Brasil é o 4° maior exportador de carne suína, mas pode subir ao pódio nos próximos anos; em 2024, embarques da proteína brasileira devem avançar mais de 7%
Diante da queda no plantel suíno do Canadá e de uma possível adoção pela China de medidas antidumping sobre a carne suína importada da União Europeia, a proteína brasileira pode ganhar espaço no cenário internacional. Atualmente o Brasil é o quarto maior exportador de carne suína, atrás da União Europeia, dos Estados Unidos e do Canadá, conforme dados do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA), compilados pela Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).
“O Canadá vem em uma tendência de queda nas exportações e se a gente fosse fazer uma conta simples, esse ano seria o ano de o Brasil ultrapassar o Canadá, chegando a 1.3 [milhão de toneladas]. Mas o Canadá, por sua vez, vem se recuperando e aumentando a projeção para este ano, então, neste ano talvez a gente ainda não vá ganhar essa medalha de bronze, mas eu acho que a gente tem condições, eu acho que é natural e esse momento vai acontecer”, comentou o diretor de mercados da ABPA, Luís Rua.
A avaliação foi feita durante o painel “Perspectivas e Desafios para o Agronegócio Envolvendo os Principais Elos da Cadeia (do Campo ao Consumidor)”, durante o Salão Internacional de Proteína Animal (SIAVS), que foi realizado nesta semana em São Paulo.
De acordo com projeções da ABPA, em 2024 o Canadá deverá exportar 1,4 milhão de toneladas de carne suína, recuperando-se do tombo de mais de 6% do ano passado e voltando ao patamar observado em 2022. Já os embarques brasileiros da proteína suína devem avançar 7,7% e atingir 1,325 milhão de toneladas.
Caso se confirmem as estimativas, a União Europeia deve perder a liderança das exportações de carnes suínas para os Estados Unidos. O bloco europeu deve embarcar 3,150 milhões de toneladas em 2024, contra 3,287 milhões de toneladas norte-americanas.
Diante dos recuos dos principais concorrentes, o Brasil tem oportunidades de expandir a capacidade de exportação, de acordo com o diretor da ABPA. Rua ressaltou, no entanto, a importância de se ter condições de exportar com rentabilidade.
“Não adianta exportar só por exportar, é importante que a gente tenha condições. E isso envolve todos os elos da cadeia produtiva para que a gente consiga trazer rentabilidade e coordenação para a exportação, que é 25% do que nós produzimos, para que ela seja esse motor pra gente conseguir ganhar ainda mais escala, ganhar mais competitividade. E o Brasil tem condição, facilmente, de nos próximos anos assumir essa posição [3° maior exportador], ainda mais com a diminuição que a gente tem visto na União Europeia que sai de 6 milhões de toneladas exportadas para 3 milhões de toneladas”, afirmou Rua.
Além da menor disponibilidade para o mercado externo, a União Europeia também pode vir a enfrentar medidas antidumping da China, o que, na prática, significaria a cobrança de uma tarifa sobre a carne suína importada da UE. Cabe salientar que ainda se trata de uma investigação em curso, aberta pelos chineses após a UE também sinalizar a prática de dumping pela China na venda de aço.
Questionado se a indústria brasileira vislumbra uma possibilidade de ocupar o espaço em função de possíveis imposições, Luís Rua enfatizou que ainda se trata de investigações que devem levar um certo tempo, mas que o Brasil poderia atender os chineses, principalmente com miúdos suínos.
“Não indo contra a suinocultura europeia, pelo contrário, mas o Brasil vem se colocando também à disposição da China como uma alternativa. A China neste ano, de janeiro até julho, importou 452 mil toneladas de miúdos suínos, aqueles miúdos internos, vermelhos […] Hoje, basicamente 80% do fornecimento desses miúdos é de países europeus e o que que significa? que se o miúdo [produzido na UE], que já está menos competitivo em relação ao aos últimos anos, tiver uma tarifa adicional, naturalmente o Brasil vai se colocar à disposição”, diz Rua.
Apesar de se colocar à disposição, por enquanto, somente Santa Catarina pode exportar miúdos de suínos para a China, pois é o único estado brasileiro reconhecido pelo país asiático como livre de febre aftosa sem vacinação. Contudo, o diretor da ABPA explica que já há um pedido de reconhecimento do Rio Grande do Sul, do Paraná e do Acre para que recebam o mesmo reconhecimento.
Referente à produção de carne suína, o Brasil ainda segue distante dos principais concorrentes, liderados pela China, com mais de 56 milhões de toneladas estimadas para este ano. Em segundo lugar, aparece a União Europeia, com 21,1 milhões de toneladas e, em terceiro, os EUA com 12,7 milhões. A estimativa de produção brasileira para 2024 é de 5,2 milhões de toneladas.
