Estudos são feitos há dez anos, mas foram acelerados em 2024, após incêndios de grandes proporções que atingiram a vegetação em várias regiões brasileiras
Imagine um canavial em chamas. O fogo consome rapidamente a plantação, mas, ao atingir determinado ponto, ele perde força e vai se apagando antes mesmo da chegada dos bombeiros. Uma empresa de Sertãozinho (SP), expositora da Agrishow, feira de tecnologia agrícola que termina nesta sexta-feira, 2, na vizinha Ribeirão Preto, acredita ter encontrado a fórmula para isso. O produto está na Arena de Soluções Agro 2.
A indústria responsável pelo desenvolvimento do produto, que recebeu o nome de “No Fire”, é a Sugar Brasil. O químico e gestor ambiental da empresa, Geraldo Vaqueli, que conduziu os estudos, explica que o produto vinha sendo concebido há dez anos, mas os trabalhos foram acelerados após os incêndios que atingiram todas as regiões brasileiras no ano passado.
Dados do Monitor do Fogo do MapBiomas mostram que mais de 30,8 milhões de hectares foram destruídos ao longo de 2024, área maior que o território da Itália, por exemplo, o que representou um aumento de 79% sobre 2023. A maior parte (73%) foi de vegetação nativa, com predominância de florestas. Cultivos agrícolas somaram 6,7 milhões de hectares.
Projeções de especialistas apontam que esta é uma tendência para os próximos anos, por causa das alterações climáticas pelas quais passa o planeta. “Já para 2025, os prognósticos, infelizmente, levam a crer que não teremos um cenário muito diferente”, lembra Vaqueli.
Diante disso, a empresa queria chegar a uma molécula com potencial para prevenir incêndios e, também, para combatê-los. “Quem entende sobre o fogo, sabe que ele precisa, para se alimentar, de oxigênio. O nosso desafio, então, era justamente conseguir eliminar o oxigênio do processo”, conta o químico. Além disso, o produto precisaria ter um ponto de fusão elevado, acima de 1000°C, para poder tolerar o calor das chamas.
O resultado das pesquisas foi um composto capaz de captar a umidade do entorno e, assim que o fogo se aproxima, refrigerar o meio, penetrando nos poros da planta e formando uma espécie de película protetora, que bloqueia o fornecimento de oxigênio.
A mistura, preparada com um sal inorgânico, um umectante, um álcool não inflamável e uma poliacrilamida (um tipo de polímero), é apresentada na Agrishow em três versões: uma para ser aplicada em sólidos, como fibra de vidro, telhas, papel e celulose, e espuma, outra para vegetações em geral e outra para hidrocarbonetos, como gasolina, querosene e etanol.
A fórmula deve ser diluída: para cada litro do produto, são acrescidos 6,5 de água. Para uso em um hectare de cana, por exemplo, o produtor rural ou a usina precisará de 400 litros do produto — ou 3 mil litros após a diluição. Vaqueli explica que outro desafio foi conseguir um custo que se tornasse acessível. “Foi por tentativa e erro”. Até que a média ficasse em R$ 0,78 por metro quadrado.
Antes de ser disponibilizado no mercado, a empresa deve concluir o registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Para Vaqueli, é fundamental que os trâmites burocráticos caminhem de forma ágil. Se possível, até a chegada da nova temporada de estiagem. “A minha esperança é que esse produto ajude muito as pessoas, a nossa fauna e a nossa flora. Conseguir conter um incêndio é uma segurança à vida”, diz Vaqueli.
“É claro que a empresa pensa nas possibilidades de mercado, mas pensando não apenas como químico e sim no desenvolvimento pessoal, saber que poderemos contribuir contra uma situação tão grave, como são os incêndios, não tem preço”, conclui.
Os testes feitos pela empresa demonstraram que a aplicação de um caminhão do produto diluído, antes da chegada do fogo, equivale ao uso de oito caminhões de água pura no combate às chamas. Outra vantagem é a durabilidade: o produto fica por 100 dias nas plantas — caso não haja intempéries, como uma chuva torrencial.
*Jornalista viajou a convite da CDI Comunicação