Economia
Algodão terá biopolímeros como concorrentes e especialista alerta para “novos deuses” do setor têxtil
Consultor da indústria têxtil também afirmou que mundo está vivendo uma época de oportunidades para o algodão brasileiro
3 minutos de leitura 08/09/2024 - 10:09
Daumildo Júnior* | Fortaleza | daumildo.junior@estadao.com
Os biopolímeros ou biofilamentos serão os concorrentes do algodão dentro da indústria têxtil, segundo o consultor de gestão têxtil, Giuseppe Gherzi. O especialista internacional participou do 14º Congresso Brasileiro do Algodão (CBA) e apresentou aos cotonicultores um panorama de como o mercado destinatário da pluma tem mudado.
De acordo com Gherzi, o mundo tem passado por transformações que geram oportunidades para o algodão se posicionar no cenário internacional. Ele classifica essas modificações como os “novos deuses” do setor têxtil. Ao menos três fatores criaram esse cenário favorável de mudança:
- Geopolítica internacional: desde 2005, a China vem se posicionando como uma das grandes fornecedoras de produtos têxteis para os mercados dos Estados Unidos e da Europa. No entanto, os conflitos de interesse entre as nações têm dificultado a entrada desses produtos nesses mercados. Isso abre margem para que outros países possam entrar no mercado;
- Sustentabilidade: a mudança no pensamento de consumo das pessoas também têm obrigado as marcas a reverem os seus fornecedores. Isso causa um efeito em cascata na cadeia, que chega também aos produtores da fibra de algodão;
- Descarte de roupas proibido: o bloco europeu criou uma normativa que proíbe o descarte de roupas até 2030. Segundo o especialista, estimativas iniciais apontam que 6 milhões de toneladas de vestuário deverão ter um novo destino sem ser o lixo direto. Por isso, a cadeia têxtil deve ganhar novas figuras como recicladores e coletores. O destino dessa roupa deve ser virar pano de limpeza, reciclagem mecânica ou química e a revenda.
Na análise de Gherzi, especialmente a parte da regulamentação, deve provocar uma disrupção no setor e, por isso, essa configuração de norma legal deve ser um desses novos regentes da cadeia: “acreditamos que, inicialmente, deve afetar a Europa e depois os Estados Unidos devem adotar regras parecidas, em seguida os demais países virão à reboque”, afirmou.
No entanto, o consultor disse que a cotonicultura precisa se posicionar. De acordo com ele, as mudanças já estão provocando uma corrida das grandes marcas de vestuário em encontrar fibras feitas a partir de fontes renováveis, como é o caso dos biofilamentos.
A corrida é para que haja investimentos também dentro da fibra feita a partir de algodão. “Empresas estão investindo em fibras sustentáveis. […] No mercado de algodão, nós precisamos mostrar para essas marcas que nós somos sustentáveis”, indicou Gherzi.
Hora de “atacar o mercado”
Sobre o Brasil, Gherzi ressaltou que a pujança da produção aliada ao cenário de conflitos geopolíticos cria uma chance para o cotonicultor brasileiro. Por isso, ele recomendou: “vocês têm oportunidade de atacar o mercado agora”.
Já na tratativa a longo prazo, o consultor ponderou alguns pontos que o produtor de algodão deve ficar de olho. Um deles é a questão do preço. Segundo ele, “as marcas querem preços estáveis para o ano todo”, por isso, a estratégia mais adequada seria buscar por essa estabilidade nos valores da pluma.
Ele também alertou para o isolamento que o algodão pode sofrer. Atualmente, cerca de 27% das 125 milhões de toneladas de fibras comercializadas vêm do algodão. No entanto, com os “novos deuses” do setor têxtil, há uma busca por fibras sustentáveis, inclusive fibras recicladas. Como as grandes marcas já estão trabalhando para obter essas formas mais sustentáveis, é importante que os cotonicultores também se mostrem viáveis.
“Se as indústrias têxteis mudarem, isso vai pressionar o mercado de fibras. Esse é o clamor que faço, que vocês entrem em contato com essas indústrias para mostrar o que vocês fazem, para não ficar isolados”, enfatizou. Ele ainda citou o exemplo da seda, que há alguns séculos era a base do vestuário e atualmente é um produto de nicho. “Há muitas oportunidades, mas nós do setor do algodão temos que ser mais proativos junto às marcas”, concluiu.
*Jornalista viajou a Fortaleza (CE) a convite da Abrapa
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