Presente no evento promovido pela ABPA, o presidente da Associação Brasileira de Criadores de Suínos (ABCS), Marcelo Lopes, ressaltou a importância da diversificação da produção brasileira em momentos de crise e a necessidade de se qualificar a relação de consumo.
“Os sistemas de produção que nós temos são muito competitivos. A gente tem cooperativa, tem a parte da integração e também os [produtores] independentes […] então essa diversificação ajuda em momentos de crise para que se possa escoar de uma maneira mais coerente quando você tem algum tipo de impasse”, diz Lopes.
Sobre a produção nacional, o presidente da Associação Brasileira das Empresas de Genética de Suínos (ABEGS), Alexandre Rosa, destacou a importância do melhoramento genético da suinocultura brasileira.
“Eu acho que nunca estivemos tão bem na parte genética de suínos no Brasil e uma das coisas que favoreceu e favorece a suinocultura brasileira, de certa forma, é que, ao contrário dos outros países concorrentes, os maiores criadores e as maiores empresas produtoras de aves são as mesmas de suínos, elas estão juntas nesse modelo. E isso acabou ajudando, traz uma vantagem […] você vai lá pra fora e fala de aves e de suínos também”, comenta Rosa, explicando que avanços em estudos genéticos e/ou nutrição ocorreram na avicultura antes de serem melhor desenvolvidos para as necessidades da suinocultura.
O melhoramento genético na suinocultura brasileira, além de diminuir os custos de produção, também tem um impacto positivo no campo da sustentabilidade, conforme explica o especialista da área: “se a gente olhar que o custo de produção do suíno, total, é de aproximadamente 75% e 80%, varia de acordo com o mercado, é da ração, o foco hoje é a eficiência alimentar. E com avanços genéticos, hoje produzimos mais cabeças com menos quilos de milho, por exemplo, e isso é sustentabilidade, mais com menos, só que a gente não comunica isso”, contextualiza o presidente da ABEGS.
O diretor de mercados da ABPA destaca que a capacidade interna de consumo da carne suína no Brasil avança de forma tímida devido à falta de qualificação nas relações de consumo. “Ainda que tenha tido um avanço significativo, existem alguns tabus que a gente precisa trabalhar para que haja um consumo maior dessa proteína”, diz Rua.
Projeções recentes da ABPA indicam que o consumo per capita da proteína deve ficar estável em 2024, frente ao ano anterior, em 18 kg. Volume semelhante ao esperado para 2025, de 18,3 kg por pessoa.
Relacionando sustentabilidade e consumo, Luís Rua falou da capacidade brasileira em aumentar a produção de carne suína para atender tanto os mercados mais exigentes, como a população mais carente do país.
“Acho que o Brasil é um dos poucos países do mundo que tem capacidade e condições de entregar um produto que seja, ao mesmo tempo, acessível para as populações mais pobre e, ao mesmo tempo, a gente pode atender essas novas tendências demandadas pelo mundo e que a gente tem que se adequar. E aí a gente tem que comunicar isso: ah, a gente é sustentável, tá! Mas como? A gente tem que mostrar. O Brasil caminha nesse sentido, já é referência, temos o DNA da sustentabilidade e não tem volta”, enfatizou o diretor.
Já o presidente da ABCS ressaltou que ainda existe a crença de que a carne suína é oriunda de uma produção onde animais se alimentam de lavagem (restos de comida), prática proibida na produção destinada à indústria.
“Temos visto ao longo desses anos o quanto a gente se comunica mal […] há uma série de informações importantes que nós precisamos repassar à população de uma forma geral. Ao longo desses anos todos a gente vem trabalhando no mercado interno, mas o próprio setor de suínos precisa se comunicar melhor. Qualquer assunto de sanidade, de produção que vocês falarem, podem ter certeza que não existe coisa melhor do mundo quando você escolhe o agro brasileiro, porém, a nossa população não sabe e eu aprendi isso a duras penas”, comentou Marcelo Lopes.
O presidente da Associação ressaltou a importância de levar informação correta ao consumidor e defendeu, como meio para isso, a educação. “Você chega no varejo, por mais que você tenha uma produção de excelência, com a genética de primeiro mundo, você chega lá no varejo os colaboradores nunca foram a um frigorífico, os colaboradores jamais foram ver como é a produção de um suíno. Como é que você quer vender alguma coisa, se comunicar com seu fornecedor, se no seu canal de venda você não consegue falar daquilo que você está produzindo? Então, a saída é a educação, um colaborador que saiba explicar a origem daquela carne ao consumidor final”, defendeu Lopes.
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