Gente
Café Vulcânico transforma sabores e histórias
Combinação de solo rico em minerais, altitude e clima favoráveis confere ao café vulcânico características marcantes e apelo ao mercado internacional

Fernanda Farias* | Poços de Caldas (MG) | fernanda.farias@estadao.com
19/12/2024 - 08:00

Há 80 milhões de anos, um vulcão extinto no Brasil deu origem ao solo rico em minerais que garante um café com características únicas. “O sabor é diferenciado, não tem igual em outro lugar” – defendem os produtores de café vulcânico. Segundo eles, parte do sabor se deve à altitude de cerca de 1.200 metros, sem contar o clima que garante temperaturas entre 17º e 20º C durante o ano todo e média de 1.700 milímetros de chuva. A região Vulcânica fica no sul de Minas Gerais e nordeste de São Paulo e abrange 12 municípios, sendo oito deles, mineiros.
“A acidez é brilhante. É um café cítrico com notas de frutas amarelas”, explica Affonso Junqueira de Souza e Silva, produtor de Poços de Caldas (MG). Criado entre os cafezais, o paulistano tem muitas memórias da época em que ajudava o avô na roça. Demorou, mas já adulto, ele resolveu seguir a produção e passa boa parte do tempo na fazenda, onde quem chega é recepcionado por jabuticabeiras carregadas de frutas e palmeiras tomadas por pássaros.
A Fazenda Matão tem 200 alqueires e 100 mil pés de café. No ano passado, produziu 400 sacas de café especial, além de commodity, e a projeção é otimista. “A nossa meta é produzir 1.500 sacas por ano. Isso deve acontecer na safra 2026/27”, diz Affonso. A espécie plantada é a arábica e, entre as variedades, a grande aposta é o Arara, que surgiu na última década e está em 10 mil pés. Uma das suas vantagens é o período da colheita, que se estende de maio até setembro.
O café da Fazenda Matão ganhou o nome de “Peneira 16”, que se refere à forma de seleção dos frutos do café – só os maiores que ficam na peneira número 16 são usados na produção. A marca leva o selo da Região Vulcânica nas embalagens que são vendidas para Japão, Canadá, China, EUA e países da União Europeia, e que também ocupam gôndolas em mercados gourmet e cafeterias nacionais.
Região Vulcânica
A área com solo vulcânico soma 65,9 mil hectares, onde 12 mil produtores cultivam café. Em média, o resultado chega a 1,5 milhão de sacas por ano. A busca pelo registro de IG tem objetivo de proteger e promover o café da região. Ulisses Ferreira Oliveira, diretor da Associação dos Produtores do Café da Região Vulcânica, destaca o reconhecimento da bebida. “Nos últimos três anos, houve aumento de quatro a cinco pontos na qualidade dos cafés. Hoje o café de 80 pontos é bom, mas não é especial. Temos cafés de 90, 91 pontos”, conta.

O crescimento do setor tem recebido apoio do Sebrae, com capacitação e promoção do produto em feiras e eventos. “Nós mostramos para o produtor que a fazenda dele é um negócio e é preciso tornar a marca conhecida”, conta Rogério Galuppo, analista do Sebrae Agro MG. A maior exposição somada à proteção da marca tem garantido valorização desse café especial. Na última safra, por exemplo, a saca de 60 kg do Arara foi vendida a R$2.200, enquanto o café “comum” foi cotado a R$ 1.500.
Essa valorização é resultado do trabalho que começou há quatro anos, envolvendo toda a cadeia na busca pelo reconhecimento da região Vulcânica. Em outubro deste ano, a associação entrou com pedido de registro de Indicação Geográfica (IG) junto ao INPI (Instituto Nacional de Propriedade Intelectual). O processo foi apoiado pelo Sebrae-MG e o resultado demora cerca de dois anos para ser divulgado.
Aprendendo a dar preço ao café
Outra produtora do café vulcânico é Ilma Rosa Franco, de Campestre (MG). Ela é a quinta geração – as primeiras mudas foram trazidas da Espanha pelo bisavô – e produz café em 68 hectares da fazenda. Das 600 sacas anuais, 120 são de especial. Como principal desafio para a produção, ela cita o clima. Por isso, as lavouras estão cobertas com braquiária, uma planta de cobertura que ajuda a reter a umidade.
Aos 68 anos, com três filhos e dois netos, dona Ilma cumpre um papel essencial na cadeia do café. E em sete anos trabalhando com cafés especiais, virou referência na região. “Eu não estou trabalhando só para mim. Não quero um negócio só para mim. Quero servir de exemplo para os produtores apostarem nos cafés especiais”, confidencia.
Orgulhosa, conta que o investimento no pós-colheita valeu a pena. “Antes, eles davam o preço. Agora não, eu aprendi a precificar o meu produto e dou o valor que ele realmente tem”
*Jornalista viajou a convite do Sebrae-MG.
Siga o Agro Estadão no Google News e fique bem informado sobre as notícias do campo.

Newsletter
Acorde
bem informado
com as
notícias do campo
Mais lidas de Gente
1
Trabalhador morre após acidente na desmontagem da Agrishow 2025
2
Cientista da Embrapa ganha 'Nobel da agricultura'
3
Um ano depois: como o RS se recupera da tragédia da enchente
4
Projetando alta de até 10% nas vendas, setor de flores se prepara para o Dia das Mães
5
MG conquista 3 primeiros lugares no 34º concurso de qualidade da illycaffè
6
Agro Estadão está entre os finalistas do Prêmio + Admirados do Agro

PUBLICIDADE
Notícias Relacionadas

Gente
Estudo mostra retorno de mais de 50% para cada real investido em compra de alimentos da agricultura familiar
Renda nacional teve crescimento de 0,69% com incentivos à agricultura familiar no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)

Gente
Decisão do MEC sobre EaD em Medicina Veterinária preocupa agro
Cadeia produtiva defende que, na pecuária, Medicina Veterinária é essencial para garantia da sanidade dos rebanhos

Gente
Seguro Rural: PR recebe propostas para culturas de inverno
Produtores paranaenses podem solicitar subvenção para plantio de aveia, cevada e trigo; serão disponibilizados R$ 3 milhões em recursos do FDE

Gente
Embrapa seleciona parceiro para comercializar sementes de palma de óleo
Produtores podem se candidatar até 2 de junho para licenciar cultivares da estatal e usar marca “Tecnologia Embrapa”
Gente
Agro Estadão vence em duas categorias do Prêmio + Admirados do Agro
Portal concorreu em diversas categorias, incluindo jornalistas de destaque e veículo referência do setor
Gente
Das cozinhas da Europa às montanhas de Minas: como produtor multiplicou volume de leite em quase 10 vezes
Áureo Cássio de Carvalho saiu de 250 litros diários em 2019 para 2.300, focando em bem-estar animal e sustentabilidade
Gente
Agricultores protestam em Porto Alegre por renegociação de dívidas
O governo federal se comprometeu a encaminhar as medidas, como ampliação do Proagro; Conab anuncia R$ 35 milhões para compra de sementes
Gente
Cientista da Embrapa ganha 'Nobel da agricultura'
Engenheira agrônoma é a primeira mulher do Brasil laureada com o Prêmio Mundial da Alimentação