
Tirso Meirelles
Presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (Faesp)
Esse texto trata de uma opinião do colunista e não necessariamente reflete a posição do Agro Estadão
Opinião
Taxação das LCAs é risco para as próximas safras
A proposta de taxação das Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), que até então eram isentas de Imposto de Renda para pessoas físicas, representa um marco preocupante para o setor agropecuário brasileiro
22/06/2025 - 08:00

Tradicionalmente, esses títulos têm sido uma ferramenta fundamental de captação de recursos para o financiamento da produção rural, atuando como ponte entre o mercado financeiro e o campo. A mudança proposta pode comprometer a atratividade desse mecanismo de crédito, com efeitos diretos sobre a estrutura de investimento na agropecuária nacional, especialmente no contexto das próximas safras.
Atualmente, as LCAs funcionam como um importante incentivo ao investimento privado no agronegócio, permitindo que bancos e instituições financeiras emprestem dinheiro ao produtor rural com base em recursos captados junto a investidores interessados em rentabilidade e segurança, com o benefício fiscal da isenção. Ao perder essa vantagem, o volume de captação tende a cair, uma vez que o investidor buscará alternativas mais rentáveis ou igualmente seguras, porém com incentivos fiscais mantidos. A saída de capital pode reduzir significativamente a disponibilidade de crédito para o produtor, em especial os médios e pequenos, que dependem fortemente dessas linhas para custear insumos, maquinário, tecnologia e mão de obra.
Com menos recursos disponíveis ou com custos mais altos de financiamento, a tendência natural será a redução de áreas plantadas e a priorização de culturas de menor risco e custo, o que poderá levar a um recuo na produção em várias cadeias produtivas, da soja ao milho, do algodão ao café. A retração também pode afetar culturas perenes e projetos de longo prazo, dado o ambiente de incerteza econômica e fiscal. Além disso, haverá impacto na renovação de pastagens, no investimento em sistemas de irrigação, em práticas de agricultura regenerativa e na adoção de tecnologias voltadas à sustentabilidade — áreas que exigem recursos consistentes e previsibilidade de retorno.
O efeito dominó se estende ainda mais. A queda na produção pode pressionar a inflação de alimentos, reduzir a competitividade do Brasil no mercado externo e comprometer os avanços conquistados em produtividade e sustentabilidade nos últimos anos. Com menor investimento, também haverá perda de dinamismo nas regiões rurais, onde o agro é muitas vezes a única atividade econômica relevante, o que compromete a geração de empregos, o consumo e a arrecadação local.
Em um país cuja balança comercial é fortemente sustentada pelo agronegócio, a taxação das LCAs representa mais do que uma simples alteração fiscal: ela reconfigura o ambiente de negócios no campo. A medida pode parecer arrecadatória no curto prazo, mas, no médio e longo prazos, tende a provocar perdas superiores à receita esperada, tanto do ponto de vista econômico quanto social. É urgente, portanto, que o debate sobre essa proposta seja ampliado, com escuta ativa do setor produtivo, e que se busquem soluções que mantenham o estímulo ao crédito agrícola, respeitando o equilíbrio fiscal sem ferir a espinha dorsal da economia brasileira.

Newsletter
Acorde
bem informado
com as
notícias do campo
Mais lidas de Opinião
1
Produtor rural paga conta de má política fiscal
2
Brasil e Índia: potências agrícolas em busca de cooperação estratégica
3
Geopolítica da carne
4
Mercosul-União Europeia: caminhos que se bifurcam
5
A vez do EFTA
6
Política Agrícola e a pedra filosofal

PUBLICIDADE
Notícias Relacionadas

Opinião
45 anos de contribuição do Brasil para uma agricultura sustentável no Cone Sul
Com a tecnologia de Fixação Biológica de Nitrogênio na soja, o país economiza cerca de U$ 20 bilhões por ano em fertilizantes nitrogenados

Opinião
Política Agrícola e a pedra filosofal
Seguro é tão crédito quanto financiamento, “barter” ou usar recursos próprios. Crédito decorre de confiança baseada em evidências.

José Carlos Vaz

Opinião
A vez do EFTA
Com barreiras tarifárias dos EUA e exigências da União Europeia, Mercosul mostra que ainda pode alcançar tratados modernos de comércio

Welber Barral

Opinião
Geopolítica da carne
México elevou em 198% as compras de carne bovina em 2025 e pode habilitar 14 novos frigoríficos do Brasil

Teresa Vendramini
Opinião
Brasil e Índia: potências agrícolas em busca de cooperação estratégica
Combinação de vantagens abre uma janela de oportunidades para que os dois países aprofundem parcerias comerciais, técnicas e científicas

Celso Moretti
Opinião
Mercosul-União Europeia: caminhos que se bifurcam
Num mundo de incertezas jurídicas, com as batalhas tarifárias dos EUA, o acordo com a Europa representa previsibilidade institucional; UE apresenta o texto do acordo nessa quarta-feira, 3, em Bruxelas.

Welber Barral
Opinião
Produtor rural paga conta de má política fiscal
Falta de crédito adequado e margens cada vez mais estreitas comprometem a permanência de pequenos produtores na atividade

Tirso Meirelles
Opinião
Insegurança jurídica setorial e seus reflexos na Economia e na atração de investimentos internacionais
Setores como infraestrutura, energia limpa, bioeconomia e exportações também sentem os reflexos de um ambiente regulatório volátil

Marcello Brito