produção mundial de alimentos

Brasileira é destaque com estudo que cultivou tomates em solo de Marte; pesquisadores buscam recursos para projeto sobre agricultura espacial 

7 minutos de leitura 12/09/2024 - 08:00

Nome Colunistas

Fernanda Farias | Porto Alegre | fernanda.farias@estadao.com

Espécies foram plantadas em vasos com diferentes solos. Foto: Rebeca Gonçalves/Arquivo Pessoal
Espécies foram plantadas em vasos com diferentes solos. Foto: Rebeca Gonçalves/Arquivo Pessoal

O espaço sideral, Marte, a Lua e a agricultura aqui na Terra estão mais ligados do que os seres humanos comuns imaginam. A agricultura espacial é um dos projetos da Agência Espacial dos Estados Unidos (NASA) do qual o Brasil faz parte, por meio do acordo de Artemis – que visa explorar com objetivos pacíficos e com a instalação de bases por longos períodos. 

Desde que o Brasil tornou-se um dos 43 países signatários do acordo, em 2021, pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e de diversas organizações, instituições de pesquisas e universidades estão engajados com os estudos para produzir alimentos no espaço. 

Assim como milhares de tecnologias espaciais que são usadas no dia a dia na Terra (uma ferramenta sem fio ou o termômetro infravermelho usado durante a pandemia), as tecnologias de plantio no espaço para fornecer alimentos aos astronautas também podem ser aplicadas aqui. 

“O mais importante é que sejam mais eficientes no uso de água e energia, porque são fatores importantes e caros no espaço e aqui na Terra também”, afirma ao Agro Estadão a pesquisadora da Embrapa Pecuária Sudeste, Alessandra Fávero, que também é coordenadora da Rede Space Farming Brazil, que reúne as instituições de pesquisa.

Em julho, foi assinado o acordo de cooperação técnica entre a Embrapa e a Agência Espacial Brasileira (AEB) e, agora, a fase é de busca de recursos para a pesquisa que deve durar cinco anos.  

PUBLICIDADE

“A ideia é que o governo federal entre com alguma coisa [de recursos], estamos tentando também agências de fomento estaduais. Atualmente, imaginamos que sejam necessários entre R$ 10 milhões e R$ 20 milhões, mas a rede vai crescendo”, conta a pesquisadora.

Alimentos escolhidos para o cultivo no espaço: batata-doce e grão-de-bico 

A coordenadora da pesquisa conta que os dois alimentos escolhidos para os testes levaram em consideração critérios técnicos, genéticos e de produção, além do valor nutritivo. 

A batata-doce produz raízes ricas em carboidratos, que é uma base alimentar, e cujas folhas são ricas em proteínas e fibras e podem servir como salada. Além disso, a espécie roxa tem o antioxidante antocianina, que protege da radiação a planta e quem a consome. “Praticamente não tem resíduos e a batata-doce é rústica, bem tolerante à pouca água”, explica Fávero. 

O grão-de-bico é rico em triptofano, que é um precursor da serotonina, e tem proteína. “A gente acaba fazendo aquela dobradinha do arroz e feijão, carboidrato e proteína, com a batata e o grão-de-bico. E ele é extremamente versátil, o que em situação de astronautas de diversos países, é interessante porque é um alimento que agrada a todos”, comenta a pesquisadora. 

Como as descobertas com agricultura espacial podem ser aplicadas na Terra 

agricultura espacial
Fazenda vertical implementada pela Embrapa em São Paulo. Foto: Lilian Alves

A coordenadora da Rede Space Farming Brazil conta que as pesquisas para cultivo no espaço são feitas em ambientes totalmente fechados. Essa situação de ambiente fechado é encontrada na Terra nas fazendas verticais, sendo que a maior delas está em Dubai, que é um lugar desértico. 

PUBLICIDADE

O método a ser usado na pesquisa é a “aeroponia”, quando as raízes da planta ficam no ar e a água é injetada nas raízes. “Você economiza 95% de água em relação ao cultivo comum. E a água é usada, é reciclada e usada novamente. A ideia é fazer um sistema biosustentável”, conta Fávero.

“Se conseguirmos produzir alimentos em situações desafiadoras, conseguimos por exemplo no nordeste brasileiro, onde há locais em desertificação;  em locais passíveis de alagamento; ou onde se queira proteger a vegetação”, explica a pesquisadora.  

O que os tomates marcianos ensinam sobre produtividade e recuperação do solo?

A coordenadora da Rede diz que, a médio e longo prazo, as pesquisas também poderão ser feitas com regolitos – o solo desenvolvido pela NASA a partir de características do solo de Marte, ou seja, compacto e sem nutrientes. 

Essa etapa iria utilizar dados de uma pesquisa inédita feita por uma das integrantes da Rede para o curso de mestrado na Wageningen University, na Holanda. A astrobióloga brasileira Rebeca Gonçalves é a primeira pessoa do mundo a aplicar o método de policultura no âmbito da agricultura espacial

Ela cultivou tomates, ervilhas e cenouras no solo marciano – ou melhor no regolito. “Simulamos o mínimo do mínimo e uma condição de déficit hídrico”, conta Rebeca Gonçalves ao Agro Estadão. 

PUBLICIDADE

A pesquisadora explica que, para iniciar o cultivo, o solo recebeu uma solução de nutrientes (NPK): nitrogênio, fósforo e potássio. “Essa mistura de macronutrientes era aplicada uma vez por semana e, diariamente, eram adicionados 200 ml de água. Além disso, foi introduzida uma única vez a bactéria rhisobia”, explica. 

