Inovação
Borbulhante de maracujá-da-caatinga pode abrir novo mercado para agricultores do Semiárido
Semelhante ao vinho, bebida alcoólica gaseificada agrega valor à fruta nativa e estimula cultivo comercial

Paloma Santos | Brasília
12/06/2025 - 08:00

Uma parceria entre a Embrapa Semiárido e a Universidade Federal da Paraíba (UFPB) pode abrir novas oportunidades para agricultores do Semiárido nordestino. Trata-se de um fermentado, tipo bebida gaseificada, elaborada a partir do maracujá-da-caatinga (passiflora cincinnata), que combina características refrescantes com o processo de produção que se assemelha a um espumante. O produto pode agregar valor à fruta nativa, fomentar o cultivo comercial e estimular cadeias produtivas sustentáveis na região.
O maracujá-da-caatinga é uma frutinha pequena, tradicionalmente coletada por extrativistas, comumente usada na produção artesanal de geleias, mousses e sucos. Mas, graças a 12 anos de trabalho do time da Embrapa Semiárido, o espécime foi aprimorado. Ficou maior, mais resistente, produtivo e se tornou a cultivar BRS Sertão Forte, adaptada tanto ao clima da Caatinga quanto ao Cerrado.
“Esse material que a gente desenvolveu tem de três a cinco vezes o tamanho do fruto original, com maior produtividade e resistência à seca e a pragas de solo”, explica Natoniel Franklin de Melo, um dos pesquisadores envolvidos. “Isso permite sair do extrativismo e partir para um cultivo comercial com sementes licenciadas e material padronizado”, complementa
A partir da BRS Sertão Forte, surgiu outra proposta: transformar o fruto em um borbulhante, uma bebida fermentada com gás – uma alternativa aos espumantes de uva, mas com identidade própria. O produto não pode ser chamado legalmente de espumante, pois a legislação brasileira reserva esse termo às bebidas derivadas da uva, mas se aproxima em sabor e apresentação.
O processo de produção da bebida fermentada gaseificada com o maracujá-da-caatinga segue o mesmo método tradicional utilizado para a elaboração de espumantes, conhecido como método champenoise (ou método tradicional). Esse processo envolve duas fermentações: a primeira transforma os açúcares da fruta em álcool, e a segunda — realizada já na garrafa — gera o gás carbônico natural, responsável pela efervescência característica da bebida. “É uma bebida refrescante, com sabor único e muito atrativa”, completa o pesquisador.

Potencial para cooperativas e agroindústrias artesanais
A pesquisadora Aline Biasoto, da Embrapa Meio Ambiente, destaca que o projeto partiu de uma tese de doutorado e envolveu uma metodologia específica para produzir a bebida em escala piloto, utilizando técnicas semelhantes às empregadas na vinicultura.
“O método pode ser facilmente replicado por cooperativas ou agroindústrias de pequeno porte”, explica Aline. “A formulação está disponível para transferência tecnológica, e qualquer grupo interessado pode procurar a Embrapa para iniciar o processo de cooperação.”
Segundo a pesquisadora, a bebida foi pensada não apenas pela inovação sensorial, mas também para atender a consumidores que não estão acostumados com vinhos tradicionais. Além disso, por ser produzida com uma fruta nativa, adaptada ao Semiárido, carrega um apelo de sustentabilidade e identidade regional, o que amplia seu valor agregado e potencial de mercado – inclusive para exportação.
Tecnologia pronta para uso comercial
Atualmente, a tecnologia encontra-se no nível 6 de maturidade tecnológica, o que significa que está em fase piloto e pode evoluir para produção em escala. “É uma oportunidade real para quem atua em regiões com escassez hídrica e busca diversificar a produção com valor de mercado”, avalia Aline.
Para os agricultores interessados, a Embrapa já disponibiliza sementes da cultivar registrada no Ministério da Agricultura. Além disso, cooperativas ou pequenos empresários podem entrar em contato com as unidades da Embrapa Semiárido, Embrapa Meio Ambiente ou com a sede nacional da instituição para firmar parcerias.
Uma nova cadeia produtiva
Na avaliação de Aline, a proposta vai além da criação de uma nova bebida: ela representa uma estratégia de fortalecimento da agricultura familiar e do uso sustentável dos recursos da Caatinga. “O maracujá-da-caatinga cultivado sob manejo adequado pode se tornar fonte de renda recorrente, com menor dependência da coleta extrativista e maior estabilidade para os produtores”, afirma.
Além disso, na avaliação da especialista, com a possibilidade de produção em escala artesanal e apelo gourmet, o fermentado gaseificado de maracujá-da-caatinga tem potencial para inserir o Semiárido nordestino no mapa da inovação em bebidas tropicais — valorizando a biodiversidade local e criando caminhos viáveis para o desenvolvimento rural sustentável.

Newsletter
Acorde
bem informado
com as
notícias do campo
Mais lidas de Inovação
1
Primeiros bezerros geneticamente editados no Brasil
2
Conheça o primeiro trator fabricado no Brasil
3
Digitalização e robôs levam pecuária leiteira de atividade familiar a empresa
4
Embrapa desenvolve solução para deixar plantas e donos felizes
5
Estudo inédito aponta fungo que compromete produção do shimeji
6
Plataforma com IA ajuda na gestão e aumenta ganhos na cadeia do óleo de palma

PUBLICIDADE
Notícias Relacionadas

Inovação
Os robôs já estão fazendo colheitas, saiba mais
Com precisão cirúrgica e inteligência artificial, robôs colhem no ponto ideal de maturação, garantindo produtos de maior qualidade e minimizando desperdícios na lavoura

Inovação
Satélites ajudam a medir pastagens com até 86% de precisão
Nova metodologia da Embrapa estima volume de forragem por imagens e dados climáticos, sem necessidade de ir a campo

Inovação
Já viu o raro milho que parece vidro?
Esta variedade, com seus grãos translúcidos e coloridos, é uma joia agrícola

Inovação
Força-tarefa busca variedades de mandioca resistentes à vassoura-de-bruxa
A Embrapa, em parceria com pesquisadores alemães, analisa material genético para conter avanço do fungo em lavouras do Amapá
Inovação
Plataforma com IA ajuda na gestão e aumenta ganhos na cadeia do óleo de palma
Tecnologia de empresa da Malásia está sendo introduzida no Brasil e traz rastreabilidade da produção
Inovação
Conheça o primeiro trator fabricado no Brasil
Em 1960, o Ford 8-BR marcou o início da mecanização agrícola no Brasil, transformando o campo e impulsionando agricutlura do país
Inovação
Digitalização e robôs levam pecuária leiteira de atividade familiar a empresa
Com produção em 98% dos municípios, Brasil soma 34 bilhões de litros de leite por ano e exige gestão mais eficiente no campo
Inovação
Estudo inédito aponta fungo que compromete produção do shimeji
Fungo do gênero Penicillium é registrado pela primeira vez no País, que enfrenta desafios com a falta de produtos seguros e respaldo técnico para a produção comercial