Economia
A tilápia será o novo frango?
Tilápia é a proteína que mais cresce no mundo e, em 20 ou 30 anos, o consumo pode ser equivalente ao de frango, dizem especialistas
Fernanda Farias | Porto Alegre | fernanda.farias@estadao.com
30/09/2024 - 07:30
Uma carne macia e com sabor delicado, que não lembra o peixe de mar nem o de rio. Só isso já ajudou a tilápia a cair no gosto e encher o prato dos brasileiros. A cada três peixes consumidos no Brasil, um é tilápia, de acordo com o IBGE.
Assim como outros pescados, a recomendação dos nutricionistas é inserir na dieta no mínimo duas vezes por semana. A contadora Caroline Berenhauser, de 39 anos, usa a tilápia em dois almoços semanais, em pratos que ela mesma prepara. “Eu não como carne vermelha, e gosto da tilápia porque é leve e saudável. Às vezes faço iscas empanadas, sempre com pouco azeite”, conta ao Agro Estadão.
Além disso, a tilápia é um forte aliado para quem quer ganhar massa magra e perder peso, já que tem poucas calorias e bastante proteína e minerais. A nutricionista e pós-doutoranda do Núcleo de Pesquisas Pescado para Saúde da USP, Jessica Levy, destaca que um filé de tilápia (100 gramas) tem 90 calorias e 18,5 gramas de proteína. A mesma quantidade de alcatra tem 244 kcal e 31,9g de proteína.
“Diversos estudos têm mostrado como o pescado contribui para o desenvolvimento cerebral das crianças, assim como ajuda na memória e reduz a incidência de depressão e risco de Alzheimer. Além disso, diminui o risco de doenças cardiovasculares, que hoje no mundo são as que mais matam”, afirma ao Agro Estadão.
De acordo com a FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), a tilápia é a proteína que mais cresce no mundo – de 2022 para 2023, o avanço foi de 3,1%. No Brasil, representa 65% do cultivo total de peixes, que em 2023 somou 887 mil toneladas e gerou uma receita de R$ 9 bilhões. Segundo a Peixe BR, hoje o Brasil é o quarto maior produtor dessa espécie, com 8% do volume total. Em primeiro lugar está a China, com mais de 30% da produção, seguida da Indonésia e do Egito.
Produção de tilápia cresce apostando na oportunidade de negócios
O presidente da Peixe BR lembra que a tilápia começou a ganhar espaço há cerca de oito anos, quando o setor passou a desenvolver ações para melhoria da produção. “Nos últimos dez anos, a produção cresceu 10,3% ao ano. Nós não temos nenhuma outra proteína animal com esse resultado”, comenta Francisco Medeiros ao Agro Estadão.
Além disso, a tilápia é o produto de pescado brasileiro mais exportado – vai para 48 países. O executivo destaca que a demanda por peixes de cultivo está crescendo no mundo inteiro e, prova disso, é que a tilápia é produzida em 90 países e consumida em 140. Hoje, ela não é apenas um peixe.
“A tilápia é uma commodity e o empresário brasileiro sabe produzir proteína animal commodity. Daí para migrar para a tilápia foi muito fácil. Hoje, os principais produtores de tilápia são os maiores produtores de aves e suínos”, diz Medeiros.
“A tilápia não é produzida por uma pessoa que gosta de peixe. São empresas do agro que investem na tilápia: é um negócio rentável.”
Francisco Medeiros – presidente da Peixe BR
Por isso, ele arrisca dizer que o Brasil deve chegar em 2030 como o segundo maior produtor desse pescado. “Tem todo o ambiente para ser maior que suínos e aves, porque o maior consumo no mundo é de peixe e não de suínos e aves”, argumenta.
Produção fácil e lucrativa
Além de saborosa para o paladar, a tilápia é uma espécie fácil de criar. Basicamente, precisa de água e alimento. “O Brasil tem muita água para fazer isso, tem clima, e tem insumos para fornecer a ração”, resume o pesquisador em genética e melhoramento animal da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Alexandre Caetano.
O especialista aponta que, em algumas regiões, é possível fazer mais de dois ciclos de produção por ano e, além disso, tem baixo custo de produção. Por ser onívora, a espécie não precisa de uma ração com tanta proteína animal como os peixes carnívoros, o que barateia o custo na alimentação.
