Agricultura
Genética e biotecnologia impulsionam produção de algodão no Brasil
Em uma década, País triplicou sua colheita de pluma, passando de 1,29 milhão para 3,9 milhões de toneladas
Sabrina Nascimento | São Paulo | sabrina.nascimento@estadao.com
05/11/2025 - 05:00

Na última década, o Brasil ampliou e consolidou sua relevância na produção de algodão. Dados compilados pela Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) indicam que, no período, os agricultores saíram de uma produção de 1,29 milhão de toneladas de pluma (2014/2025) para 3,9 milhões (2024/2025).
Uma parcela importante desse avanço se deve à genética. Segundo Alexandre Garcia Santaella, gerente de marketing na Basf, a evolução das sementes, somada ao uso de biotecnologia, manejo e agricultura digital, transformou a cotonicultura brasileira em uma das mais tecnificadas e produtivas do mundo. “A gente tem que entregar produtividade, qualidade e sustentabilidade para a cadeia como um todo e tudo começa na semente do algodão”, afirma.
No entanto, não é um processo rápido. Ao Agro Estadão, Santaella explicou que o desenvolvimento de uma nova variedade é um empreendimento de longo prazo – cerca de sete anos desde os primeiros cruzamentos até o lançamento comercial do material. Esse desenvolvimento inclui, ao menos, de 3 mil a 4 mil cruzamentos por ano, que geram milhares de linhagens das quais, depois de anos de testes, saem apenas dois ou três materiais comerciais.
Esse cronograma extenso tem duas consequências práticas. Primeiro, ele exige investimentos substanciais em pesquisa e estações experimentais — pontos nos quais o Brasil, segundo Santaella, tem se destacado, com infraestrutura comparável às melhores do mundo. De acordo com o especialista, o caráter rigoroso do processo garante, a longo prazo, estabilidade genética. “Quando um material é lançado hoje, eu tenho o controle exato de onde estava cada pai, avô, bisavô, tataravô de cada semente que eu lancei”, relata, fazendo uma comparação com uma espécie de árvore genealógica de cada semente.
Biotecnologia em paralelo
Se o melhoramento genético leva em média sete anos, o desenvolvimento e incorporação de biotecnologia costuma demandar um tempo maior. Conforme Santaella, o desenvolvimento completo de uma biotecnologia pode levar em torno de 20 anos.
Na prática, os dois processos — melhoramento e biotecnologia — “andam paralelos” e se encontram em um ponto que torna a variedade comercialmente estável, tanto em produtividade quanto na expressão das proteínas que conferem resistência à herbicidas, lagartas e nematoides, por exemplo.
Apesar do longo tempo de espera, o benefício no campo é redução de custo. “Quando a gente olha para a biotecnologia, eu estou falando para você hoje de resistência para simplificar o manejo do produtor […]. Por exemplo, o algodão que não tem tecnologia para controle de lagartas, o agricultor tem que fazer, em média, 20 aplicações. No algodão que tem a tecnologia de controle de lagartas, essa média cai para 6. Então, deixou-se de fazer 14 aplicações de defensivo nesse algodão. É um benefício de custo para o agricultor e de sustentabilidade para o ambiente como um todo”, salienta.

Foto: Basf/Divulgação
Manejo
O especialista lembra que a genética encontra no manejo um aliado para atingir sua potencialidade. Entre as práticas que preservam a qualidade da fibra, ele cita:
- adubação;
- controle integrado de pragas;
- regulagem de colheitadeiras e algodoeiras;
- práticas pós-colheita apropriadas.
Santaella ressalta que boa genética precisa andar junto com assistência técnica e logística adequada para realmente se traduzir em maior valor para o produtor e melhor reputação para o algodão brasileiro. “Eu nunca consigo aumentar a qualidade que fiz no campo. Eu só consigo piorar. Por isso, eu digo que o produto final é resultado da genética, do ambiente e, principalmente, da interação genética–ambiente”, aponta.
Adaptação genética olhando o clima
Como o Brasil apresenta condições climáticas diversas, o que funciona em uma região, como a Bahia, pode não se adaptar com o mesmo desempenho em outras, como o Mato Grosso. Por isso, outro ponto levado em consideração na pesquisa genética é o desenvolvimento de materiais com diferentes ciclos e características agronômicas.
