Presente em pequenas quantidades, o metanol se torna perigoso quando há falhas na destilação ou adulteração de bebidas
Nos últimos dias, o Brasil vem registrando uma onda de casos de intoxicação por metanol. Até o último domingo, 5, o Ministério da Saúde reportou 16 casos confirmados e 209 em análise. Os motivos ainda seguem em investigação, sendo a adição intencional a principal suspeita até o momento. Mas é possível encontrar metanol durante a produção das bebidas alcóolicas?
O pesquisador da unidade Agroindústria de Alimentos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Edmar Franco, explicou que o metanol, assim como o etanol, são moléculas que podem ser obtidas a partir da produção de bebidas. Mas, se o processo for corretamente seguido, não há risco e os casos de contaminação de forma acidental são extremamente raros.
“Em geral, os produtos à base de frutas têm mais chances de ter metanol porque contêm, na casca das frutas, que são trituradas para sofrer de fermentação, uma substância chamada pectina. É dessa pectina que derivam as maiores quantidades de metanol. Mas essa quantidade, em geral, é muito pequena para causar transtorno ou chegar ao óbito, desde que você cumpra naturalmente o processo de fabricação normal, de qualidade”, acrescentou, ao comentar que a cana-de-açúcar também conta com essa pectina.
Além disso, pode haver um processo de concentração dos álcoois em algumas bebidas, do qual se originam os destilados. Isso quer dizer que água é evaporada, ficando mais condensada a presença de etanol. Sendo assim, basicamente, há dois grupos de bebidas alcoólicas: os fermentados, como cervejas e vinhos, e os destilados, como cachaça, gin, whisky e vodka.
De forma geral, as bebidas fermentadas têm um teor alcoólico menor e, durante o processo, é possível encontrar metanol de forma natural, como um subproduto, mas em quantidades mais baixas. Já os destilados, por passarem por um processo a mais, uma espécie de decantação, têm uma concentração maior de etanol e, consequentemente, de metanol.
A legislação brasileira prevê a presença de certos teores de metanol nas bebidas, mas, como esclarece Franco, esses níveis são tão baixos que não causam nenhum problema à saúde. No caso do vinho, por exemplo, são 400 miligramas para cada litro de vinho tinto.
A presença de metanol é medida tendo como referência o etanol e não a quantidade total de líquido. A cachaça, por exemplo, tem um nível máximo de metanol de 20 miligramas para cada 100 mililitros de etanol na cachaça.
Seguindo o exemplo da produção de bebida a partir da cana-de-açúcar, uma vez que é feita a fermentação, esse produto passa pela destilação. Ele é aquecido e, nesse momento, ocorre a separação do metanol, do etanol e dos demais subprodutos.
Como contou o pesquisador, o resultado do aquecimento vai saindo em etapas, que são divididas da seguinte forma:
“Para haver uma concentração de metanol crítica na bebida, normalmente, é porque teve um processo de produção de baixa qualidade e que, de uma forma não adequada, não fizeram a separação ou misturaram essa cabeça, reinserindo na bebida”, explicou Franco sobre qual momento pode haver problema com o metanol.
O pesquisador também lembrou que as empresas de produção de bebidas alcóolicas devem fazer constantemente coletas de amostragem para análises de controle e verificar os níveis das substâncias encontradas. Já a fiscalização é feita pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). Além disso, todos os estabelecimentos fabricantes precisam ter registro na pasta.
O Agro Estadão solicitou ao Mapa uma resposta sobre a participação do ministério nas investigações em relação às origens das bebidas adulteradas com metanol, mas, até a publicação, não teve retorno.
A reportagem também pediu uma posição para o Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac), que representa o setor de cachaça no país. A entidade se solidarizou com as vítimas, destacou que o setor de produção legal de cachaça segue todas as determinações previstas e afirmou que vem ajudando as autoridades no combate ao mercado ilegal de bebidas.
“Os casos recentes e que causaram danos irreparáveis ao consumidor e à sociedade dizem respeito a uma atividade criminosa de falsificação de bebidas, sem qualquer relação com o mercado formal e com os produtores legalizados”, disse o Ibrac.