Economia
Dependência da China expõe agro brasileiro a futuras perdas, alerta Markestrat
Consultoria diz que diversificação de mercado, aumento do processamento interno e armazenagem nas fazendas são estratégicas necessárias para evitar prejuízos
Sabrina Nascimento | São Paulo | sabrina.nascimento@estadao.com
25/04/2025 - 08:00

Nos últimos 20 anos, a China se consolidou como o maior parceiro comercial do Brasil. O país asiático respondeu por 28% das exportações brasileiras em 2024, frente aos 6% de participação registrados em 2005. Esse resultado representou um avanço no saldo da balança comercial, que fechou o ano passado com superávit de aproximadamente US$ 20 bilhões em favor do Brasil.
Apesar da vantagem numérica, a relação bilateral revela um desequilíbrio estrutural, de acordo com a Markestrat. Em relatório, a consultoria destaca que, enquanto Estados Unidos e União Europeia priorizam a compra de produtos industrializados e de maior valor agregado, a China concentrou suas compras no Brasil principalmente em commodities — especialmente soja, carnes e minério de ferro. Em paralelo, a presença chinesa como investidora direta na economia brasileira ainda é tímida: apenas 1% dos investimentos estrangeiros no país têm origem chinesa.
Essa assimetria acende um alerta. “O Brasil se tornou altamente dependente das compras chinesas, sobretudo no agronegócio”, traz o documento. Além disso, o levantamento mostra que, atualmente, a China é destino de cerca de metade das exportações agropecuárias brasileiras e responde por 43% das importações de defensivos agrícolas utilizados no país. “Essa dependência se estende às importações, de forma que aproximadamente ¼ dos produtos comprados pelo Brasil são de origem chinesa”, dizem os especialistas.
Crescimento chinês em desaceleração: alerta ao agro
A dinâmica comercial entre Brasil e China está diretamente atrelada ao ritmo da economia chinesa. Entre 2005 e 2023, o PIB da China cresceu de forma acelerada, com taxas que chegaram a 20% ao ano em determinados períodos. Esse crescimento impulsionou a valorização das commodities brasileiras e fomentou a expansão do setor agropecuário.
No entanto, o cenário projetado até 2050 é bem diferente: a expectativa é de um crescimento mais moderado, com média de 5% ao ano, em meio a desafios estruturais como o envelhecimento da população, o alto endividamento público e a desaceleração da indústria.“Nos próximos anos, é provável que o crescimento da China desacelere, o que precisa ser considerado como alerta ao agronegócio e a economia do Brasil”, diz a Markestrat.
O risco, segundo os especialistas, está na possibilidade de o Brasil continuar ampliando sua produção, especialmente de soja, sem que haja uma demanda correspondente no principal mercado de destino.
Mesmo diante de um cenário de desaceleração econômica na China, projeções do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) indicam que a oferta de soja brasileira continuará avançando, em média, 4% ao ano até 2034. Já a demanda chinesa pela oleaginosa tende a aumentar a um ritmo mais contido, de 3% ao ano.
Estima-se que o Brasil passará a responder por 62% das exportações globais da commodity até 2034, consolidando sua liderança no mercado internacional. Com isso, o país pode se deparar com um cenário de excesso de oferta frente à capacidade de absorção do mercado chinês.
Soluções e mercados alternativos
Para a Markestrat, esse possível descompasso acende um sinal de alerta para o agronegócio nacional, podendo gerar perdas econômicas e estagnação do setor, caso estratégias mais robustas não sejam adotadas. Como caminhos para o Brasil, a consultoria destaca:
- Diversificar mercados: expandir as exportações para países emergentes da Ásia, África e América Latina, que tendem a aumentar a demanda por proteínas e insumos agroindustriais;
- Investir em armazenagem nas fazendas: hoje, apenas 17% da capacidade de estocagem de grãos está em propriedades rurais. Aumentar esse número garantiria mais autonomia ao produtor e maior poder de negociação;
- Aumentar o processamento interno: fortalecer o esmagamento de soja para a produção de farelo, óleo, biodiesel e até SAF (combustível sustentável de aviação), produtos de maior valor agregado e com potencial de exportação;
- Fortalecer a indústria de proteínas animais: desenvolver o mercado interno e externo de carnes, aproveitando a soja como base para ração animal e ampliando a demanda interna pela commodity.
Newsletter
Acorde
bem informado
com as
notícias do campo
Mais lidas de Economia
1
China acelera compras de carne bovina à espera de decisão sobre salvaguardas
2
Brasil deve registrar recorde histórico na exportação de gado vivo em 2025
3
Arábia Saudita quer aumentar em 10 vezes sua produção de café
4
Adoçado com engano: apicultores denunciam uso de ‘falso mel’ na indústria alimentícia
5
Oferta de etanol cresce mais rápido que consumo e acende alerta no setor
6
Soja brasileira será brutalmente atingida pelo acordo entre EUA e China?
PUBLICIDADE
Notícias Relacionadas
Economia
Agro Estadão é finalista do 4º prêmio de jornalismo Cafés do Brasil
Portal foi o único veículo de comunicação com dois finalistas na mesma categoria do prêmio promovido pelo Conselho Nacional do Café
Economia
Otimismo “cauteloso” e pessimismo se misturam em setores ainda tarifados
De acordo com a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Índice das exportações do agro isentas das tarifas dos EUA é de 55%
Economia
Alckmin: impasse sobre CBIOs para biocombustíveis dos EUA está patricamente resolvido
Vice-presidente e ministro do MDIC diz que próximo passo de negociação com os EUA é colocar mais produtos na lista de exceções tarifárias
Economia
China adia anúncio de salvaguarda e mercado de carne bovina ganha fôlego
Novo prazo estabelecido pelo Ministério do Comércio da China é janeiro de 2026
Economia
Agricultura eleva projeção do valor bruto da produção para R$ 1,412 trilhão
O maior crescimento do VBP agrícola em 2025 será para café, com alta de 46,2%, chegando a R$ 114,859 bilhões
Economia
Unica fecha acordo com associações e eleva impasse do Consecana; Orplana vê racha no setor
Indústria sucroenergética e produtores de cana tentam chegar a um consenso sobre a revisão da metodologia do Consecana-SP desde abril
Economia
Balança comercial tem superávit de US$ 1,8 bi na 3ª semana de novembro
Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, valor foi alcançado com exportações de US$ 6,939 bilhões e importações de US$ 5,139 bilhões
Economia
USDA anuncia pacote de ajuda e novas compras de soja pela China
EUA pretendem comprar até US$ 30 milhões em frutas frescas para aliviar agricultores de excedentes de produção