Com oferta em queda, importações sobem e processamento recua; mudanças climáticas e volatilidade global afetam produção e exportações brasileiras
O preço do cacau registrou alta de 189%, com picos de até 282%, ao longo de 2024, segundo a Associação Brasileira da Indústria da Alimentação (Abia). Ao Agro Estadão, a presidente-executiva da Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC), Anna Paula Losi, explica que o principal fator para o aumento dos preços é a redução da oferta no mercado nacional e internacional. Ela lembra que as compras das amêndoas pelo setor são realizadas com pelo menos seis meses de antecedência do feriado.
No entanto, nem todo o aumento deve ser repassado ao consumidor, já que “as indústrias trabalharam para minimizar o impacto do custo das amêndoas, investindo na melhoria de seus processos produtivos”, ressalta Losi. Ela pondera ainda que, embora o preço do cacau tenha subido mais de 180% ao longo de 2024, “nenhum produtor teve seus preços reajustados neste mesmo patamar”.
As indústrias processadoras de cacau brasileiras receberam 17.758 toneladas de amêndoas no primeiro trimestre de 2025, uma queda expressiva de 67,4% em comparação com o quarto trimestre de 2024 (54.435 toneladas). Já em relação ao primeiro trimestre do ano passado, a queda foi de 5%, quando o setor recebeu 18.700 toneladas de amêndoas de cacau. Os dados foram compilados pelo SindiDados – Campos Consultores e divulgados nesta segunda-feira, 14, pela AIPC.
Segundo Anna Paula Losi, este foi o segundo menor volume de amêndoas recebido pelas indústrias em um primeiro trimestre nos últimos cinco anos — superando apenas o registrado em 2021.
Com a escassez de oferta, houve queda também na moagem. No primeiro trimestre de 2025, a indústria brasileira processou 52.135 toneladas de cacau, uma retração de 13% em relação ao mesmo período de 2024 (59.942 toneladas) e de 12,5% na comparação com o quarto trimestre do ano passado (59.589 toneladas).
Ainda assim, o volume processado no primeiro trimestre foi quase três vezes superior ao total de cacau de origem brasileira recebido no período, revelando um desequilíbrio entre a produção nacional e a demanda da indústria. A diferença entre o volume moído e o recebido do mercado interno foi de 34.377 toneladas, ressaltando a contínua necessidade de complementação por importações.
1º Trimestre de 2025 (ton.) | 4º Trimestre de 2024 (ton.) | 1º Trimestre de 2024 (ton.) | Variação anual | Variação em relação ao período anterior | |
Amêndoas recebidas | 17.758 | 54.435 | 18.700 | -5% | -67,40% |
Cacau processado | 52.135 | 59.589 | 59.942 | -13% | -12,50% |
De janeiro a março, o Brasil exportou 30 toneladas de cacau in natura, uma redução de 65,5% frente às 87 toneladas no mesmo período do ano passado. Já as importações de amêndoas de cacau voltaram a crescer, em meio a queda da oferta nacional. No primeiro trimestre de 2025, o Brasil importou 19.491 toneladas, um aumento de 29,8%.
Segundo a AIPC, mesmo com esse reforço externo, o total de amêndoas disponíveis (recebimento interno e importações) ainda não foi suficiente para suprir a demanda da indústria brasileira, resultando em um déficit de aproximadamente 14.886 toneladas no trimestre.
Anna Paula explica que o aumento das importações foi impulsionado pela queda de 18% no recebimento de amêndoas pela indústria brasileira ao longo de 2024, somada à já esperada baixa nos três primeiros meses de 2025. “Importante destacar que o cacau importado é industrializado para atender os contratos de exportação”, destaca.
Já as importações de derivados de cacau somaram 7.633 toneladas no primeiro trimestre de 2025, uma queda de 25,1% em relação ao mesmo período do ano anterior. As exportações de derivados também recuaram, passando de 9.558 toneladas em 2024 para 9.287 toneladas em 2025, uma redução de 2,8%.
Segundo a AIPC, os números no mercado interno e na comercialização internacional reforçam a tendência de desaceleração na demanda, resultado da volatilidade do mercado global de cacau.
A Bahia segue como o maior estado produtor de cacau do Brasil, respondendo por 65% do total de amêndoas destinadas às indústrias processadoras do país. No primeiro trimestre de 2025, o estado forneceu 11.671 toneladas, de acordo com dados da AIPC, um avanço de 2% na comparação com o mesmo período do ano passado. No entanto, houve uma forte retração de 73% em relação ao quarto trimestre do ano anterior.
O diretor executivo da Cooperativa Cacau Mata Atlântica da Bahia (Coopermata), Josué Castro, diz à reportagem que a colheita de cacau ficou abaixo das expectativas devido aos efeitos das mudanças climáticas. “Estamos trabalhando com assistência técnica e com todas as organizações que atuam nessa cadeia de valor para mitigar os efeitos das mudanças climáticas, aprimorar o manejo do solo e implementar o manejo integrado de pragas e doenças, para que nossos produtores sintam menos esses impactos”, afirma.
O produtor considera que o custo de produção do cacau está bastante favorável. “Tivemos uma baixa dos preços dos insumos e isso tem contribuído para que os produtores consigam fazer a manutenção das suas áreas”, diz.
Além disso, o preço do cacau tem se mantido em alta, o que é vantajoso para o produtor. “Mesmo com a produtividade mais baixa, os produtores têm conseguido gerar recursos significativos para fazer os investimentos necessários em suas propriedades”, conclui.