Economia
Cumaru: o que é, usos e como plantar a baunilha brasileira
Cumaru faz sucesso na indústria de cosméticos e na culinária

Daumildo Júnior | daumildo.junior@estadao.com
24/06/2024 - 08:00

Tem cheiro de baunilha, gosto de baunilha, mas não é baunilha. Essa é uma definição rápida do cumaru, semente amazônica que chega a ser comercializada por R$ 200 o quilo.
Quem conta mais detalhes sobre o cumaru é o especialista e pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Amazônia Oriental, José Urano de Carvalho. Ele explica o que é, os usos, os benefícios e dá dicas de como cultivar.
O que é o cumaru?
O cumaru é a semente do cumaruzeiro, árvore que pertence à família Fabaceae. É uma planta nativa do Brasil, mais especificamente da região Amazônica, mas também pode ser encontrada em outros países como Guiana, Suriname, Colômbia, Peru e Venezuela. No Brasil, os estados com ocorrência são Amazonas, Amapá, Pará, Roraima, Rondônia, Acre, Mato Grosso e Maranhão.
O cumaru ganhou fama por ter aroma e gosto semelhantes à baunilha. Por isso, também é chamada de baunilha brasileira. Mas ela ainda pode ser conhecida como fava tonka– nomenclatura da época do Brasil colônia – e tonka bean (feijão tonka) ou, simplesmente, tonka.

Na fase adulta, a árvore tem porte médio entre 20 e 30 metros de altura, além de 50 a 70 centímetros de diâmetro no tronco. O fruto tem casca lenhosa, pesa cerca de 20 gramas e cada fruto tem uma semente. Para extrair o cumaru é necessário romper esse fruto, que é resistente. A semente tem um peso médio de duas gramas. Quando fresca, tem um aspecto liso e amarronzado, depois de seca, ela fica com rugas e coloração tendendo ao preto.
Além da sua ocorrência nos estados da Amazônia Legal, o cumaru também tem sido encontrado em áreas de Cerrado, indicando uma adaptabilidade maior do que se pensava inicialmente.
Para que serve o cumaru?
O especialista na planta conta que a difusão do uso na culinária como substituto da baunilha é recente. Mesmo pequena e com peso muito leve, uma semente é capaz de aromatizar entre 10 a 15 pudins, cita José Urano de Carvalho.
“Chefes de cozinha de renomados restaurantes têm usado o cumaru como aromatizante de alguns pratos. Aqui mesmo, no Pará, tem empresas que fabricam chocolates artesanais utilizando o cumaru. Tem até cerveja artesanal”, revela.
Para utilizar o cumaru nas comidas, é preciso que a semente esteja seca. Além disso, a quantidade deve ser muito baixa. Como exemplo, o Urano diz que se usa cumaru como se usa a noz moscada, ou seja, ralada e em pouca medida.
Além dessa finalidade, o cumaru também é utilizado na indústria de perfumaria e de sabonetes. O óleo extraído da semente chega a ser cotado entre R$ 1.500 a R$ 2.000 por litro. Cada semente produz de 38% a 43% de óleo, ou seja, são necessárias muitas sementes para um litro.
Curiosidade: José Urano também revela um uso pouco conhecido do cumaru. No século XX, a semente foi utilizada como aromatizante de tabaco e charutos.
É importante ressaltar que a utilização do cumaru na gastronomia moderna vai além de aromatizante. Chefs têm explorado técnicas de infusão e extração para criar licores, sorvetes e outras sobremesas sofisticadas. Na indústria cosmética, além de sabonetes, o óleo de cumaru é utilizado em cremes hidratantes e produtos para cabelo, devido às suas propriedades antioxidantes e emolientes.
Benefícios do cumaru
O cumaru tem uma substância chamada cumarina. Essa propriedade química é uma das responsáveis pelo aroma que lembra a baunilha. Também por causa dela, o cumaru tem alguns benefícios medicinais, pois a substância tem efeitos anticoagulantes.
No entanto, é preciso tomar cuidado com o consumo do cumaru. Não é recomendado mastigar ou mesmo ingerir uma semente inteira de cumaru de uma só vez. Em altas concentrações, a cumarina pode causar problemas à saúde, por isso, é importante utilizar como um incremento, um aromatizante.
Para comparação, Urano cita a canela, que também possui cumarina, no entanto, em níveis muito baixos. No cumaru, chega a 4% de toda a semente, o que é considerado muito elevado.

