Economia
Safra de soja 25/26 começa em MT com incertezas do La Niña
Com custos em alta, crédito restrito e produtividade ameaçada pelo clima, Aprosoja-MT e Imea projetam safra menor nesta temporada
 
                        Paloma Santos | Brasília | paloma.santos@estadao.com
08/09/2025 - 06:30

No município de Querência, no leste de Mato Grosso, o produtor Lauri Pedro Jantsch está pronto para iniciar o plantio da safra de soja 2025/2026. Conforme o calendário de semeadura do Ministério da Agricultura, a abertura oficial do plantio no Estado maior produtor do grão no País, ocorreu neste domingo, dia 7. Mesmo assim, diante da expectativa de um ano de La Niña, Jantsch pretende lançar as sementes somente após o dia 20, quando devem retornar as chuvas. “Aqui, o La Niña costuma trazer boas precipitações. A previsão é de uma colheita positiva”, afirmou.
A previsão de La Niña trouxe outras perspectivas para a safra 2025/2026. O fenômeno climático, que ocorre quando as águas do Oceano Pacífico ficam mais frias que o normal, alteram os ventos e o regime de chuvas. O presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT), Lucas Costa Beber, explica que o La Niña tende a afetar de forma distinta as regiões do País. “Quanto mais ao Norte, maior a chance de chuvas acima da média. No Sul, a previsão é de precipitações abaixo do normal. Mato Grosso, que está no centro, deve enfrentar irregularidade: momentos de muita chuva intercalados com estiagens”.
Segundo ele, essa alternância pode reduzir o potencial produtivo da soja. “Está previsto um regime irregular de chuvas em Mato Grosso. E períodos de excesso e falta de chuva representam maior desafio para a lavoura”, afirma.
Por isso, para o presidente Aprosoja-MT, repetir o desempenho da última safra é improvável. “Dificilmente nós vamos chegar num ano de produtividade como o atual, que realmente surpreendeu tanto no milho quanto na soja”, disse Beber à reportagem do Agro Estadão.
Os números do Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea) confirmam essa previsão. A expectativa é de queda na produção da oleaginosa, de 50,4 milhões para 47 milhões de toneladas nesta temporada, mesmo com a previsão de aumento na área plantada.
Beber acrescenta que, além da soja, o milho também pode ser impactado, já que o atraso ou a concentração das chuvas compromete a janela ideal de plantio da segunda safra, que responde por grande parte da produção nacional. “É difícil repetir um clima tão bom como foi este ano. Não é impossível, mas as probabilidades são pequenas. Essa variabilidade representa o maior desafio da próxima safra”, disse.
Custos elevados e crédito escasso
Além do clima, produtores nesta safra enfrentam altas nos custos de produção — ligada à dependência do Brasil de insumos importados. “Praticamente 40% dos fertilizantes usados no Brasil vêm da Rússia. Com as tensões internacionais, há risco de sanções que podem encarecer ainda mais os insumos”, informou o presidente da Aprosoja-MT. Ele acrescenta que o diesel, essencial para máquinas e transporte, também segue pressionado pelas importações.
Além disso, o crédito agrícola está mais restrito. “O acesso diminuiu por conta da taxa Selic alta. Alguns produtores estão sem crédito”, disse. Segundo ele, regiões pioneiras, como Vale do Araguaia e extremo norte do Estado, sentem mais dificuldade, já que investiram em novas áreas quando os preços das commodities eram maiores.
Os preços da soja caíram bastante em relação aos anos de pandemia, quando passaram de R$ 160 a R$ 180/saca. Hoje, mesmo com leve melhora em relação a 2024, ainda estão em patamar preocupante, abaixo de R$ 110 a saca.
De acordo com dirigente, o milho tem ajudado a sustentar a renda das propriedades. “Esperávamos preços mais baixos, mas o mercado se manteve um pouco acima do previsto. Ainda assim, não é suficiente para compensar totalmente a queda da soja.”
Gargalo na armazenagem
Outro desafio é a falta de espaço para estocar a produção. “No Brasil, armazenamos menos de dois terços do que produzimos. Em Mato Grosso, que responde por quase um terço da produção nacional, a capacidade atende a apenas 50% da safra. E menos da metade disso está nas mãos dos produtores”, afirmou Beber.
Segundo ele, a carência de silos obriga muitos agricultores a vender parte da produção logo após a colheita, em períodos de preços mais baixos, reduzindo a margem de lucro.
Alternativas para a segunda safra
Na última temporada, o Mato Grosso semeou cerca de 12,6 milhões de hectares de soja e 7,2 milhões de milho de segunda safra. Mas a pressão de custos e problemas fitossanitários já levam agricultores a considerar alternativas.
“O milho enfrenta a quebra de resistência de biotecnologias contra lagartas, o que aumenta o uso de inseticidas. Isso abre espaço para outras culturas, como o sorgo, que é mais tolerante à seca e pode substituir parte do milho na ração animal”, disse Beber. O gergelim e o feijão também aparecem como opções, embora ainda enfrentem problemas de preço e de mercado.
Para os produtores, de acordo com o presidente da Aprosoja-MT, a palavra de ordem é prudência. “Cautela, buscar informação e caprichar no que está ao alcance. Produzir bem feito e manter o otimismo sempre”, resumiu.

Otimismo no campo
Com todos esses fatores, o produtor Lauri Pedro Jantsch de Querência não esconde a preocupação, mas aposta em uma área de plantio maior nesta safra, que deve crescer de 4.930 para 5.400 hectares. “O desafio é o mercado. Estados Unidos e Brasil devem colher safras grandes, e isso pressiona os preços. Além disso, trabalhamos com crédito caro. Em real, o financiamento chegou a 28% ao ano”, disse.
Na Fazenda Jantsch, o impacto dos insumos pesa no orçamento. O fósforo, um dos principais fertilizantes, passou a custar entre 13 e 15 sacas de soja por hectare, contra a média histórica de 10. O custo operacional, que em 2021 era de 7 sacas, hoje alcança 17. “É uma conta que vem lá de trás, quando a soja valia R$ 180. Os preços caíram, mas os custos continuam subindo com salários, insumos e manutenção”, explicou.
Na última safra, a propriedade alcançou produtividade de 65 sacas por hectare, mas o produtor admite que o resultado pode não se repetir. “Tivemos problemas de excesso de chuva e pouca luminosidade em algumas áreas. Isso afetou o ciclo da planta”, contou.
Apesar das dificuldades, Jantsch deixa uma mensagem de otimismo aos colegas produtores: “que todos tenham tempo estável, boa colheita e atenção aos custos. Estamos num ciclo de preços baixos, mas acreditamos que a rentabilidade vai melhorar”.
 
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