Agropolítica
Governo brasileiro reage a tarifaço dos EUA e avalia medidas na OMC
“Eu esperava um percentual pior, eu esperava na ordem de 18%”, afirma presidente da Orplana

O governo brasileiro lamentou a decisão dos Estados Unidos de impor uma tarifa de 10% sobre as exportações brasileiras. Em nota conjunta, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) afirmaram que “o governo brasileiro avalia todas as possibilidades de ação para assegurar a reciprocidade no comércio bilateral, inclusive recurso à Organização Mundial do Comércio, em defesa dos legítimos interesses nacionais”.
Nesse contexto, o governo ressaltou a aprovação do Projeto de Lei da Reciprocidade pelo Congresso Nacional na noite desta quarta-feira, 2. Ao mesmo tempo, reforçou a manutenção do diálogo com as autoridades norte-americanas para tentar reverter as medidas anunciadas e mitigar seus impactos o mais rápido possível.
As pastas ressaltam que “a nova medida, como as demais tarifas já impostas aos setores de aço, alumínio e automóveis, viola os compromissos dos EUA perante à Organização Mundial do Comércio e impactará todas as exportações brasileiras de bens para os EUA”.
De acordo com dados do próprio governo norte-americano, o superávit comercial dos EUA com o Brasil em 2024 foi de aproximadamente US$ 7 bilhões, apenas em bens. Considerando também os serviços, o superávit total atingiu US$ 28,6 bilhões no ano passado, tornando-se o terceiro maior saldo comercial positivo dos EUA no mundo. Nos últimos 15 anos, o superávit acumulado nas trocas comerciais com o Brasil totalizou US$ 410 bilhões.
“A imposição unilateral de tarifa linear adicional de 10% ao Brasil com a alegação da necessidade de se restabelecer o equilíbrio e a ‘reciprocidade comercial’ não reflete a realidade”, declarou o governo brasileiro. A nota reforça que, em defesa dos trabalhadores e empresas nacionais, e em linha com o compromisso do Brasil com o sistema multilateral de comércio, “o governo do Brasil buscará, em consulta com o setor privado, defender os interesses dos produtores nacionais junto ao governo dos Estados Unidos”.
Entidades avaliam possíveis impactos para setor produtivo
Entidades que representam diversos setores da economia e do agronegócio afirmaram que irão analisar o anúncio do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, antes de se pronunciar sobre o tema. Em nota, a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) destacou que a carne brasileira já enfrenta uma taxação de 26,4% nos EUA, com uma cota anual de 65 mil toneladas isenta de tarifas.
“Essa cota, que é anual, costuma se esgotar logo no primeiro mês do ano. Mais de 70% do que exportamos no ano passado entrou com a tarifa. Apesar disso, acreditamos num estreitamento da parceria, porque os EUA enfrentam desafios no ciclo pecuário e, por pelo menos dois anos, precisarão de quem possa garantir volume, qualidade e preço — e esse parceiro é o Brasil”, destacou a Abiec.
O diretor-executivo da Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR), Ibiapaba Netto, disse à reportagem que a entidade aguardava a publicação oficial da Ordem Executiva.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Café, Pavel Cardoso, disse em nota que a avaliação da entidade ainda é preliminar, mas considera que o café representa um importante ativo para a economia norte-americana. “Os EUA não produzem e não produzirão café por razões climáticas”, ressalta.
Cardoso citou dados da National Coffee Association (NCA), que evidenciam o impacto econômico do setor no país: para cada dólar gasto na importação de café são gerados US$ 43 em movimentação na economia americana. Além disso, o setor cafeeiro movimenta anualmente US$ 343 bilhões, emprega cerca de 2 milhões de pessoas, gera uma folha de pagamento de US$ 100 milhões e recolhe aproximadamente US$ 47 milhões em impostos. “Esses números foram levantados para demonstrar para o governo norte-americano que nem sempre somente a exportação é benéfica para o país”, concluiu.
A assessoria do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) também disse ao Agro Estadão que a diretoria aguarda a formalização da medida e já está em contato com os parceiros da NCA nos Estados Unidos para analisar o real impacto dessa tributação.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) recebeu com cautela e preocupação o anúncio de tarifas adicionais de 10% sobre os produtos brasileiros. Em nota, o presidente da CNI, Ricardo Alban, diz que é preciso fazer uma análise detalhada das medidas divulgadas hoje pelo presidente norte-americano, Donald Trump, e insistir no diálogo para preservar uma relação bilateral histórica e complementar entre o Brasil e os EUA.
“Claro que nos preocupamos com qualquer medida que dificulte a entrada dos nossos produtos em um mercado tão importante quanto os EUA, o principal para as exportações da indústria brasileira. No entanto, precisamos fazer uma análise completa do ato. É preciso insistir e intensificar o diálogo para encontrar saídas que reduzam os eventuais impactos das medidas”, avalia.
“Eu esperava 18%”, diz CEO da Orplana
Na avaliação do CEO da Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil (Orplana), José Guilherme Nogueira, a tarifa anunciada pelos americanos ficou abaixo das expectativas. “Eu esperava um percentual pior, eu esperava na ordem de 18%”, comentou a jornalistas ao final do primeiro dia do Cana Summit, evento organizado pela associação e que acontece até esta quinta-feira, 03, em Brasília (DF).
Segundo ele, no caso do açúcar será necessário entender melhor como essas tarifas anunciadas nesta quarta irão impactar outros produtores, como o caso do México. “México não estava na lista e a gente quer esperar também para ver a posição do México. O México exporta cerca de 5 milhões de toneladas de açúcar para os Estados Unidos, é o principal exportador de açúcar para os Estados Unidos, então isso é importante”, ressaltou.
O CEO comenta que os americanos não produzem todo o açúcar que consomem e o entendimento é de que uma tarifa sobre os principais exportadores do produto pode afetar a inflação de produtos que dependem do açúcar como matéria prima, como é o caso dos refrigerantes. “A gente vai precisar ver também os produtos que são produzidos nos Estados Unidos, principalmente, os produtos que usam açúcar, porque essa é a grande discussão”, complementou.
Quanto ao etanol, o impacto não deve ser imediato e pode ser pouco sentido pelos exportadores brasileiros. Nogueira pontua que os americanos não precisam importar o biocombustível pois são auto suficientes. Além disso, o preço do etanol por lá é mais baixo. O fluxo do produto é principalmente devido ao que ele chama de “intensidade de carbono”, ou seja, o etanol brasileiro tem uma capacidade maior de descarbonização. Estados como a Califórnia tem políticas nessa direção, por isso ocorre a importação do etanol brasileiro. Ainda conforme o CEO, a quantidade exportada do biocombustível está na casa dos 500 milhões de litros, o que é considerado pouco.
“O comportamento do consumidor é muito complicado, a gente não sabe o que uma empresa da Califórnia vai falar. Se aumentou 10%, será que ela perde muito em margem? Será que ela consegue repassar essa margem para o consumidor ou não? Então esse é o efeito até se ajustar as coisas. No primeiro momento não tem um baque direto, mas isso vem acontecendo depois paulatinamente, reduzindo os volumes de exportação e claro, vendo se esse mercado se ajusta e se autorregula”, explicou o responsável pela Orplana.

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