Entre os aspectos, estão as cultivares de ciclo precoce — que completam o desenvolvimento em menos tempo e ajudam o produtor a escapar de riscos climáticos no fim da safra —, e os materiais de “perfil mais rústico”, com sistema de raízes mais longas, capazes de suportar períodos de estiagem.
De acordo com Santaella, as variedades precoces podem apresentar um potencial produtivo ligeiramente menor, mas oferecem maior segurança econômica ao agricultor. “Muitos produtores preferem garantir uma produção estável a estender demais o ciclo e se expor às variações climáticas”, observa.
Como exemplo das novas estratégias genéticas, Santaella cita duas variedades desenvolvidas para lançamento na safra 2025/2026 de algodão. Cada uma reflete diferentes perfis de manejo e adaptação regional.
A primeira (FM 933STP) é uma cultivar de ciclo médio, desenvolvida com resistência a duas espécies de nematoides e com três proteínas voltadas à proteção contra lagartas. O material incorpora ainda uma tecnologia herbicida de ação prolongada, voltada ao manejo mais eficiente de plantas daninhas.
Segundo o especialista, os ensaios indicam rendimento de fibra em torno de 42%, superior à média observada em cultivares equivalentes. O índice de qualidade SCI, que avalia parâmetros da fibra, se mantém “acima de 140”, valor considerado alto pelo padrão da indústria têxtil nacional.
Já a segunda (FM 979STP), de ciclo médio-tardio, foi desenvolvida com foco em ambientes sujeitos a veranicos, como os do oeste baiano. A variedade apresenta maior desenvolvimento radicular, o que contribui para o aproveitamento da umidade em camadas mais profundas do solo, além de resistência a nematoides, pragas e herbicidas. O rendimento de fibra varia entre 40% e 41%, com destaque para a estabilidade sob condições de estresse hídrico. “Essa cultivar tem características de rusticidade que é consequência direta de um bom crescimento radicular”, indica.
Newsletter
Acorde
bem informado
com as
notícias do campo
Mais lidas de Agricultura
1
5 frutas do Cerrado que você precisa conhecer
2
PCC expande atuação sobre o agronegócio
3
Tipos de páprica: o tempero que colore e transforma pratos
4
Saiba identificar a "falsa couve" que intoxicou família em MG
5
Conheça a batata ancestral com gosto de milho
6
Conheça a palmeira que dá palha e fruto recordista em vitamina A
PUBLICIDADE
Notícias Relacionadas
Agricultura
Minas Gerais lidera ranking dos melhores cafés do Brasil em 2025
Produtores mineiros conquistaram as três categorias do Cup of Excellence, o mais prestigiado concurso de qualidade do setor
Agricultura
Safra de cana 2025/26 deve cair 1,6% no Brasil
Conab revisa produção para 666,4 milhões de toneladas devido ao clima; etanol de cana deve recuar quase 10%
Agricultura
Brasil semeou 47% da área prevista para soja 2025/26
Boletim da Conab mostra progressos diferentes entre as principais culturas da safra 2025/26
Agricultura
Produção de erva-mate no PR é reconhecida como patrimônio mundial
Essa é a segunda vez que o Brasil recebe o título por um modelo de produção
Agricultura
Conab faz leilão de frete para retirada de 16 mil toneladas de milho
Volume irá abastecer produtores através do Programa de Venda em Balcão (ProVB)
Agricultura
Semeadura da soja 2025/26 perde ritmo com chuvas irregulares
Plantio do milho verão avança, mas enfrenta desafios distintos no Centro-Sul do Brasil, entre baixa umidade e excesso de chuva
Agricultura
Fertilizantes: Brasil deve atingir recorde de entregas em 2025
Projeções da Agrinvest, apresentadas no Simpósio Sindiadubos NPK 2025, apontam alta de 1% em relação a 2024, mesmo em cenário desafiador
Agricultura
Finados: setor de flores espera aumento de 7% nas vendas
Mesmo com mudanças de hábito dos brasileiros, data ainda representa cerca de 3% do faturamento anual, diz Instituto Brasileiro de Floricultura