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Vinícolas com indicação geográfica: qual é a diferença entre DO e IP?
Vinhos e espumantes de Pinto Bandeira, na Serra Gaúcha, ganham destaque com selos Denominação de Origem e Indicação de Procedência

Paloma Custódio* | Bento Gonçalves (RS) | paloma.custodio@estadao.com
24/02/2025 - 08:00

“Para nós, o mais importante é a valorização do produtor”. É assim que Juliana Rossato, enóloga e executiva da Associação de Altos de Pinto Bandeira, define a importância da conquista das indicações geográficas pelas vinícolas da região, na Serra Gaúcha. Três vinícolas possuem o selo de Indicação de Procedência (IP) Pinto Bandeira para vinhos e cinco possuem o selo de Denominação de Origem (DO) Altos de Pinto Bandeira para espumantes.
Segundo o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), as indicações geográficas se referem a produtos ou serviços que tenham uma origem específica, que reconheça a reputação, as qualidades e as características vinculadas àquele local. Esse reconhecimento comunica ao consumidor que essa região se especializou e tem capacidade de produzir algo diferenciado e de excelência, o que agrega valor.
“Se é preciso ter uma uva que é uma matéria-prima insubstituível — uvas de Pinto Bandeira, produzidas, colhidas e prensadas de determinado jeito —, então nós queremos que haja uma valorização desse produtor, que ele ganhe mais”, afirma Rossato.
As indicações geográficas se dividem em:
- Indicação de Procedência (IP): nome geográfico de um país, cidade ou região que se tornou conhecido como o centro de produção, fabricação ou extração de determinado produto ou prestação de serviço. O produto pode ser dessa região por tradição ou notoriedade, mas não necessariamente suas características dependem das condições específicas dessa localidade;
- Denominação de Origem (DO): nome geográfico de um país, cidade ou região que identifica um produto ou serviço cujas qualidades ou características resultam, exclusiva ou essencialmente, do meio geográfico, abrangendo tanto fatores naturais quanto humanos (solo, clima, métodos de produção e saberes locais).
No caso dos vinhos e espumantes de Pinto Bandeira, alguns dos principais requisitos para receber os selos de indicação geográfica são:
Vinhos IP Pinto Bandeira
- A área geográfica delimitada é de 81,38 km², abrangendo os municípios de Pinto Bandeira, Farroupilha e Bento Gonçalves;
- No mínimo, 85% das uvas, de 23 variedades, devem ser produzidas na área delimitada, entre elas Cabernet Franc, Merlot, Tannat, Cabernet Sauvignon, Sangiovese e Pinot Noir.
- Teor de açúcar de 18% para vinhos tintos e de 16% para vinhos brancos;
- Produção de 12 toneladas de uva por hectare;
- Os vinhos são autorizados para comercialização somente após terem sido submetidos aos controles do Conselho Regulador da IP, garantindo a conformidade em relação aos requisitos estabelecidos no Regulamento de Uso.
Espumantes DO Altos de Pintos Bandeira
- Uvas das variedades Chardonnay, Pinot Noir e Riesling Itálico cultivadas em espaldeira.
- A área total da DO compreende 65 km² contínuos, sendo 76,6% localizada no município de Pinto Bandeira, 19% em Farroupilha e outros 4,4% em Bento Gonçalves;
- Altitude: 520m à 770m;
- Fabricação pelo método tradicional;
- Prensagem realizada exclusivamente com uvas não desengaçadas – fermentadas em cachos inteiros; tempo mínimo superior a 12 meses para o período que vai da tirage (colocação do licor de tiragem) até o dégorgement (eliminação dos sedimentos de leveduras depositados no bico da garrafa);
- Apresentar padrões físico-químicos específicos;
- Ter a tipicidade comprovada por degustação dos espumantes finos realizada às cegas.
A executiva da Associação de Altos de Pinto Bandeira reforça a importância da valorização do produtor. “Não adianta ter todo esse trabalho para ter o reconhecimento de Denominação de Origem — com área delimitada, com uvas específicas, com tudo certo — se o produtor chega na associação e diz: ‘Não vale a pena. Eu vou plantar aqui uva comum para fazer suco’”, destaca.
Altos de Pinto Bandeira no mesmo patamar do Champagne da França
A enóloga Juliana Rossato afirma que a indicação geográfica coloca os espumantes de Altos de Pinto Bandeira no mesmo patamar de reconhecimento do Champagne da França. “No mesmo patamar de grandes degustadores, de grandes pessoas do mundo do vinho. Então, um Altos de Pinto Bandeira se assemelha a um Champagne, um Franciacorta e um Sauternes”, compara.
As três vinícolas responsáveis pela produção e comercialização dos vinhos com IP Pinto Bandeira são Aurora, Terraças e Valmarino. Já as cinco vinícolas que produzem e comercializam os espumantes com DO Altos de Pinto Bandeira são Aurora, Terraças, Valmarino, Família Geisse e Don Giovanni.
Vinícola Valmarino
Com quase 28 anos de mercado, a Vinícola Valmarino produz cerca de 250 mil litros de vinho e espumantes por ano, utilizando exclusivamente uvas cultivadas na área geográfica de Pinto Bandeira. Dois rótulos possuem o reconhecimento de IP Pinto Bandeira: o vinho branco Malvasia Bianca e o tinto Cabernet Franc, ambos da safra 2022.
O enólogo e sócio proprietário da Valmarino, Marco Antônio Salton, destaca a exclusividade dos produtos. “Não é qualquer produto que vai pra IP. Poderíamos ter mais, mas é estratégia da empresa focar só em alguns. E quando lançamos um produto que tem uma característica a mais, o consumidor vai valorizar pela sua qualidade”, explica.
Marco destaca que, apesar de a vinícola ser de médio porte, produzir vinhos com Indicação de Procedência ainda é um desafio. “Nem todo ano conseguimos lançar vinhos com IP. Esse Malvasia está sendo comercializado só o da safra de 2022. As safras de 2023 e 2024 não obtiveram aprovação para IP. A uva não tinha padrão de qualidade. E tem uma questão de mercado: se há demanda para esse vinho”, comenta.


Vinícola Don Giovanni
Com uma produção anual de cerca de 100 mil garrafas, das quais 80% são espumantes, a vinícola Don Giovanni concentra-se na produção pelo método tradicional, que permite a maturação dos espumantes por diferentes períodos de tempo.
Somente o rótulo Don Giovanni Nature possui o selo DO de Altos de Pinto Bandeira, mas o Don Giovanni Brut, o Rosé Brut e o Blanc de Blanc Brut já receberam o reconhecimento no passado e tiveram os lotes finalizados. Segundo Daniel Panizzi, diretor da vinícola, mais dois rótulos serão submetidos ao Conselho Regulador no próximo mês.
Para atender aos critérios da DO, a Don Giovanni passou por ajustes durante o processo de certificação. Entre eles, a renovação de vinhedos e a adequação de alguns processos operacionais.
“A certificação da DO foi um marco para nossa região, resultado de um trabalho de vários anos. Durante toda a caminhada, nossa associação foi, aos poucos, comunicando o que estava acontecendo. Desta forma, ao recebermos o selo, foi uma forma de consolidar todo o trabalho realizado”, disse Daniel Panizzi à reportagem. “A percepção de que somos uma região diferenciada na produção de espumantes já existe, mas temos um longo caminho pela frente. A DO é um norteador do futuro da nossa região”, avalia.

*Jornalista viajou para Bento Gonçalves (RS) a convite do Consevitis-RS e do Sebrae Nacional.
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