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Pesquisadores desenvolvem pesticida natural a partir da cúrcuma

Estudo usou a nanotecnologia para criar cápsula que permite liberação lenta do composto, o que evita efeitos tóxicos ao meio ambiente

Pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp), nos campus de Sorocaba (SP) e Jaboticabal (SP), foram protagonistas de um estudo que resultou no desenvolvimento de um pesticida natural proveniente da curcumina, substância extraída da cúrcuma – conhecida, também, como açafrão-da-terra.

A curcumina é muito usada na medicina, por causa de suas propriedades anticancerígena, anti-inflamatória, antioxidante e antisséptica. Conhecendo essas características, os cientistas a combinaram com o carvacrol – outro produto natural, encontrado em vários tipos de óleos essenciais e que já tinha demonstrado eficácia contra pragas agrícolas.

O desenvolvimento do pesticida foi feito em Sorocaba, enquanto os testes biológicos foram em Jaboticabal – nesse caso, sob gestão do engenheiro agrônomo Ricardo Polanczyk, professor de Entomologia. Ele explica que a praga-alvo em laboratório foi a Helicoverpa armigera, lagarta que causa prejuízos em plantações de soja, milho, feijão, algodão, entre outras, e que não resistiu à aplicação da mistura natural.

O estudo, publicado na Elsevier, uma das principais revistas científicas do mundo, envolveu o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Nanotecnologia para Agricultura Sustentável (INCT NanoAgro), que, há 17 anos, trabalha no desenvolvimento de sistemas nanotecnológicos para as atividades agropecuárias, o Centro de Pesquisa em Dinâmica da Biodiversidade e Mudanças do Clima (CBioClima), o Labiton (Bioactivity Assessment and Toxicology of Nanomaterials Lab) e o Novo Arranjo de Pesquisa e Inovação (NAPI Biodiversidade).

Segundo outro participante da pesquisa, o químico Leonardo Fernandes Fraceto, professor na Unesp Sorocaba, e coordenador do INCT NanoAgro e de Inovação do CBioClima, como as ações da curcumina e do carvacrol são diferentes, a expectativa é que a combinação dos dois seja eficaz para um grande espectro de pragas e também ácaros. E com algumas vantagens: sem qualquer efeito nocivo ao meio ambiente e com benefícios econômicos aos agricultores, que podem receber valores maiores por alimentos sem resíduos químicos.

Nanotecnologia no desenvolvimento do pesticida

Apesar da alta eficácia demonstrada em laboratório, a utilização do pesticida botânico pode ser dificultada pela alta volatilidade, baixas estabilidade e solubilidade em água, além de fragilidade diante da radiação ultravioleta e de temperaturas elevadas, o que pode causar sua degradação rapidamente.

A biotecnologista Estefania Vangelie Ramos Campos, pós-doutoranda na Unesp de Sorocaba, explica que a solução encontrada pelos pesquisadores foi encapsular a curcumina e o carvacrol em uma estrutura nanotecnológica de zeína, proteína do milho que, por ser abundante no Brasil e reprodutível, é de baixo custo, além do que forma nanoestruturas com facilidades e é biodegradável. A cápsula de zeína faz com que a liberação do composto seja gradual, prolongada e, consequentemente, sustentável econômica e ambientalmente.

Cúrcuma foi usada para desenvolver pesticida natural. Foto: Adobe Stock

Pragas x aumento de produção

Um estudo realizado pelas cientistas polonesas Karolina Pawlak e Małgorzata Kołodziejczak projeta que a produção mundial de alimentos deverá aumentar 70% nos próximos 25 anos para dar conta de abastecer uma população de 9,2 bilhões de pessoas. Nesse período, o crescimento médio anual deverá ser de 2,8% ao ano, maior que o ritmo atual do mercado global de alimentos, de 1,93%, e da produção agrícola, de 1,1%.

Entre os maiores desafios para atingir o percentual ideal, estão, justamente, as perdas provocadas pelo ataque de pragas, que, conforme a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), corresponde a 40% – um total de 70 bilhões de dólares anualmente.

Para tentar frear esses números, a principal estratégia adotada no planeta é a utilização de pesticidas químicos. Mas, além das perdas observadas durante as aplicações, que variam de 2% a 25%, eles podem se espalhar para outras regiões, comprometer a saúde e provocar, de acordo com informações coletadas pelos pesquisadores, até 11 mil mortes anuais. “Devido a esse risco e outras razões econômicas, ambientais e de saúde pública, há uma necessidade de uma agricultura mais segura e sustentável com uso mínimo de pesticidas”, afirmam.

Leonardo Fraceto explica que, nesse aspecto, o estudo abre uma gama de possibilidades. “Uma vez que a gente validou a associação de moléculas naturais com nanotecnologia, pode-se trabalhar com novas moléculas, cada vez mais específicas, considerando os alvos que se quer atingir”.

Ele diz, ainda, que o grupo busca, agora, parceiros que permitam aumentar a escala de produção e fazer estudos em campo, sob condições reais. “Há contatos com empresas, startups que estão incubadas, ou seja, um ecossistema muito ativo para colocarmos o produto no mercado”.

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