Caetano conta ainda outra vantagem: “Se deixar machos e fêmeas juntos em um tanque, eles se reproduzem naturalmente. Isso incentiva alguns produtores a se especializarem na produção de alevinos”, explica.
É o caso do Evandro Schmitt, que entrou para o segmento há 26 anos. Ele conta que começou produzindo 18 espécies e, aos poucos, foi focando na tilápia. Atualmente, produz alevinos – filhotes de peixes – que abastecem criatórios em Minas Gerais, São Paulo, Mato Grosso, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina.
“Venho fornecendo 80% a 85% da produção para grandes empresas e faço melhoramento genético próprio”, afirma o produtor de Santa Catarina.
Afinal, a tilápia será o novo frango?
Com a oportunidade que o setor tem de crescimento, a tilápia pode ganhar a preferência dos consumidores pelo frango? Hoje, o consumo de pescado ainda é bem inferior ao de aves no Brasil – a proporção é de 40 kg de aves per capita para 10 kg de peixes per capita.
Metade desse volume de pescado é de tilápia, por isso, o presidente da Peixe BR responde: sim. “Daqui 20 ou 30 anos, provavelmente a tilápia vai competir com o frango”.
O pesquisador da Embrapa concorda que a tilápia pode tornar-se o “novo frango”. Em relação a outros peixes, ela já é a preferida do mercado, por ser um produto fácil de processar e que pode ser entregue ao consumidor fresco ou congelado. Inclusive, ela já virou ingrediente principal de salsichas, embutidos e patês a partir de outra pesquisa da Embrapa.
No entanto, economicamente o frango ainda é mais vantajoso para o produtor. Enquanto as aves têm um ciclo de produção que pode variar entre oito e 12 semanas, a tilápia demora de cinco a seis meses.
“A tilápia tem potencial para ser o novo frango. Mas o melhoramento genético do frango vem acontecendo há muitas décadas. Ainda temos todo um trabalho de melhoramento genético para ser feito na tilápia. A velocidade de crescimento e a eficiência alimentar ainda não chegaram aos patamares do frango”, conclui o pesquisador.
Siga o Agro Estadão no Google News e fique bem informado sobre as notícias do campo.
Siga o Agro Estadão no Google News, WhatsApp, Instagram, Facebook ou assine nossa Newsletter
Newsletter
Acorde
bem informado
com as
notícias do campo
Mais lidas de Economia
1
Saiba como plantar lichia e ter sucesso no cultivo
2
Como é feito o café descafeinado?
3
Confira os principais tipos de pimenta e como cultivar
4
Tripes: como controlar essa praga?
5
Produção de uva-passa: entenda como funciona
6
Como plantar ameixa com sucesso?
PUBLICIDADE
Notícias Relacionadas
Economia
“O alerta está sempre aceso”, diz Luis Rua sobre febre aftosa
Vácuo deixado pela suspensão de importação da carne alemã pode ser oportunidade para mercado brasileiro
Economia
Brasil importou 6,65 milhões de toneladas de trigo em 2024
Importações do cereal seguem firmes, mesmo diante da alta do dólar, aponta Cepea
Economia
Safra 2025 alcançará recorde de 322,6 milhões de t, diz IBGE
Produção estimada é de 29,9 milhões de toneladas a mais de grãos
Economia
Costa Rica abre mercado de feijão comum brasileiro
Essa é a quarta abertura de mercado para produtos agropecuários do Brasil em 2025
Economia
Conab mantém estimativa de safra acima de 322 milhões de toneladas de grãos
Produção de soja deve somar 166,3 milhões de toneladas; trigo é a única cultura com estimativa de recuo
Economia
BNDES financia R$ 499 milhões para Piracanjuba construir fábrica no Paraná
O projeto envolve investimento total de R$ 612 milhões e permitirá a produção de whey protein e lactose em pó, produtos majoritariamente importados
Economia
Brasil não vai adotar diretrizes específicas para surto de gripe aviária em gado leiteiro nos EUA
Mapa já proíbe comercialização de leite de animais infectados pelo vírus da gripe aviária ou de propriedades sob restrição sanitária
Economia
Exportação de couro do Brasil cresce 12,5% em receita em 2024 para US$ 1,26 bi
O volume embarcado cresceu 22,3% em metros quadrados e 38,8% em peso, segundo relatório do Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil (CICB)