Usos da árvore de cumaru
A madeira do cumaruzeiro também tem valor comercial importante, pois é de boa qualidade. De acordo com Urano, cerca de 380 mil metros quadrados de madeira foram exploradas só no estado do Pará nos últimos dez anos, o equivalente a 95 mil árvores. “Teoricamente, essa madeira veio de sistema de manejo sustentável”, afirma.
O pesquisador explica que a madeira é pesada, isso quer dizer que tem uma densidade alta, de 1,08 gramas por centímetro cúbico (cerca de 12% de teor de água), informa Urano. Além disso, ela tem mais resistência a ataques de fungos e insetos, o que aumenta a validade nas aplicações. Pode ser usada em móveis, na construção civil, na fabricação de barcos e de carrocerias de caminhões.
A madeira de cumaru, devido à sua alta densidade e resistência, tem ganhado espaço em projetos de construção civil que buscam certificações de sustentabilidade. Além dos usos já citados, ela é empregada na fabricação de decks, pisos e revestimentos, tanto em áreas internas quanto externas.
A exploração sustentável da madeira de cumaru, com manejo florestal adequado, é fundamental para garantir a conservação da espécie e a manutenção dos serviços ecossistêmicos que ela proporciona.
Como produzir cumaru?
Atualmente, o cumaru não tem plantios em larga escala. Em geral, os cultivos mais desenvolvidos acontecem em manejo agroflorestal, porém a maior parte das sementes vem do extrativismo. Segundo o pesquisador, o IBGE registra uma extração anual abaixo de 150 toneladas, valor que pode estar subestimado na opinião dele.
Isso porque a busca pelo cumaru vem crescendo, motivado pela valorização da semente. Há quatro anos, o quilo era negociado entre R$ 30 e R$ 40 e, atualmente, chega a R$ 200. Além disso, as plantas com ocorrência natural no meio ambiente são muito dispersas e é “muito raro” encontrar um local na natureza com dez pés de cumaruzeiros próximos uns dos outros.
Escolha do sistema
Antes de começar um cultivo, é necessário escolher um sistema, explica o pesquisador da Embrapa. Se for um plantio de apenas cumaru e para exploração de semente, o espaçamento entre uma árvore e outra precisa ser de 10 metros, no mínimo. Se o objetivo for exploração de madeira o espaçamento pode ser menor, de 5 a 3 metros.
Porém, José Urano de Carvalho revela que essa forma não é muito comum, e o mais usual é plantar em sistema agroflorestal, isto é, uma composição com outras plantas e árvores semelhante ao que se encontra na natureza.
“Eu recomendo nesses sistemas [agroflorestais] que o cumaruzeiro seja plantado num espaçamento de 25 metros entre as linhas e 10 metros dentro das linhas. Aí, entrelinhas planta outras culturas, como cacau, cupuaçu ou qualquer planta que aguente um certo nível de sombra na fase adulta”, orienta Urano.

Mudas de cumaru
Depois é a hora de fazer as mudas ou comprar essas mudas. Diferente de outras culturas, a produção dessas mudas é feita por sementes. O pesquisador também já fez alguns testes produzindo mudas através de enxertia, porém devido a maior facilidade de propagação, as mudas costumam ser feitas com sementes.
A semente costuma germinar em até 20 dias, com taxa de germinação de até 90%. Além disso, é recomendado que a semente não esteja muito seca. Em cerca de oito a doze meses, a muda deve estar pronta.
Também é importante que o interessado na produção de cumaru saiba a planta de origem da muda ou da semente que vai ser plantada. Nem todas as árvores são produtivas, algumas podem produzir 70 quilos de sementes no ano e outras não passam de um quilo.
Plantio do cumaruzeiro
Quanto ao solo, o cumaruzeiro não suporta solos encharcados. É uma planta que ocorre em áreas de terra firme na Amazônia, ou seja, os terrenos que não sofrem inundação nos períodos de cheia.
Além disso, como ela é natural de uma área com solos pobres em vitaminas, especialmente de fósforo, é recomendado fazer adubação orgânica e química antes de plantar. Urano recomenda que seja feita uma avaliação do solo com um agrônomo antes do plantio.
Outro aspecto é a região do Brasil onde será feito o cultivo. Naturalmente, a região Amazônica é a mais aconselhada, porém o pesquisador acredita que talvez, em faixas litorâneas, o cumaruzeiro também consiga prosperar. Além disso, ele é uma planta que não aguenta geadas e para de crescer em ambientes com temperaturas abaixo de 20ºC.
Além da adubação, a correção do pH do solo pode ser necessária para garantir o bom desenvolvimento do cumaruzeiro. O monitoramento regular das plantas, com acompanhamento de um profissional, é importante para identificar e corrigir eventuais deficiências nutricionais ou problemas fitossanitários.
A utilização de técnicas de agricultura de precisão, como o uso de drones e sensores, pode auxiliar no manejo do cultivo e na otimização do uso de recursos.

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