
Tiago Fischer
Engenheiro Agrônomo, professor do Insper e diretor da Stracta Consultoria
Esse texto trata de uma opinião do colunista e não necessariamente reflete a posição do Agro Estadão
Opinião
O perfil do produtor rural 2024 impulsionando a profissionalização das cadeias agropecuárias
Colunista Tiago Fischer debate como os produtores devem estar preparados para as demandas do mercado atual
07/02/2024 - 14:51

Atualmente, muito se discute em meios acadêmicos, técnicos e práticos do agronegócio sobre a introdução de práticas e tecnologias, que possam proporcionar os novos ciclos de evolução para a produção e a gestão das fazendas. O foco é dar um novo passo para o desenvolvimento do agronegócio brasileiro, rumo ao seu papel (em muitos casos já alcançado) de protagonista tanto em volume produzido de commodities agropecuárias, como também na utilização de técnicas, ferramentas e indicadores modernos de produção.
O mantra de “entregar o que o cliente quer” sempre foi a tônica da agenda desenvolvimentista do agro brasileiro, principalmente, após o final da década de 80 e início da década de 90. Tempo em que a real expressividade da produção nacional no cenário internacional começou, de maneira profissional, a mostrar sua cara.
Os desafios dos anos atuais não têm origem diferente! Somos e seremos por muitos anos a máquina propulsora do fornecimento de matérias primas alimentícias para os mais diferentes mercados mundiais em escala e multiplicidade de produtos e cadeias produtivas, o que nos torna imprescindíveis ao crescimento populacional e a elevação do consumo do mundo moderno. Ainda assim, “entregar ao cliente o que ele quer” se mantém mais válido do que nunca e nós, como fornecedores profissionais, devemos, antes de qualquer outra discussão, entender tais demandas e adaptá-las as nossas práticas de produção.
Entregar ao mercado comprador as principais demandas “do passado” como elevação dos índices de produção, melhoria da performance produtiva, elevação na qualidade do produto – desde a origem, atendimento a diferentes agendas de compliance (em principal ao código florestal), entre outros, continuam sendo desafios presentes no dia a dia das fazendas. Contudo, o comprador moderno quer mais. O que coloca o agro brasileiro em cheque novamente.
Atualmente, a produção brasileira é instigada a produzir em novos patamares de gestão e compliance, tendo que acelerar sua curva de aprendizado introduzindo novas tecnologias de produção, de gestão, de impactos (ambientais, sociais, produtivos e de governança), controles de indicadores de produção de ponta a ponta (bem-estar animal, rastreabilidade, métricas de uso e performance talhão a talhão, entre outras). Além de garantir que os volumes e a qualidade se mantenham crescentes.
Na vanguarda do processo de aceleração dessas inovações, as grandes empresas fornecedoras do agro (antes da porteira), assim como as compradoras da produção das fazendas (depois da porteira), em conjunto com o célebre trabalho das universidades e entidades de pesquisa técnica, vêm há décadas promovendo novos patamares de transformação e oferta de tecnologias ao campo. Contudo, o real catalisador dos processos
de introdução tecnológico e desenvolvimento profissional do agro é, sem dúvida, a mudança de perfil do produtor rural brasileiro!
O produtor nacional é um mutante por natureza. Sua capacidade de adaptação às variações climáticas, às novas técnicas de produção, ao aparecimento de novas pragas e doenças e às mudanças de demanda de mercados compradores sempre foram o grande propulsor do posicionamento globalizado da produção brasileira em 2024.
O produtor moderno é uma entidade a ser estudada pelos mais brilhantes sociólogos do nosso mercado. E que, o próprio Agro, conhece muito pouco. É um profissional atingido e questionado por preconcepções de simplicidade, tradicionalismo, preso ao passado e com dificuldades de aprendizado e adaptação às novas tecnologias, mas que, na verdade, é um gestor de um empreendimento complexo sem, na maioria dos casos, ter o mínimo de formação técnica de administração de empresas. É um histórico usuário de tecnologias que faria outros setores da nossa economia reconhecidamente fortes nesse tema, como o automotivo e o financeiro, ficarem com inveja. É um gestor de gestor de pessoas e processos sem formação em engenharia de produção ou mesmo em desenvolvimento humano e faz tudo isso garantindo que o centro do seu negócio, a produção agropecuária, tenha elevações constantes.
Nas últimas duas décadas, prioritariamente, esse perfil vem ganhando tecnicalidade. Com a profissionalização dos negócios de produção ocasionada pelo crescimento das empresas produtivas e suas contratações de profissionais técnicos/ especialistas terceirizados. Além do retorno e/ou manutenção no negócio das novas gerações, que tiveram a oportunidade de estudo que seus pais não tiveram. Tudo isso aliado ao acesso fluido à informação e aprendizado, ocasionados pela transformação tecnológica moderna. Os negócios rurais passaram, então, a evoluir de maneira muito mais acelerada, se transformando, afinal, em um termo muito utilizado pelos estudiosos dos agronegócios desde a década de 1990: “uma indústria a céu aberto”.
Mas estes novos patamares de profissionalização deixam um questionamento para o futuro:
Se o produtor brasileiro, sem formação técnica na maioria dos processos de produção modernos, nos colocou entre os líderes de fornecimento de alimentos em escala global, o que fará essa nova geração de produtores detentores de conhecimentos que vão muito além das técnicas de produção passando por finanças, processos, economia, sustentabilidade, digitalização e outros?

Newsletter
Acorde
bem informado
com as
notícias do campo
Mais lidas de Opinião
1
O campo pede respeito
2
Marcos Fava Neves: 5 pontos para ficar de olho no mercado agro em outubro
3
A vez do EFTA
4
A maturidade do biodiesel nacional na COP 30
5
Política Agrícola e a pedra filosofal
6
45 anos de contribuição do Brasil para uma agricultura sustentável no Cone Sul

PUBLICIDADE
Notícias Relacionadas

Opinião
O campo pede respeito
Aumento de impostos e ineficiência federal ameaçam competitividade e empregos rurais

Tirso Meirelles

Opinião
A maturidade do biodiesel nacional na COP 30
Com impacto direto no agronegócio, biodiesel se consolidou como uma solução mais efetiva de curto prazo para a descarbonização

Francisco Turra

Opinião
Marcos Fava Neves: 5 pontos para ficar de olho no mercado agro em outubro
Início de uma nova safra exige atenção dos produtores ao clima, ao dólar, aos EUA e às oportunidades em novos mercados

Marcos Fava Neves

Opinião
45 anos de contribuição do Brasil para uma agricultura sustentável no Cone Sul
Com a tecnologia de Fixação Biológica de Nitrogênio na soja, o país economiza cerca de U$ 20 bilhões por ano em fertilizantes nitrogenados
Opinião
Política Agrícola e a pedra filosofal
Seguro é tão crédito quanto financiamento, “barter” ou usar recursos próprios. Crédito decorre de confiança baseada em evidências.

José Carlos Vaz
Opinião
A vez do EFTA
Com barreiras tarifárias dos EUA e exigências da União Europeia, Mercosul mostra que ainda pode alcançar tratados modernos de comércio

Welber Barral
Opinião
Geopolítica da carne
México elevou em 198% as compras de carne bovina em 2025 e pode habilitar 14 novos frigoríficos do Brasil

Teresa Vendramini
Opinião
Brasil e Índia: potências agrícolas em busca de cooperação estratégica
Combinação de vantagens abre uma janela de oportunidades para que os dois países aprofundem parcerias comerciais, técnicas e científicas

Celso Moretti