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José Carlos Vaz

Advogado e consultor, mestre em direito constitucional, ex-secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura

Esse texto trata de uma opinião do colunista e não necessariamente reflete a posição do Agro Estadão

Opinião

Política Agrícola: vítima de dano colateral

O custo financeiro médio subiu para todos os produtores e cooperativas, sem que nada de muito negativo tenha ocorrido no agro brasileiro; isso porque a Selic subiu por razões que estão fora do setor rural

08/07/2025 - 08:00

Foto: Adobe Stock
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Com um custo de produção acima de R$ 1 trilhão, a produção agropecuária brasileira teve neste mês, com o anúncio dos planos-safra, as suas expectativas nubladas pela elevação do seu custo financeiro médio, decorrente da admissão explícita da incapacidade fiscal para subsidiar o crédito rural, especialmente o de investimento, nas proporções praticadas nos últimos anos-safra, para o que seria necessário mais uns R$ 15 bilhões. Também pelo colapso do seguro rural (mais uns R$ 5 bilhões). 

Algo similar aconteceu nos anos 1980, levando à judicialização do crédito rural e sua quase anistia, e confluindo no alongamento de dívidas, com abatimento diferido no tempo.

CONTEÚDO PATROCINADO

Note-se que nada muito expressivo mudou no cenário do agro brasileiro, em relação à sua competitividade, eficiência e capacidade de expansão no mercado. Apenas o contexto geopolítico e o estado das coisas políticas e econômicas em Pindorama é que significativamente causam dificuldades e insegurança para o setor rural.

O custo financeiro médio subiu para todos os produtores e cooperativas, independentemente do porte ou da cadeia produtiva, porque a taxa Selic subiu. 

E a taxa Selic subiu porque os “senhores do poder” no Executivo, no Legislativo e no Judiciário não conseguem aumentar a eficiência da economia brasileira, dedicando-se apenas a “futricas” partidárias e ao gozo do vício de reeleição no próximo pleito, não conseguindo passar aos financiadores da dívida brasileira argumentos e evidências suficientes para fazer com que os seus analistas abandonem planilhas excell, parametrizadas na rua 25 de março, e por meio das quais calculam uma proporção dívida pública/PIB simplória e inadequada.

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Com isso, o país fica refém da armadilha da recessão, da falta de investimento, da conta única, do teto de gastos, da junta orçamentária, das isenções fiscais casuísticas, da cobrança de “pedágio” na alocação dos recursos públicos, da extorsão no exercício das atividades públicas regulatórias ou fiscalizadoras, da criminalidade. 

Se o PIB brasileiro crescer, a taxa de juros cairá.

Mas o PIB brasileiro é mero “rabo” da economia mundial, pois pouco tem de tecnologia e inovação na sua geração (e o o que se tem está quase todo no agro).

Para que deixe de ser “rabo” e seja protagonista, o Brasil precisa de reformas institucionais inovadoras, mas isso só acontecerá se a sociedade brasileira conseguir acabar com a reeleição, com a decisão individual, com a procrastinação de decisões em todos os poderes, com a definição de cargos e eleitos com base em critérios regionais desproporcionais, com a desconexão entre o voto para o executivo e o voto para o legislativo, etc.

Mas estas abordagens estão bem além do âmbito usual dos artigos que publico aqui no Agro Estadão. Foram feitas apenas para ilustrar o pensamento de que o Plano Safra 2025/2026 foi vítima de dano colateral. 

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“O que são mais R$ 15 bilhões, comparados a R$ 1 trilhão?”

O governo executivo foi muito preguiçoso na revisão dos custos operacionais do crédito rural. Tenho para mim que dava para reduzir a carência de subvenção das taxas de juros em pelo menos R$ 5 bilhões, com a simplificação e automatização dos procedimentos de contratação e condução das operações. Também valeria a pena rever os compulsórios e os direcionamentos dos depósitos à vista, da poupança rural e da LCA. E a incidência de IOF adicional. E apurar e publicizar os montantes acumulados de taxas controladas do crédito rural por CPF/CNPJ e/ou grupo familiar e/ou conglomerado empresarial. E permitir a emissão escritural das cédulas de crédito rural. E rever as formas de registro de títulos e garantias, para aumentar a segurança e reduzir o custo.

Os três governos autônomos que se revezam e/ou digladiam no domínio do país, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, também estão devendo medidas para reduzir a insegurança jurídica nas relações de crédito. 

O que está acontecendo com o uso da recuperação judicial para dívidas relativas à atividade produtiva rural? Há duplicidade de instrumentos contratuais no “barter”? Quais as taxas embutidas nas relações de troca produto/insumo? Há transparência nas relações “de gaveta” entre fornecedores de insumos e máquinas e “traders”, nas triangulações com produtores rurais via “barter”? Há suficiente controle da veracidade e proporcionalidade dos direitos creditórios vinculados aos títulos do agronegócio? Há cobrança de impostos na emissão de CPR por pessoas jurídicas que não sejam produtores rurais, cooperativas ou associações? Há “muralhas da China” entre os diversos intervenientes na emissão e registro de CPR?

E quando as lideranças políticas, corporativas e empresariais representativas dos principais intervenientes no agro brasileiro vão sair do discurso vazio do seguro rural para a efetividade de uma base de dados pública, aberta, anonimizada e verídica que permita a gestão da política agrícola e das decisões de negócio com base em uma visão atuarial e outra contábil/financeira? 

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Para encerrar, alguns comentários sobre os planos-safra anunciados:

  • na falta de cobertor suficiente, e em uma situação fiscal e política complicada, o Executivo optou por se manter  bem com o público cativo, do MST e dos agricultores familiares, mas mesmo para esses aumentou a vulnerabilidade a perdas climáticas e a problemas de mercado.

E são tantas as realidades da produção familiar! É preciso segmentar mais o uso dos instrumentos de política agrícola, em especial no que se refere ao risco de crédito bancário.

  • os médios produtores estão cada vez mais fragilizados, endividados, descapitalizados, sem seguro rural e sem capacidade de constituir hedge de preços. 

O endividamento vai aumentar, assim como seu custo financeiro e a inadimplência. Fazer crédito com variação cambial aqui será quase um suicídio. 

O caminho passa por CPR Física e barter, crédito rural a taxas pós-fixadas, manter o capital próprio, cortar despesas e parar investimentos.

  • para os grandes produtores e suas cooperativas foi indicada a porta dos recursos de mercado, que sempre foi predominante. As grandes fontes serão a CPR Física, os recursos com variação cambial (estes complicados em um cenário volátil para a geopolítica) e os títulos do agronegócio.
  • é temerário, quiçá irresponsável, corrigir dívidas de produtor rural pela variação cambial, pois não existe “hedge natural” no setor rural, nem mesmo na soja. A história do crédito rural não dá fundamento a esse juízo. Não há correlação direta, linear, absoluta entre as curvas financeiras das receitas líquidas e da dívida de um produtor, em moeda estrangeira.
  • parte do público das dívidas com variação cambial vai se juntar a parte dos médios produtores e suas cooperativas em um reescalonamento de dívidas que o governo 2027/2030 terá que implementar.

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