Agropolítica
Neri Geller: leilão foi mal conduzido e houve erro político
Ex-secretário de Política Agrícola diz que Lula foi “mal orientado” sobre o arroz e que leilão teve "egos aguçados"; Neri Geller saiu a poucos dias do Plano Safra 2024/25
5 minutos de leitura 12/06/2024 - 13:30
Por: Letícia Luvison (leticia.flores@estadao.com) e Fernanda Farias (fernanda.farias@estadao.com)
O agora ex-secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Neri Geller, afirmou nesta quarta-feira, 12, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi “mal orientado na questão do arroz” e que o leilão da Conab foi uma “decisão política errada”. A exoneração foi publicada no Diário Oficial da União desta quarta, mas com assinatura do dia 11.
Neri Geller conversou com o Agro Estadão por telefone e disse que não partiu dele a decisão de realizar o leilão para importar 300 mil toneladas do cereal. E detalhou que quando começaram as enchentes no Rio Grande do Sul, houve uma reunião para avaliar a possível falta do produto.
“Nós fizemos uma reunião liderada por técnicos dos Ministérios da Agricultura, da Fazenda, do Planejamento e Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). A Fazenda foi contra o leilão e eu também – “recomendei cautela”, afirmou Geller. “Porque eu sabia que boa parte do arroz havia escapado da enchente, já tinha sido colhida. Assim como eu, a equipe [da Fazenda] sabia”, completou.
Geller se refere à necessidade de importação do arroz após as enchentes no Rio Grande do Sul, estado responsável por 70% da produção nacional. Segundo ele, houve a sugestão de zerar a TEC para os países de fora do Mercosul – que foi seguida, com a qual ele concordou e recomendou um prazo de 30 a 60 dias para avaliar.
Mesmo assim, a decisão do leilão teria partido da Casa Civil, depois que o ministro Carlos Fávaro assumiu a negociação diretamente com o presidente Lula. Geller afirma que não participou de mais reuniões sobre o assunto. “Eu falei várias vezes ao Fávaro sobre a cautela e ele me dizia ‘deixa que eu toco com o Lula’, então na minha avaliação, o presidente foi mal orientado”, analisa Geller.
O ex-secretário de Política Agrícola do Mapa diz que entendeu a preocupação do presidente Lula com o preço do arroz, que é legítimo. Sem citar nomes de quem teria pressionado para que o leilão acontecesse, Geller afirmou que as posições técnicas não foram seguidas. “Infelizmente foi conduzido de forma equivocada, teve egos aguçados no processo”.
Geller diz que não pediu demissão e que esperava conversar com Fávaro
A saída de Neri Geller do cargo foi anunciada pelo ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, logo após reunião no Palácio do Planalto nesta terça-feira, 11. Para jornalistas, Fávaro disse que Geller havia feito o pedido de demissão.
Mas o ex-secretário conta que as conversas sobre a crise começaram entre ele e Fávaro quando ainda estava em Mato Grosso, durante o fim-de-semana. E que quando chegou a Brasília, os dois se encontraram na terça pela manhã.
“Eu disse a ele, estou tranquilo, eu sei que a corretora [BMT – do ex-assessor Robson França] está dando problema, mas estou 100% tranquilo. Vou enfrentar, não vai ter desgaste”, contou Geller ao Agro Estadão. Segundo ele, o combinado era terminarem a conversa à tarde, após a reunião no Planalto, o que acabou não acontecendo.
“Ele me ligou de lá dizendo que a decisão seria pelo meu afastamento. À tarde, eu fui despachar normal, ele não me falou nada. Às 17h, eu recebi o e-mail com a notificação sobre a minha exoneração a pedido, e eu notifiquei, também por email o recebimento, mas solicitando a correção, porque não foi ‘a pedido’. E mandei para todos os envolvidos, até para a Presidência da República” (confira abaixo).
Neri Geller explica a relação do filho com ex-assessor
Assim que a informação sobre a sociedade do filho, Marcelo, e o ex-assessor França, veio à tona, Geller diz que ligou para o filho para entender a situação. E que Marcelo assegurou que a empresa não estava ativa e ele era apenas cotista. Ao Agro Estadão, Marcelo também garantiu que não participou de leilões com a F G Business.
Geller conta que também procurou o ex-assessor. “O Robson me disse: tu não paga mais o meu salário, estou trabalhando com a Bolsa desde o ano passado”. Geller afirma que soube que a bolsa e a corretora de Mato Grosso ainda participaram de outros leilões públicos – inclusive da Conab, e privados desde a criação, em 2023.
Saída do Mapa acontece 15 dias antes do Plano Safra
Neri Geller deixa o governo após quatro meses no comando da Secretaria de Política Agrícola do Mapa e às vésperas do lançamento do Plano Safra 2024/2025, marcado para o dia 26 de junho. Responsável pela elaboração e negociação do plano, Geller apresentou a versão final do documento há 15 dias, durante reunião com os ministros da Agricultura e Fazenda. Segundo o ex-secretário, o volume de recursos deve ser novamente recorde e com taxas de juros que atendem a capacidade de pagamento dos produtores rurais, como adiantou o Agro Estadão.
Geller era considerado o elo do governo Lula com o setor produtivo, inclusive chegou a ser o favorito para a presidência da Conab neste mandato do PT no executivo federal. Isso só não aconteceu porque ele estava inelegível, com o mandato de deputado federal cassado na época.
Mesmo sendo do Partido Progressistas, sempre manteve bom trânsito em governos do Partido dos Trabalhadores – ocupou a mesma Secretaria de Política Agrícola do Mapa no segundo governo do presidente Lula e foi ministro da Agricultura no governo de Dilma Rousseff. Fontes indicam, inclusive, que o Ministério da Agricultura foi pensado para ele antes do nome de Carlos Fávaro surgir – seria uma recomendação da ex-presidente Dilma Rousseff.
Sobre o que fará a partir de agora, Geller é categórico: “vou cuidar da minha vida”. Ao Agro Estadão, revelou que deverá conceder entrevista coletiva em Mato Grosso nesta quinta-feira, 13, e após isso não deve mais falar com a imprensa.
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