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Trigo mourisco: conheça a cultura que ajuda a recuperar solos

O trigo mourisco também é chamado de sarraceno e gera oportunidade para agricultores

9 minutos de leitura

12/06/2024 | 05:20

Por: Daumildo Júnior | daumildo.junior@estadao.com

Lavoura de trigo mourisco
Foto: Círio Parizotto/Epagri

Definido por alguns como uma cultura multifuncional, o trigo mourisco, ou trigo sarraceno, vem ganhando destaque nos últimos anos por ser uma planta de rotação de cultura. O Agro Estadão entrevistou dois engenheiros agrônomos e especialistas no assunto, o pesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri), Cirio Parizotto, e o extensionista rural da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater-DF), Carlos Antonio Banci.

Apesar dos diversos usos e da praticidade no plantio, ainda existe o desafio para a baixa produção. Por isso, ambos especialistas em trigo sarraceno apontam que essa pode ser uma boa oportunidade para produtores rurais, já que a demanda cresce cada vez mais e os usos são variados. Veja o que é, os benefícios, utilizações, forma e dicas de plantio. 

O que é o trigo mourisco?

Essa planta também pode ser chamada de trigo mourisco ou tatarca. Apesar do nome, o trigo mourisco não tem semelhança com o trigo. Ele pertence à família das poligonáceas que geralmente são plantas herbáceas e às vezes trepadeiras. O trigo comum pertence à família das poaceae, que são gramíneas (que parecem uma grama). 

A planta é caracterizada por dar muitas flores na parte de cima, em geral, flores brancas e pequenas. Em média, o trigo sarraceno pode chegar a um metro de altura. Suas sementes são envolvidas por uma cápsula em formato triangular que é um pouco resistente. 

O trigo mourisco tem origem na região eslava, mais precisamente onde hoje se encontra a Polônia, Ucrânia e Rússia. Inclusive, foram os imigrantes desses países que trouxeram o cultivo para o Brasil. 

Segundo o pesquisador da Epagri, há relatos de que o trigo sarraceno chegou a Santa Catarina em 1890, no entanto, ele pondera que outros relatos mais confiáveis datam os primeiros plantios no estado do Sul entre 1928 e 1930. 

Para que serve o trigo mourisco ou trigo sarraceno?

Os usos da semente bem como da planta do trigo sarraceno são variados e ela pode ser considerada uma planta multifuncional. Ela é usada tanto na alimentação humana como de animais. Apesar disso, o maior uso da planta no Brasil é como adubo verde. 

Benefícios do trigo sarraceno para a saúde humana

Uma das vantagens no consumo humano é que as sementes do trigo mourisco não possuem glúten, ou seja, a farinha do trigo mourisco pode ser substituta da farinha de trigo convencional. Com isso, o trigo sarraceno pode ser uma boa solução para pessoas celíacas, isto é, pessoas que são intolerantes ao glúten. 

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Outro valor do trigo mourisco é para a indústria farmacêutica. A partir do trigo sarraceno é possível extrair uma substância chamada rutina. Ela ajuda no controle de hipertensão e reduz a concentração de triglicerídeos.

Curiosidade sobre o trigo mourisco

Na década de 1970 e 1980, era comum encontrar lavouras de trigo sarraceno para a alimentação humana. Esses plantios cresceram nesse período e o Brasil também chegou a exportar essas sementes para a alimentação de suínos em países da Europa e no Japão.

Trigo sarraceno e a produção de mel

Como as plantas de trigo sarraceno costumam florir bastante e, inclusive tem vários ciclos de geração de flores, elas podem ser utilizadas como pasto apícola. Isso quer dizer que elas atraem abelhas e, consequentemente, favorecem a produção de mel. 

“Produz em média de 110 a 170 quilos de mel por hectare. Elas são plantas ricas em néctar”, completa Cirio Parizotto. Além disso, essa cultura pode funcionar como proteção para as uvas, já que na época em que as frutas estão maduras elas atraem abelhas e uma plantação de trigo sarraceno perto de parreirais evita o ataque das abelhas. São chamadas de plantas iscas.

trigo mourisco grãos
Grãos de trigo mourisco ou trigo sarraceno. Foto: Adobe Stock

Trigo mourisco como aliado do agricultor

É uma cultura de entressafra, isso quer dizer, que o trigo mourisco ou trigo sarraceno é ideal para ser plantado após a colheita de uma cultura, pois ajuda a manter os nutrientes no solo e faz o que se chama de cobertura verde para a terra. 

Entre os benefícios do trigo sarraceno como adubo verde estão:

  • Fungicida natural: libera propriedades químicas naturais que inibem a presença de fungos;
  • Anti-nematóides: outro benefício dessas propriedades é a função nematicida, ou seja, elas acabam e controlam a presença de nematóides, que são vermes microscópicos que parasitam plantas. Essas substâncias ficam no solo até mesmo depois que o trigo sarraceno foi retirado, o que ajuda a cultura seguinte;
  • Ajudam em solos degradados e a combater erosão: essas plantas têm uma grande quantidade de raízes o que ajuda o solo permanecer compacto, além de auxiliar na revitalização de solos degradados. Além disso, evita a lixiviação do solo – processo de perda de nutrientes das camadas superiores do solo para as inferiores;
  • Recuperadores de nutrientes: outra vantagem do trigo sarraceno é a fertilização do solo. Com o passar do tempo, os nutrientes vão descendo no solo e essas plantas puxam esses nutrientes de volta, já que elas vão servir como um adubo verde;
  • Anulação de plantas invasoras: com um crescimento rápido e as substâncias no solo, plantas consideradas invasoras nas lavouras são anuladas pois o trigo mourisco compete com elas e impede o desenvolvimento delas.