Em uma mesa de seis metros foram plantados cinco grupos, com diferentes combinações entre as espécies e formas de cultivo, com uma única cultura ou mais. Três tipos de solos foram testados: areia, orgânico terrestre e o solo de Marte (regolito).

“Uma das principais conclusões foi que os tomates amadureceram mais cedo no solo marciano e renderam duas vezes mais quando produzidos em policultura, ou seja, com cenouras e ervilhas”, conta a especialista. 

Segundo ela, tomate e ervilha produziram mais na areia em policultura; no solo orgânico terrestre, as ervilhas se destacaram; enquanto a cenoura não gostou de nenhum solo na policultura. “Elas são uma espécie mais fraca em termos de competitividade [de nutrientes com outras plantas], resume Gonçalves. 

A escolha dos alimentos e como eles se desenvolveram na agricultura espacial

Cenoura, ervilha e tomate  estão em uma lista feita pela Nasa que especifica as 30 espécies possíveis para serem cultivadas em Marte, no caso de uma colonização do planeta. A escolha dos três para o experimento não foi por acaso, mas sim, levou em conta as características biológicas de cada um para que a policultura se desenvolvesse. 

PUBLICIDADE

A ervilha, em combinação com a bactéria rhisobia, serve para fixar o nitrogênio no solo.  A pesquisadora explica que a ervilha dá comida para a bactéria se desenvolver e fornecer o nitrogênio. O tomate tem uma substância na raiz que ajuda a bactéria da ervilha a se proliferar e também faz sombra na cenoura, que serve para deixar mais oxigênio entrar dentro do solo, por ser uma raiz. 

“É quase como se a ervilha produzisse o fertilizante do sistema”, afirma a especialista. Além disso, as três espécies juntas alimentam o solo ao morrerem com os nutrientes necessários para os próximos cultivos.  

Conclusões da pesquisa com solo marciano

O cultivo foi realizado em um ambiente controlado de temperatura, gases, oxigênio e gás carbônico, a exemplo de como seria em Marte, já que o planeta tem baixas temperaturas (-65ºC).

Além de conseguir produzir alimentos em um ambiente que recria as condições de Marte, a pesquisa mostra que é possível recuperar áreas agrícolas degradadas por mudanças climáticas. Isso porque com o manejo adequado, o solo marciano infértil acabou se tornando produtivo. Gonçalves salienta que o custo é quase zero, já que os macronutrientes usados são comuns e de fácil acesso. 

O objetivo final, segundo a astrobiólogia, foi alcançado. O estudo formou um sistema bioregenerativo, fechado, autossuficiente e autosustentável. “Isso pode ser aplicado em comunidades rurais e ajudar no combate à fome e à insegurança alimentar. Pode ser aplicado em parques, no meio urbano e economizar no transporte, que conta com 6% da pegada de carbono no mundo”, conclui.

Siga o Agro Estadão no Google News e fique bem informado sobre as notícias do campo.

PUBLICIDADE

Notícias Relacionadas

Inovação

Com cerca de 3 mil testes por mês, UPF é a maior testadora de sêmen suíno no Brasil

Com cerca de 3 mil testes por mês, UPF é a maior testadora de sêmen suíno no Brasil

Laboratório de sanidade faz análise de 45% dos sêmens suínos vendidos no mercado nacional

Inovação

Entenda como implementar um manejo de irrigação eficiente e as novidades do setor

Entenda como implementar um manejo de irrigação eficiente e as novidades do setor

A inovação e a implementação correta de sistemas de irrigação permitem que os agricultores economizem recursos e aumentem a produtividade

Inovação

Pesquisa lista mais de mil bactérias com potencial de uso como bioinsumos no setor florestal

Pesquisa lista mais de mil bactérias com potencial de uso como bioinsumos no setor florestal

Produto inoculante com base em dois grupos de microrganismos está na fase final de testes

Inovação

Inteligência artificial é usada pela primeira vez para produzir vinho 

Inteligência artificial é usada pela primeira vez para produzir vinho 

Como um “degustador virtual”, sistema analisou mais de 10 mil combinações para formular a receita do primeiro blend da vinícola Casa Tertúlia, no Rio Grande do Sul

PUBLICIDADE

Pesquisa indica tendências para pecuaristas de confinamento de gado

Estudo foi feito com mais de 2 milhões de animais do Brasil, Paraguai e Bolívia

Arroz gourmet: saiba como o clima influencia na produção de arroz no litoral gaúcho

Cultivado entre oceano e lagoa, arroz é o único com Denominação de Origem no País e aumenta a lucratividade do produtor 

Contra a seca: startup aposta em produtos à base da biodiversidade brasileira 

Em fase de desenvolvimento, biológicos de nova geração devem ser lançados em até 5 anos; expectativa é de maior resistência à seca e melhor produtividade

Empresa desenvolve tecnologia de pesagem de bovinos com inteligência artificial 

Nova ferramenta é capaz de estimar peso do animal enquanto ainda está no pasto

Logo Agro Estadão
Bom Dia Agro
X
Carregando...

Seu e-mail foi cadastrado!

Agora complete as informações para personalizar sua newsletter e recebê-la também em seu Whatsapp

Sua função
Tipo de cultura

Bem-vindo (a) ao Bom dia, Agro!

Tudo certo. Estamos preparados para oferecer uma experiência ainda mais personalizada e relevante para você.

Mantenha-se conectado!

Fique atento ao seu e-mail e Whatsapp para atualizações. Estamos ansiosos para ser parte do seu dia a dia no campo!

Enviamos um e-mail de boas-vindas para você! Se não o encontrar na sua caixa de entrada, por favor, verifique a pasta de Spam (lixo eletrônico) e marque a mensagem como ‘Não é spam” para garantir que você receberá os próximos e-mails corretamente.