Metade das 14 mil aves da granja em Anta Gorda morreu em três dias; foco de Newcastle foi considerado finalizado após uma semana
Mais de 80 servidores da Secretaria de Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi) formaram a equipe responsável por livrar o Rio Grande do Sul da emergência zoossanitária em função da doença de Newcastle. O trabalho começou em 18 de julho, um dia após a confirmação do foco no município de Anta Gorda.
O diretor-adjunto do Departamento de Vigilância e Defesa Sanitária Animal da Seapi, Francisco Nunes Lopes, explica que o protocolo sanitário obriga produtores e empresas a notificarem as autoridades sempre que uma mortandade de 10% do plantel acontecer no período de 72 horas.
“Essas coletas de suspeitas são rotina no trabalho. Ou por sinal nervoso ou gatilho de mortalidade. E quando chegou na secretaria, 50% dos animais já haviam morrido”, conta Lopes ao Agro Estadão. Ele completa que ao ser notificado, o Estado tem 12 horas para fazer o primeiro atendimento no local.
Nesse caso, a granja tinha 14 mil aves, e a morte de metade delas em três dias era sinal de que havia algo errado – mas não necessariamente a doença de Newcastle. É que as chuvas e as baixas temperaturas podem provocar a morte de aves, e o clima no estado estava com essas características.
“Elas tinham edema de cabeça e diarreia, principalmente – sem sinal nervoso. O colega teve uma habilidade técnica bem grande, porque com o acumulado das chuvas, a cama das aves estava úmida. E sempre ocorre alguma mortalidade um pouco adicional com o frio”, relata.
Para saber a causa da morte das aves, foi realizada uma coleta de amostras com Swabs, as mesmas hastes usadas para os testes de RCovid-19 durante a pandemia. De acordo com o diretor-adjunto da área de sanidade animal da Seapi, 30 aves tiveram amostras de traqueia e cloaca coletadas e cinco passaram por necropsia para a análise de órgãos.
Os materiais foram enviados ao Laboratório Federal de Defesa Agropecuária (LFDA) de Campinas (SP). De acordo com Francisco Lopes, o vírus foi identificado em parte das amostras. “Não significa que o vírus estava presente em todas as aves”.
Ele afirma que não é possível saber como o vírus da doença de Newcastle surgiu na granja. Mas como é um vírus que ocorre em animais silvestres, pode ter acontecido algum contato direto das aves com pombos infectados ou com fezes.
De acordo com o profissional, a propriedade estava em dia com documentações e processos. “A biossegurança adequada, nós conferimos a questão do telamento, do telhado, tudo adequado. Mas sempre há algum risco”, diz.
Com a suspeita, antes mesmo da coleta das amostras, a granja em Anta Gorda foi bloqueada. A medida é importante para que não aconteçam movimentações de animais até a chegada do resultado das análises.
E assim que o foco foi confirmado, uma operação de guerra começou a ser montada no dia 18 de julho. Cinco barreiras sanitárias foram montadas no raio de até 3 km do foco e outras três no raio de 10 km. Ao mesmo tempo, começaram as visitas em todas as propriedades deste perímetro.
“As barreiras eram 24 horas por dia e envolveram cerca de 60 pessoas. Mas a campo, estávamos com sete a oito equipes de duplas fazendo mais de 100 vigilâncias por dia”, conta Lopes. As barreiras serviram para evitar a movimentação de saída da zona de foco de cargas de risco. “Aves, ração, laticínios, camas de aviários. Todas essas cargas alvo poderiam carregar o vírus de um lugar para o outro”, justifica.
Na última sexta-feira, 26, o trabalho de visita às propriedades foi encerrado – uma semana após a confirmação do foco. E com isso, o Ministério da Agricultura e Pecuária comunicou a OMSA (Organização Mundial de Saúde Animal) para que as restrições às exportações de carne de aves e derivados possam ser derrubadas.
As autoridades de saúde animal do estado reforçam que não existe risco no consumo de carne e ovos. A doença de Newcastle preocupa pela alta mortalidade de aves, por isso, torna-se uma doença comercial, que afeta a economia.
Mesmo com o foco de Newcastle considerado finalizado no Rio Grande do Sul, as vistorias em granjas comerciais continuam. O diretor-adjunto do Departamento de Vigilância e Defesa Sanitária Animal da Seapi, Francisco Nunes Lopes, diz que as granjas que ficam no raio de 3 km serão visitadas a cada três dias e as que estão no raio de 10 km, a cada sete dias.
“Vamos manter isso até a saída da maior parte das aves dessas granjas. E as barreiras, vamos reduzindo”, conta. No fim de semana, a equipe já trabalhava com apenas três das oito barreiras instaladas inicialmente.
O local do foco passou por limpeza e desinfecção com produtos específicos e em 42 dias após a confirmação do fim da doença, poderá receber novos animais. Inicialmente, serão permitidos 20% da capacidade do aviário. Os animais passarão por exames em 15 e em 30 dias, mesmo sem sinais clínicos de alguma doença. Se os resultados derem negativo para Newcastle, as aves poderão sair do galpão após 42 dias.
O diretor-adjunto conta que o uso de uma plataforma de defesa sanitária animal inédita contribuiu para a agilidade do trabalho, pois tornou mais rápida a elaboração da estratégia. Desenvolvida pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) com recursos do Fundesa (Fundo de Defesa Sanitária Animal), a ferramenta foi construída a partir de outros programas gratuitos de georreferenciamento, por exemplo.
“Quando tivemos o caso de influenza aviária em aves silvestres no Taim [Reserva Ecológica do Taim, no sul do RS], em maio de 2023, nós trabalhamos os dados usando quatro ou cinco ferramentas gratuitas. E trabalhávamos a madrugada inteira pra fazer raios e polígonos de ação”, lembra.
Segundo Lopes, a plataforma de defesa sanitária animal é exclusiva do Rio Grande do Sul e permitiu à equipe definir os raios de ação para controle do foco de Newcastle com mais rapidez. “No dia 18 definimos a estratégia e no dia 19, já começamos o trabalho. A gente determinou os raios de ação e já verificou a quantidade de propriedades rurais que estavam envolvidas, quantas rodovias e necessidades de barreiras de higienização e fiscalização”, diz.
Segundo ele, a plataforma contribui para que fosse possível determinar, em um curto espaço de tempo, que o vírus não circulou além da granja. E, com isso, evitou que a emergência zoossanitária permanecesse por mais do que uma semana.
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