Para obter essas vantagens do trigo mourisco ou trigo sarraceno, o agricultor pode plantar ele sozinho ou em mix, que além da tatarca pode ter milheto e braquiária. A segunda opção costuma ser a mais utilizada, já que nem sempre a compra dessas sementes é viável (veja o tópico Demanda e desafios do trigo sarraceno).

Como cultivar o trigo mourisco?

Essa cultura não é muito exigente e tem a característica de ser de ciclo curto. Basicamente as etapas são:

  • Plantio;
  • Primeiras floradas (aproximadamente depois de 30 dias);
  • Colheita ou plantio de outra cultura por cima (entre 70 e 90 dias após o plantio).

O plantio também é feito de forma simples. As sementes podem ser plantadas diretamente no solo ou até mesmo jogadas, já que não é necessário cobrir com terra para que elas germinem. Além disso, as lavouras de trigo sarraceno não costumam ser atacadas por pragas ou doenças, o que diminui os custos de produção.

Em geral, para cada hectare é necessário plantar 60 quilos de sementes. Já a produtividade costuma variar entre 2 mil e 3 mil quilos de semente por hectare, segundo o pesquisador da Epagri, Cirio Parizotto.

Já a colheita pode ser feita com maquinários que são utilizados para colher soja ou milho, ou seja, não requer um equipamento diferente do que o agricultor está acostumado.

Como deve ser o solo e a adubação?

O trigo sarraceno é uma planta que não exige solos de alta qualidade para se desenvolver. Ela vai bem em solos pobres e ácidos, além de não requerer uma adubação complexa. Por exemplo, se for plantado após uma cultura como soja ou feijão, o adubo que restou na terra será suficiente para a planta. 

No entanto, Cirio faz um alerta para quem deseja adubar o terreno antes do plantio do trigo mourisco. “Se for o caso de adubar para plantar o trigo mourisco, não pode abusar do nitrogênio, porque ele provoca o acamamento dessas plantas”, avisa. 

trigo mourisco na lavoura de soja
Trigo Mourisco após colheita de soja. Foto: Epagri/Divulgação

Qual a melhor época de plantio do trigo sarraceno?

Na região de origem, essa planta é cultivada no verão, quando as temperaturas estão mais favoráveis, já que ela não resiste a invernos rigorosos ou geadas, por exemplo. O extensionista rural, Carlos Antonio Banci, explica que essa cultura pode ser plantada no ano todo em algumas partes do Brasil. 

“Aqui, ela é produzida o ano todo porque nosso clima é tropical. Na região Sul do país, que é onde tem frio mais intenso, eles costumam plantar principalmente entre outubro, novembro e dezembro”, aponta. Na parte mais central, o trigo sarraceno pode ser plantado em outras épocas, como maio, junho e julho, já que não exige muita água e é resistente a estiagens, completa Banci.

O pesquisador da Epagri, Cirio Parizotto, também complementa dizendo que no inverno na região Sul, as geadas são os maiores empecilhos para o desenvolvimento da lavoura, por isso, até março é possível plantar o trigo sarraceno nos estados sulistas. 

Demanda e desafios do trigo mourisco

Com uma produção não contabilizada no Brasil, a cultura do trigo mourisco tem alguns desafios pela frente. O primeiro é ampliar o acesso às sementes, como pontua o extensionista da Emater-DF.

“Existe demanda para plantar o trigo mourisco aqui na região. Os agricultores já tem grande interesse em espécies que façam essa cobertura do solo de maneira eficiente. A dificuldade que nós temos é a oferta de sementes. Elas costumam ter pouca oferta e com valor mais elevado, em razão do cultivo no Brasil ser pouco ainda”, afirma Carlos Antonio Banci. 

Além disso, o uso para consumo humano é pouco difundido e esbarra na falta de maquinário para fazer o beneficiamento das sementes. “São poucos os locais que fazem isso. Precisa de equipamento especial para descascar o trigo mourisco. Essa é a dificuldade para vender para a alimentação humana”, pontua o pesquisador Cirio Parizotto.

No entanto, essas brechas e a demanda crescente são fatores de oportunidade para produtores que queiram começar o cultivo do trigo sarraceno. Parizotto inclusive estima um prazo para isso.

“Muitos produtores ainda não conhecem a cultura e estão começando a conhecer. A procura tem aumentado e alguns produtores já começaram a produzir. Eu acredito que em dois ou três anos vai ter um crescimento exponencial no plantio do trigo mourisco visando a proteção de solos”, vislumbra o pesquisador da Epagri.

A dica final deixada pelo extensionista Carlos Banci é aproveitar o facilitador que o trigo mourisco pode ser para as culturas. “A gente aconselha o agricultor a explorar essa cultura, a plantar, sobretudo com o objetivo de cobertura [do solo]. Além disso, também é indicado deixar uma área isolada para o agricultor poder multiplicar e tirar a sua semente, ter a semente própria”.

Saiba também para que serve a soja.

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