Inovação

Mastite bovina: pesquisa aponta benefícios do cajuzinho do cerrado no combate à doença

Casca da planta tem propriedades capazes de “driblar” a resistência da bactéria causadora da mastite bovina

4 minutos de leitura

25/02/2024

Por: Daumildo Júnior | daumildo.junior@estadao.com

Produtor limpando teta para colocar ordenhadeira
Pesquisa demosntra que extrato da casca da planta elimina bactérias da mastite bovina. Foto: Wenderson Araujo/Trilux

Conhecido no sertão brasileiro pelo o sabor azedo, o cajuzinho do cerrado pode ter uma nova função e, desta vez, no combate à mastite bovina. O extrato da casca da planta apresentou resultados capazes de eliminar as colônias bacterianas que causam a doença. O estudo foi conduzido no CEUB (Centro Universitário de Brasília) pelas estudantes de Medicina Veterinária, Ana Paula Sales e Adriana Pujades.

“O cajuzinho foi muito promissor nos testes mostrando até mesmo capacidade de inibição completa das bactérias, enquanto que o antibiótico, nesse mesmo teste, apenas atenuou, ou seja, não conseguiu matar todas as bactérias que estavam ali”, aponta Ana Paula em entrevista ao Agro Estadão

Comparado aos antibióticos, como a cefalexina (utilizado no tratamento da doença), o mecanismo de ação do cajuzinho consegue romper a resistência da bactéria. Adriana indica que essa resistência é causada pelo uso indiscriminado de medicamentos. 

“Muitas vezes os proprietários da fazenda usam por já ser de praxe. Eles identificam a mastite e eles mesmos medicam. Então, a bactéria vai criando resistência”, explica a estudante.

Funciona como a lei da seleção natural. Uma bactéria que não morre no primeiro uso do antibiótico acaba proliferando e o medicamento de antes já não surte efeito. O tratamento complementar, como esse da casca do cajuzinho, atua de forma diferente, pegando de “surpresa” a bactéria resistente. 

“No caso do extrato da casca do cajuzinho do cerrado ele foi capaz de matar, de não deixar nenhuma colônia de bactérias. Ele driblou a resistência das bactérias”, afirma a professora responsável pela orientação da pesquisa, Francislete Melo.

O estudo foi feito com outros extratos de plantas, como do alecrim, da unha-de-gato e da calêndula. No entanto, dessas plantas, apenas o extrato da calêndula teve uma ação eficiente contra as bactérias, sendo que o destaque ficou com a casca do cajuzinho do cerrado.

Extratos utilizados na pesquisa. Foto: Adriana Pujades/Arquivo Pessoal

Outros benefícios do cajuzinho

Além da novidade do efeito combativo sobre as bactérias, o extrato da casca do cajuzinho também tem outras vantagens. Segundo as pesquisadoras, são elas:

  • Baixo custo de produção: a casca da planta já é vendida comercialmente, o que facilitaria em uma produção para uso veterinário;
  • Baixos efeitos colaterais: pesquisas apontam que consequências adversas são poucas com o uso de medicamentos fitoterápicos – produzidos a base de plantas medicinais;
  • Ação antifúngica: além de bactérias, a literatura científica também mostra que a casca do caju tem efeito contra fungos, o que é uma vantagem, já que a mastite pode ser causada por outros microrganismos, como fungos. 
Ana Paula Sales (à esquerda) , Francislete Melo (centro) e Adriana Pujades (à direita).
Foto: Gabriela Carneiro/Arquivo Pessoal

Próximo passo é a aplicação em animais 

A primeira fase da pesquisa foi feita in vitro, ou seja, os testes e resultados são feitos e observados em laboratório, até mesmo para verificar o grau de toxicidade para os bovinos. O passo seguinte é testar em uma grande quantidade de animais que tenham a doença. 

“Esse é o curso normal das pesquisas. A gente faz os experimentos no laboratório, caso eles tenham sucesso é que a gente vai para o animal”, explica a orientadora. Ainda segundo ela, é necessária a permissão de um comitê de ética para só depois iniciar a testagem animal. 

Por se tratar de um projeto de iniciação científica, não há obrigatoriedade da continuação da pesquisa, mas a professora garante que terá sequência. “Pelo menos neste ano vamos continuar. É um projeto que tem uma bioprospecção muito prática. Tem um futuro muito bom. A gente tem que dar uma prioridade e não deixar parar, para sair da universidade e chegar na sociedade. Esse é nosso objetivo”, responde Francislete para a felicidade das estudantes.

Nessa etapa também se observará a melhor forma de aplicação, como esclarece Adriana. “É [uma fase] também para determinar o melhor tipo de apresentação, porque pode ser em pomada, em spray, aerosol. Esse é só o primeiro passo”.

Apesar dos resultados promissores, as pesquisadoras também alertam para que não sejam feitos usos diretos nos animais, já que esses testes não foram executados. A recomendação é procurar ajuda especializada para o tratamento da mastite. “Quando for fazer o tratamento da mastite, consulte um veterinário e faça o tratamento do início ao fim, porque aí reduz a perda de produção e se evita a resistência bacteriana”,  destaca Ana Paula.

Amostras coletadas de bactérias causadoras de mastite bovina. Foto: Adriana Pujades/Arquivo Pessoal

Mastite bovina

De acordo com a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), a mastite é uma inflamação na glândula mamária das vacas, ou seja, nas tetas. Os agentes causadores da doença são diversos, sendo as bactérias as principais. 

É uma doença importante no plantel leiteiro do país, que muitas vezes não é vista a olho nu, mas pode ter um impacto na produção de leite. Segundo a Embrapa, uma redução de três litros de leite por dia em cada animal. 

Alguns autores estimam que o dano na produção anual é de 1,75 bilhões de litros de leite. Mais um agravante para os produtores, que já estão insatisfeitos com o preço do leite. Analisando a partir do valor médio pago em dezembro de 2023, de R$ 1,80, o prejuízo chega na casa dos R$ 3,1 bilhões.

Além da diminuição do leite, a mastite bovina pode acarretar outros problemas para o pecuarista, como perda de qualidade do leite, custo com tratamento veterinário, descarte do animal ou até a morte da vaca. 

Bom Dia Agro
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