Economia
Acordo EUA-UE ameaça espaço do agro brasileiro na Europa
Preferência comercial por produtos norte-americanos pode reduzir exportações brasileiras de soja, carne e milho ao bloco europeu, avalia especialista
Sabrina Nascimento | São Paulo | sabrina.nascimento@estadao.com
28/07/2025 - 12:31

O acordo comercial selado entre a União Europeia (UE) e os Estados Unidos (EUA) pode afetar o agronegócio brasileiro e atrapalhar a conclusão do acordo entre o bloco europeu e o Mercosul. Essa é a avaliação do professor João Alfredo Nyegray, especialista em Negócios Internacionais e Geopolítica da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR).
Segundo o especialista, a UE se comprometendo em ampliar as importações de energia, bens industriais e demais produtos dos EUA em troca da redução das tarifas impostas anteriormente mostra uma tendência de preferência comercial para os norte-americanos dentro do mercado europeu. “Isso pode redirecionar a demanda que hoje é parcialmente atendida por exportações brasileiras. Por exemplo, o Brasil é grande exportador de soja, carne e milho para a Europa, produtos que também integram o portfólio agrícola norte-americano. Se a UE aumentar sua compra de produtos agropecuários dos EUA, por pressão política ou incentivos tarifários, o agro brasileiro perde espaço”, disse Nyegray, ao Agro Estadão.
Ele salienta ainda que, ao conceder redução tarifária a produtos estratégicos dos EUA, o bloco europeu torna esses bens mais competitivos e acessíveis. Enquanto isso, as exportações brasileiras continuam enfrentando tarifas elevadas, cotas restritivas e barreiras fitossanitárias. “A consequência é clara: o agronegócio brasileiro fica em desvantagem comparativa frente aos norte-americanos no mesmo mercado”, ressalta.
Impacto sobre o acordo Mercosul-UE
Conforme o especialista, o novo entendimento entre EUA e UE também envia um sinal das prioridades estratégicas da Europa. Isso ocorre, uma vez que, o bloco demonstrou estar disposto a fechar rapidamente acordos com países alinhados aos seus interesses, especialmente nas áreas de energia e defesa. Neste contexto, ele avalia que o Mercosul — em especial o Brasil — tem oferecido poucas contrapartidas de peso e, por vezes, adota discursos críticos considerados hostis por líderes europeus, como as acusações de eurocentrismo.
“Ao conceder reduções tarifárias aos EUA, a UE reduz sua margem de manobra para fazer concessões adicionais ao Mercosul. Em outras palavras, parte do ‘espaço de barganha’ já foi consumido nas tratativas com os norte-americanos”, destaca o professor. “Isso pode tornar o Acordo Mercosul-UE menos vantajoso para o bloco sul-americano, ou até travar sua conclusão por falta de incentivos recíprocos”, complementa.
Além disso, de acordo com o especialista, o acordo com os EUA pode fortalecer os argumentos de grupos europeus protecionistas, que já se opõem ao pacto com o Mercosul, especialmente no setor agrícola e ambiental, a exemplo dos agricultores franceses e austríacos. “Agora, com novos compromissos comerciais assumidos com os EUA, esses setores ganham mais força para barrar a conclusão do acordo com o bloco sul-americano”, afirma.
Principais pontos do acordo EUA-UE
- Tarifa única de 15% para a maioria das exportações da UE (incluindo carros, semicondutores e medicamentos). Antes, a tarifa era de 30%;
- Tarifa zero para produtos estratégicos: aeronaves, peças, chips, químicos, genéricos, alguns agrícolas e matérias-primas;
- Redução de tarifas e cotas para aço e alumínio;
- Compras de energia dos EUA (GNL, petróleo e combustíveis nucleares) para substituir as fontes russas;
- Parceria tecnológica em inteligência artificial, com uso de chips americanos nas fábricas europeias;
Os termos do acordo ainda precisam ser aprovados pelos 27 países-membros da União Europeia.
Newsletter
Acorde
bem informado
com as
notícias do campo
Mais lidas de Economia
1
China acelera compras de carne bovina à espera de decisão sobre salvaguardas
2
Brasil deve registrar recorde histórico na exportação de gado vivo em 2025
3
Metanol: como falhas na produção podem causar contaminação
4
Banco do Brasil dá início à renegociação de dívidas rurais com recursos livres
5
Onde nascem os grãos da xícara de café mais cara do mundo?
6
Setor de café pede urgência em negociação das tarifas com os EUA
PUBLICIDADE
Notícias Relacionadas
Economia
Japão fará nova auditoria para liberar carne bovina do Brasil
Fávaro espera a abertura do mercado ainda neste ano, mas fontes do setor avaliam que as negociações podem demorar mais
Economia
Seguro rural em 2025 pode ter o menor nível de área coberta dos últimos 10 anos
Seguradoras avisam que produtores serão cobrados por parcelas subvencionadas não pagas pelo governo
Economia
Bradesco sente a inadimplência do agro, mas carteira segue sob controle
Atrasos em financiamentos do Banco John Deere, no qual o Bradesco detém 50%, influenciaram o resultado; inadimplência na carteira rural chegou a 4,1%
Economia
Oferta de etanol cresce mais rápido que consumo e acende alerta no setor
Com avanço das usinas de milho e previsão de 49 bilhões de litros até 2035, indústria busca estratégias para evitar excesso de oferta
Economia
JBS exporta 550 t mensais de resíduo de couro para virar fertilizante na Itália
Ação faz parte de estratégia de aproveitamento total da matéria-prima, que inclui a tecnologia Kind Leather
Economia
Cade aprova compra da Levitare e da Búfalo Brasil pela Tirolez
Fábricas em quatro estados e nova linha com produtos de leite de búfala impulsionam meta de R$ 2,5 bilhões até 2027
Economia
Nova rota aérea amplia escoamento de frutas do Brasil para a Europa
Operação terá três frequências semanais, conectando aeroportos internacionais brasileiros ao mercado europeu
Economia
Agro gaúcho discute criação de fundo para garantir crédito e seguro rural
Inspirado no Fundesa, modelo prevê gestão privada com produtores, indústria e governo, financiado por recursos do setor rural e indústria