Combinação de solo rico em minerais, altitude e clima favoráveis confere ao café vulcânico características marcantes e apelo ao mercado internacional
Há 80 milhões de anos, um vulcão extinto no Brasil deu origem ao solo rico em minerais que garante um café com características únicas. “O sabor é diferenciado, não tem igual em outro lugar” – defendem os produtores de café vulcânico. Segundo eles, parte do sabor se deve à altitude de cerca de 1.200 metros, sem contar o clima que garante temperaturas entre 17º e 20º C durante o ano todo e média de 1.700 milímetros de chuva. A região Vulcânica fica no sul de Minas Gerais e nordeste de São Paulo e abrange 12 municípios, sendo oito deles, mineiros.
“A acidez é brilhante. É um café cítrico com notas de frutas amarelas”, explica Affonso Junqueira de Souza e Silva, produtor de Poços de Caldas (MG). Criado entre os cafezais, o paulistano tem muitas memórias da época em que ajudava o avô na roça. Demorou, mas já adulto, ele resolveu seguir a produção e passa boa parte do tempo na fazenda, onde quem chega é recepcionado por jabuticabeiras carregadas de frutas e palmeiras tomadas por pássaros.
A Fazenda Matão tem 200 alqueires e 100 mil pés de café. No ano passado, produziu 400 sacas de café especial, além de commodity, e a projeção é otimista. “A nossa meta é produzir 1.500 sacas por ano. Isso deve acontecer na safra 2026/27”, diz Affonso. A espécie plantada é a arábica e, entre as variedades, a grande aposta é o Arara, que surgiu na última década e está em 10 mil pés. Uma das suas vantagens é o período da colheita, que se estende de maio até setembro.
O café da Fazenda Matão ganhou o nome de “Peneira 16”, que se refere à forma de seleção dos frutos do café – só os maiores que ficam na peneira número 16 são usados na produção. A marca leva o selo da Região Vulcânica nas embalagens que são vendidas para Japão, Canadá, China, EUA e países da União Europeia, e que também ocupam gôndolas em mercados gourmet e cafeterias nacionais.
A área com solo vulcânico soma 65,9 mil hectares, onde 12 mil produtores cultivam café. Em média, o resultado chega a 1,5 milhão de sacas por ano. A busca pelo registro de IG tem objetivo de proteger e promover o café da região. Ulisses Ferreira Oliveira, diretor da Associação dos Produtores do Café da Região Vulcânica, destaca o reconhecimento da bebida. “Nos últimos três anos, houve aumento de quatro a cinco pontos na qualidade dos cafés. Hoje o café de 80 pontos é bom, mas não é especial. Temos cafés de 90, 91 pontos”, conta.
O crescimento do setor tem recebido apoio do Sebrae, com capacitação e promoção do produto em feiras e eventos. “Nós mostramos para o produtor que a fazenda dele é um negócio e é preciso tornar a marca conhecida”, conta Rogério Galuppo, analista do Sebrae Agro MG. A maior exposição somada à proteção da marca tem garantido valorização desse café especial. Na última safra, por exemplo, a saca de 60 kg do Arara foi vendida a R$2.200, enquanto o café “comum” foi cotado a R$ 1.500.
Essa valorização é resultado do trabalho que começou há quatro anos, envolvendo toda a cadeia na busca pelo reconhecimento da região Vulcânica. Em outubro deste ano, a associação entrou com pedido de registro de Indicação Geográfica (IG) junto ao INPI (Instituto Nacional de Propriedade Intelectual). O processo foi apoiado pelo Sebrae-MG e o resultado demora cerca de dois anos para ser divulgado.
Outra produtora do café vulcânico é Ilma Rosa Franco, de Campestre (MG). Ela é a quinta geração – as primeiras mudas foram trazidas da Espanha pelo bisavô – e produz café em 68 hectares da fazenda. Das 600 sacas anuais, 120 são de especial. Como principal desafio para a produção, ela cita o clima. Por isso, as lavouras estão cobertas com braquiária, uma planta de cobertura que ajuda a reter a umidade.
Aos 68 anos, com três filhos e dois netos, dona Ilma cumpre um papel essencial na cadeia do café. E em sete anos trabalhando com cafés especiais, virou referência na região. “Eu não estou trabalhando só para mim. Não quero um negócio só para mim. Quero servir de exemplo para os produtores apostarem nos cafés especiais”, confidencia.
Orgulhosa, conta que o investimento no pós-colheita valeu a pena. “Antes, eles davam o preço. Agora não, eu aprendi a precificar o meu produto e dou o valor que ele realmente tem”
*Jornalista viajou a convite do Sebrae-MG.
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